O filme "45 do Segundo Tempo" gira em torno do reencontro de três amigos de adolescência que não se veem há muitos anos. O primeiro, Pedro -vivido por Tony Ramos- é um dono de cantina em estado falimentar. O segundo, Ivan -Cássio Gabus Mendes-, é um advogado em crise familiar. O terceiro, Mariano -Ary França- é um padre em crise de fé.O que mais chama a atenção, desde a abertura, quando a crítica situação econômica de Pedro é trazida a nós, é que, paradoxalmente, ele habita um mundo acolhedor. Não apenas pela luz acolhedora do filme, ou por ele ser um torcedor fanático de futebol -razoavelmente simplório, mas irresistivelmente simpático--, mas também pelo sentimento que tudo isso nos sugere estarmos participando de uma fábula.Ivan não tem uma situação tão melhor assim. Embora a ele não faltem o dinheiro nem a família que faltam a Pedro, é justamente o bolso cheio que o angustia, assim como é o trabalho que o afasta da mulher e do filho.Para completar o trio, o padre Mariano deixou de pensar em Deus, em Cristo e tudo mais, e vê a vida escorrer sem ter tido nenhum amor terreno e nem mesmo conhecido a sexualidade -mas está apaixonado secretamente por uma fiel.Com esse tripé, Luiz Villaça parte para o desafio de realizar o chamado "filme médio". É o que se costuma denominar um filme cujo orçamento seja contido. No caso, o filme explora o reencontro e algumas aventuras decorrentes dele, que envolvem a ligação entre o presente de cada um e seu passado comum. Mas os atores são essencialmente três, sendo uma estrela (Ramos), numa produção sem maiores complicações.O filme médio busca ser popular sem recorrer a vulgaridades que podem chamar a atenção de um público realmente popular. No caso brasileiro, ele se endereça a uma classe média quase sempre resistente à produção nacional.Daí ser quase obrigatório o apelo a três atores conhecidos sobretudo por sua atividade na TV Globo. Mas também existe certa sensibilidade de Villaça ao abordar a questão. Embora procure não entrar muito na cronologia da nossa crise econômica, a crise é mais que evidente nas dificuldades financeiras de Pedro e sua cantina. É em suicídio que ele pensa.Ivan, o advogado, não pensa em se matar, mas poderia. Está sendo abandonado ao mesmo tempo pela mulher e pelo filho. Ou seja, o núcleo familiar é não apenas mencionado, mas convocado. Se no cinema popular dos anos 2010 o consumo era o motor maior, hoje é o núcleo familiar, uma espécie de último refúgio para cada um.Já Mariano nem a esse consolo pode almejar, pois enfrenta o que pior pode um religioso: uma crise de fé. Assim como Pedro, só pode contar nessa travessia, como apoio e objetivo, o reencontro da amizade.Villaça expõe essa crise pisando em ovos, o que se compreende. Ninguém vai ao cinema para, além dos aborrecimentos do cotidiano, enveredar pelas dores de uma crise econômica e existencial do tamanho que existe hoje no Brasil (sem contar a crise política). Mas também é evidente que ninguém pode se alienar inteiramente dela.Assim, "45 do Segundo Tempo" busca oferecer ao espectador algum consolo pelas dificuldades que atravessa, sem aliená-lo inteiramente. Daí criar em torno dos personagens esse mundo acolhedor, do qual o suprassumo será o futebol. Ali o conflito é aberto, mas produz uma espécie de universo paralelo.A paixão futebolística no filme é bem mais plana, destituída das dores e contradições que encontramos em, digamos, "Boleiros - Era uma Vez o Futebol...", de Ugo Giorgetti. O futebol paira acima ou ao lado das dores do mundo real. É capaz de resgatar todos os nossos problemas e, por isso mesmo, nos encaminhar a um final um tão simplório quanto o dono da cantina.Mas é esse final, esse caráter simplório, que dão ao filme, justamente, a oportunidade de ao menos atrair um bom público aos cinemas. Se conseguir, esse filme simpático terá alcançado um objetivo similar ao de seus personagens -sobreviver aos obstáculos do mundo. No caso do filme, graças a uma estética que foge a qualquer desafio, mas que Villaça desta vez maneja com alguma desenvoltura. 45 DO SEGUNDO TEMPOQuando Estreia na quinta (18) nos cinemasClassificação 12 anosElenco Ary França, Cássio Gabus Mendes e Tony RamosProdução Brasil, 2021Direção Luiz VillaçaAvaliação Bom