São cerca de 11h20 de segunda-feira (5). Verônica Fogaça, vai pedalando para o ponto de desembarque dos alunos na Avenida José Barbosa Réis, no Setor Madre Germana 2. Ela vai buscar o filho de 10 anos que estuda na Escola Municipal Jardim América, também na capital. O caso é apenas mais um entre muitos do bairro que têm de recorrer ao ensino que está disponível a mais de 18 quilômetros dali.O ônibus que faz o transporte é da Prefeitura de Goiânia e é necessário porque no bairro fundado há 27 anos não existe unidade de ensino fundamental. O prédio que poderia receber os estudantes, na Rua São Gregório, está com a obra parada.A unidade de ensino mais próxima é o Colégio Estadual da Polícia Militar de Goiás (CPMG) Madre Germana, já em Aparecida de Goiânia, a 1 quilômetro (km) do embarque dos alunos. O estabelecimento oferece 23 turmas para o ensino fundamental 2, com vagas do 6º ao 9º ano, e outras 23 para o ensino médio, informa a Secretaria de Estado da Educação (Seduc).O ensino médio é de responsabilidade do Estado, já o ensino fundamental, compartilhado com a administração de cada município. As prefeituras são as únicas que têm de cuidar da educação infantil.Lorena Santos Lima Alves, de 29 anos, é confeiteira e possui duas filhas que estão sem estudar. Ela afirma que as duas estavam matriculadas na Escola Municipal Jardim América e depois do retorno ao ensino presencial, decorrente da redução da intensidade da pandemia da Covid-19, não há vagas para as duas meninas de 12 anos e 9.Jennifer, a mais velha de Lorena, cursava o 6º ano do ensino fundamental, mas conta que ainda não sabe ler. Com o passar dos dias, o prejuízo para o desenvolvimento da adolescente só aumenta e preocupa a mãe e a própria menina. A irmã mais nova deveria estar matriculada no 3º ano do ensino fundamental, mas segue longe da oportunidade de aprendizado.A confeiteira afirma que não tem condições de pagar o transporte escolar para uma escola em um bairro próximo e que não confia em deixar as duas andarem sozinhas no bairro. “Ainda mais depois do que aconteceu com a Luana, eu fiquei com mais medo ainda”, diz referindo-se ao assassinato de Luana Marcelo Alves, de 12 anos, morta no último dia 27.O caso das duas meninas sem estudar é acompanhado pelo conselheiro tutelar da região oeste, José Roberto da Silva. “Aqui precisa de uma escola. Ela tem de ser de tempo integral, nós temos demanda para isto”, afirmou.O relógio marca 12h01 quando chega o primeiro ônibus escolar do transporte público municipal. Entre cinco e dez crianças desembarcam. Todas elas carregam agasalhos, sinal de que era frio quando partiram para a viagem, por volta das 6h. O filho de Verônica, que citamos no início da reportagem, não está no veículo. Ela continua esperando.Àquela hora outras mães se fazem presentes para aguardar o retorno dos filhos. É o caso de Romilda Lopes, de 43 anos, que também reclama da situação do bairro. Ela tem uma filha de dez anos que cursa o 4º ano do ensino fundamental. “Nós precisamos de uma escola aqui. É um absurdo um bairro desta idade não ter vaga para os alunos.”EsperançaSebastiana de Fátima Ferreira, de 66 anos, buscava uma das netas de 11 anos. Moradora desde o início do bairro, ela conta que as duas cursam o 5º ano do ensino fundamental. Além do transtorno com as netas, ela caminha cerca de 30 minutos com mais quatro vizinhas para ter acesso à Educação de Jovens e Adultos, no Colégio João Barbosa Reis, no Setor Madre Germana 1, em Aparecida de Goiânia.A idosa conta que não está matriculada, pois tem ido à unidade de ensino há poucas semanas. Sebastiana espera deixar o analfabetismo para trás com uma vaga em 2023. “Tem um colégio aqui, mas não é para a gente. Lá tem aluno até do Centro”, diz ao se referir ao CPMG instalado no bairro vizinho, o Setor Madre Germana 1. O relato da avó sobre a unidade militar se repete nas bocas de Verônica, Romilda e outras mães do bairro que foram ouvidas pelo POPULAR.Enquanto a reportagem ouve as queixas, outros ônibus chegam em horários distintos: dois às 12h05 e um às 12h21. Uns com mais alunos outros com menos vão ficando vazios naquele que é o ponto final da viagem que dura cerca de uma hora. O filho de Verônica, enfim, chega e ela segue com o garoto para casa. Além da mochila, o garoto carrega a certeza de que a rotina vai se repetir no dia seguinte, iniciando junto com o raiar do sol.EmpresaO Estado assumiu, por meio da Agência Goiana de Habitação (Agehab), o compromisso de construir a estrutura física da escola municipal do Setor Madre Germana 2. O termo é de 2011, conforme a pasta, com destinação de R$ 15 milhões do então Programa de Aceleração do Crescimento (PAC-2). “Quando a atual gestão tomou posse, a obra estava paralisada, então o Governo de Goiás autorizou contrapartida estadual no valor de R$ 9 milhões para que a Agehab destravasse e concluísse as obras”, informou em nota.O andamento dos trabalhos, no entanto, depende da conclusão de um procedimento licitatório para contratar a executora dos serviços, informa a Agehab. A previsão da administração pública é que esta etapa de destravamento do impasse se concretize até o fim deste ano. A área para a escola é a mesma que vai contemplar um Centro Municipal de Educação Infantil (Cmei) (leia ao lado) e uma praça.A Seduc afirmou à reportagem que o bairro é atendido, além do CPMG Madre Germana 1, pelo Centro de Ensino em Período Integral João Barbosa Reis. Na unidade estão abertas 18 turmas para o ensino médio e outras 18 para o ensino fundamental 2, com turmas do 6º ao 8º ano. Para o local também há a previsão, em 2023, da abertura de duas turmas do Ensino de Jovens e Adultos Médio, com uma turma em cada semestre.Entrega de Cmei está prevista para o mês de janeiroNo bairro também não há Centro Municipal de Educação Infantil (Cmei). Lá existe uma construção com salas modulares, mas como mostrou O POPULAR na última sexta-feira (30), o cenário é de abandono. As estruturas são alvos de vândalos. A Secretaria Municipal de Educação (SME) explicou que o local não tem condições de funcionar porque faltam itens básicos como água e energia elétrica. Nesta segunda-feira (5), a SME informou, por meio da assessoria de imprensa, que a estrutura deve ser entregue no início do próximo semestre letivo, ou seja, na segunda quinzena de janeiro do próximo ano. O prefeito de Goiânia, Rogério Cruz (Republicanos), afirmou que a estrutura será batizada em nome de Luana Marcelo Alves, como forma de homenagear a menina de 12 anos assassinada no dia 27 de novembro, após desaparecer ao ir a um mercado próximo a sua casa.A estrutura faz falta para a costureira Deusimaria dos Santos Ferreira, de 26 anos. Ela tem uma filha de três anos que não tem onde se matricular. A unidade mais próxima é o Centro de Educação Infantil Marista Divino Pai Eterno. “Eu teria de pagar uma van para buscar e levar ela e fica caro”, reclama. O custo, segundo as mães afirmaram, não é inferior a R$ 300 por mês. -Imagem (1.2574729)