Um grupo de candidatos negros que fizeram concurso público em 2022 para o provimento de diversos cargos na Prefeitura de Goiânia acusa a Secretaria Municipal de Administração (Semad), responsável pelo processo seletivo, de seguir desrespeitando a legislação municipal que trata da reserva de vagas para cotistas e de não cumprir determinação do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás (TCM-GO). Em fevereiro, o TCM-GO chegou a suspender por 20 dias a convocação dos aprovados, mas revogou a decisão no dia 1º de março, após a administração municipal se comprometer a cumprir a lei municipal 9.791/2016 em sua integridade. O parágrafo primeiro do artigo 3 da lei determina que candidatos autodeclarados negros que consigam pontuação suficiente para serem convocados pela ampla concorrência não devem ser chamados dentro da reserva de cotas.No começo do ano, o executivo havia publicado a lista de convocação de 2.091 candidatos, 50% a mais do que o previsto inicialmente no lançamento do edital. O concurso foi realizado para preenchimento de vagas nas áreas de saúde, educação, assistência social, infraestrutura, esporte, planejamento e administração. O edital foi lançado em 2020, mas as provas foram realizadas apenas em maio e junho do ano passado por causa da pandemia de Covid-19.Entretanto, segundo o grupo, a Semad corrigiu outro erro na convocação feita no final de janeiro, que não havia sido apontando pelo tribunal, e ignorou o que foi questionado pelo Ministério Público de Contas (MPC) a partir de denúncia e acatado pelos conselheiros do TCM-GO. Pelas contas dos candidatos, a nova lista publicada pela Semad na edição de sexta-feira (3) do Diário Oficial do Município (DOM) deveria ter mais de 100 nomes e não apenas os 20 incluídos.No dia 6 de fevereiro, o Paço Municipal chegou a publicar no DOM um despacho assinado pelo prefeito Rogério Cruz (Republicanos) a convocação de mais 119 aprovados no concurso. Cinco dias depois, a assessoria de comunicação da Prefeitura divulgou comunicado informando que esta convocação extra seria para “cumprir rigorosamente” a legislação municipal e federal que trata da reserva para cotistas negros e com deficiência (PCD). “Com isso, mais 119 aprovados que se enquadram nas cotas serão acrescentados à primeira chamada”, informou, na época.O despacho nunca foi revogado, mas a Prefeitura não chegou a divulgar estes 119 nomes. Nas últimas semanas, muitos candidatos que não estavam na lista original de convocação receberam em suas casas um aviso de recebimento (AR) da Semad, um ofício informando que deveriam apresentar em até 30 dias os documentos que constam no edital do concurso em uma agência do Atende Fácil. Os nomes destes candidatos também não constam na retificação feita pela Prefeitura na última sexta-feira.Nesta segunda-feira (6), uma comissão formada por candidatos negros do concurso esteve reunida com representantes da Semad e da Prefeitura pela manhã e com o MPC à tarde para reclamar da retificação feita pelo executivo. Os candidatos alegam que após o TCM-GO revogar a suspensão do processo de convocação a Prefeitura apresentou um novo entendimento sobre o cumprimento ou não da lei municipal.Representante da comissão, Kamila Evelyn Martins Marques diz que a prefeitura argumenta que o artigo que trata da aprovação de candidatos negros pela ampla concorrência é “muito claro, sem margem para dúvidas”, mas que a prefeitura insiste em uma interpretação equivocada que vai contra o entendimento do TCM-GO. “Eles simplesmente estão ignorando este artigo na lei”, comentou.O advogado Camilo Rodovalho, que acompanha a comissão em nome de um deputado estadual, diz que caso a Prefeitura mantenha seu posicionamento é o caso dos conselheiros do TCM-GO voltarem a determinar o cumprimento da lei municipal ou então a comissão formada pelos candidatos negros deve judicializar o processo. “O Ministério Público também pode interferir nesta situação. O órgão tem competência para isso, e seria muito importante uma determinação vinda do MPGO para que a Prefeitura cumpra a lei de cotas sem suspender a nomeação dos convocados”, comentou Camilo.O advogado também destaca que só no caso da denúncia verificada pelo MPC foram constatados em apenas um dos cargos com vagas no concurso sete nomes de candidatos negros que foram cocolocados erroneamente como cotistas apesar de terem obtido nota para serem incluídos na ampla concorrência. “Então não precisa ser matemático para perceber que o número (de candidatos chamados na retificação) deveria ser bem maior do que os 20.”Outro entendimentoA Semad afirma que o acréscimo de 20 candidatos aprovados nas cotas de negros e pessoas com deficiência é uma “correção para o rigoroso cumprimento da Lei de Cotas” e que foi calculado “a partir do entendimento e análise da Procuradoria Geral do Município (PGM), em conformidade com as orientações do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM)”. “O cálculo foi feito levando em conta que, após chamar os dois primeiros candidatos na ampla concorrência, o terceiro seria convocado da cota de negros e, após isso, a cada quatro chamados, o próximo seria também da cota de negros (proporcionalidade de 20%), e outro da cota de pessoas com deficiência (proporcionalidade de 5%)”, explicou. Sobre o cumprimento do artigo 3 da lei 9.791, a Semad diz entender que os candidatos negros “só deixam de ser cotistas, se forem chamados em melhor colocação na lista de ampla concorrência”.A secretaria também argumentou que foram identificados alguns “erros no sistema” que ocasionaram o envio dos ARs para endereços errados. “Nestes casos, esclarecemos que o documento oficial para efeito de convocação em Concurso Público é o Diário Oficial do Município de Goiânia.”Na nota enviada ao POPULAR, a pasta não explicou porque em um mês mudou o entendimento a ponto de reduzir de 119 para 20 o tamanho da lista de novos nomes. “Na manhã desta segunda-feira (06/03), a Secretaria Municipal de Administração (Semad) recebeu algumas pessoas aprovadas no concurso, e explicou todos os procedimentos adotados, além de detalhar como foi organizada a lista de convocados divulgada no Diário Oficial.”