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Com tumor no cérebro, cacique precisa de energia na aldeia no Norte Goiano

Walter Sanches
Parazinho, Niwathima (com um dos filhos), Matxa, Trumak e Tuia: grupo remanescente avá-canoeiro

Um dos últimos remanescentes do grupo indígena avá-canoeiro, contatado pela Fundação Nacional do Índio (Funai) em 1983, no norte de Goiás, o cacique Trumak, de 37 anos, está internado desde janeiro num hospital de Goiânia em tratamento contra um tumor no cérebro. O retorno à aldeia, para o período de convalescência, depende da ligação de energia elétrica ao local, fato que tem mobilizado diversos indigenistas em busca de uma solução junto à concessionária Equatorial.

Desde a internação de Trumak, diversas mensagens correram as redes sociais. O cacique foi levado inicialmente para uma unidade hospitalar de Uruaçu e depois encaminhado para Goiânia. Jucilene Barros, que integra o movimento indígena, contou que, assim que for para casa, o que deverá ocorrer no final do mês, o cacique vai precisar de equipamentos de saúde que dependem de energia elétrica para o funcionamento. “A rede elétrica está a 2 km da aldeia, mas não há previsão de chegar até lá.”

A advogada Fernanda Pimenta Dourado França foi procurada e reforçou a mobilização. “Enviei um e-mail à Equatorial pedindo esclarecimentos porque a aldeia solicitou a energia há muito tempo. Várias propriedades rurais no entorno já têm o benefício. Queremos saber porque esse processo não foi para frente”, explicou. A advogada diz que a empresa tem 15 dias para responder à demanda e, caso isso não ocorra, irá entrar com um mandado de segurança, com tutela de urgência. “Os indígenas estão com a vida prejudicada por falta de energia na aldeia. Não é somente o Trumak, mas tem uma idosa que precisa sair da aldeia para tratamento em razão disso.”

A idosa é Matxa, a matriarca do grupo, que está com quase 86 anos. Cega e com problemas de saúde, ela passa a maior parte do tempo deitada em uma rede. Sua irmã, Naqwatcha, morreu em maio do ano passado, aos 79 anos, no Hospital Centro Norte Goiano, em Uruaçu, em razão de um câncer. A mesma doença matou em 2017 a “pessoa-alma” do grupo, Iwaí, pai de Trumak, que estava com 56 anos. Ele perdeu o pai em um massacre e assistiu a morte da mãe em ataques de homens que buscavam riquezas na terra indígena. Até o primeiro contato com a Funai nos anos de 1980, era o caçador da tribo.

Há 14 anos, a irmã de Trumak, Niwathima, se casou com o tapirapé Kapitomy’i, conhecido como Parazinho e tiveram três filhos, os meninos Paxeo (13), Kaogo (8) e a menina Wiroi (9). O encontro dos dois povos, tapirapé de Mato Grosso e avá-canoeiro de Goiás, foi uma ideia do ex-chefe do posto indigenista da Funai em Minaçu, Walter Sanches, que viu na união das etnias tupi-guarani, pertencentes ao mesmo grupo linguístico, um sopro de esperança para a continuidade dos avá-canoeiro de Minaçu.

Aparição

Na aldeia em Minaçu vivem hoje Matxa; Tuia, mãe de Trumak; o próprio Trumak; Niwathima, o marido Parazinho e os três filhos. Este é o grupo remanescente do povo resistente que durante anos ficou escondido entre formações rochosas e cavernas às margens do Rio Maranhão, afluente do Tocantins, fugindo de massacres ordenados por fazendeiros. Em 1983, por causa de incêndios, Matxa, Naqwatcha, Iwai e Tuia se apresentaram a um trabalhador da região, que chamou a Funai.

Até a segunda metade do século 18, o povo avá-canoeiro chegou a 2 mil integrantes que ocupavam uma vasta área de Cerrado no Norte de Goiás. Com a entrada dos colonizadores, foram perseguidos e dizimados. Uma parte conseguiu se deslocar até a bacia do Araguaia, na Ilha do Bananal, onde ainda vivem cerca de 50 remanescentes. O outro grupo, bem menor é este, de Minaçu, que continua uma saga de resistência.

Ligação depende de licenciamento ambiental 

O Ministério Público Federal (MPF) em Goiás informou em nota que recebeu no dia 31 de janeiro último uma representação sobre a questão da falta de energia elétrica na aldeia avá-canoeiro em Minaçu. “Já foram solicitadas informações, em caráter de urgência, à Funai, à Secretaria Especial de Saúde Indígena e à concessionária Equatorial Energia. A partir da análise das respostas, o MPF definirá os próximos passos, o que pode significar a instauração de um inquérito ou outras medidas cabíveis.”

Também em nota, a Equatorial disse que o pedido de ligação de energia feito pelo grupo indígena está em andamento dentro da companhia. A concessionária explicou que após levantamentos técnicos, ficou evidenciada a necessidade de emissão de licença ambiental para a construção da rede. Durante o processo de licenciamento, o órgão responsável, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) apontou necessidade de adequações ao estudo de impacto ambiental. “Em atendimento à solicitação do órgão, a companhia irá concluir as adequações até o dia 22 de fevereiro para nova submissão de análise do Ibama.”

A concessionária informou ainda que “assim que o órgão ambiental concluir o processo de licenciamento ambiental, seguirá com máxima urgência e envidará todos os esforços para a conclusão da ligação do cliente”. A companhia enfatizou que está empenhada em resolver a questão com a maior agilidade possível.

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