A Companhia Municipal de Urbanização de Goiânia (Comurg) reduziu o pedido de diesel usado nos caminhões em pelo menos 20% por alguns dias na semana passada, passando de 15 mil litros diários para 12 mil. A redução coincide com uma nova crise na coleta de lixo que causou forte indignação da população e foi reconhecida pela própria companhia e pela Prefeitura. Entretanto, também ocorre na mesma época em que servidores da companhia reclamam da falta de combustível para outros serviços, com dezenas de veículos e equipamentos parados em pontos de apoio durante o feriado prolongado de 12 de outubro.A Comurg e a Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana (Seinfra), responsável pelo contrato com a companhia para a coleta de resíduos sólidos, limpeza urbana e gestão do aterro, se recusam a falar sobre o problema do acúmulo de lixo residencial em toda a cidade que se agravou nos últimos dias. A companhia também se omite sobre a questão dos combustíveis e dos outros serviços afetados e diz apenas que a situação da coleta será normalizada até domingo. Já a Seinfra se limitou a dizer que não há novidades sobre o tema.A falta de combustível para os caminhões foi comentada por diversos servidores, porém a Comurg se silencia sobre o assunto. Nos bastidores, a direção da companhia trabalha para aumentar os repasses feitos pela Prefeitura e usa as dívidas com fornecedores para justificar os problemas enfrentados e a dificuldade na solução dos mesmos. Existe uma pressão política interna na Prefeitura para a redução nas despesas com investimentos para atender à demanda da companhia.A reportagem teve acesso a orientações repassadas internamente em áudio para os motoristas que estivessem com veículos com o tanque na reserva deveriam ficar parados nos pontos de apoio. A situação foi normalizada nesta segunda-feira (16). Muitos veículos a gasolina, porém, continuavam parados.Os caminhões compactadores são próprios da Comurg. Já os usados para outros serviços são alugados e na quarta-feira da semana passada parte desta frota ficou parada, alguns servidores falam em até 40%, sob alegação de não haver combustível. Gradativamente o uso destes caminhões foi sendo normalizado. Já a redução dos compactadores nas ruas teria relação com a quebra dos mesmos.Lixo acumuladoOficialmente, a versão da companhia e da Prefeitura para a crise da coleta é que os caminhões compactadores usados na coleta estão com a vida útil vencida e que a quebra destes veículos é constante, tendo sido maior que o normal na semana passada. Porém, eles não passam os números da frota em uso e em manutenção. Também não dizem como estão fazendo para compensar os dias em que a coleta foi deficitária.A situação dos caminhões compactadores, entretanto, segue sem transparência. A Comurg falava serem necessários 46 destes veículos em funcionamento para fazer a coleta de lixo de forma adequada. No dia 11 de setembro, o presidente da companhia, Alisson Borges, afirmou que “nos dias bons” havia disponível 42 caminhões, mas que em média funcionam 32 ou 33 diariamente. Uma semana depois, a assessoria da Comurg afirmou que a média seria 37. Ontem, uma autoridade ligada à Prefeitura afirmou que durante a crise mais recente havia “vinte e poucos”.A reportagem voltou a pedir para a Comurg o número de caminhões em uso por dia desde o começo do mês, mas a companhia se recusou a repassar a informação. A empresa, que é pública, também não respondeu qual a explicação especificamente para esta crise no final de semana, visto que a quebra de veículos como justificativa é uma constante desde o segundo semestre do ano passado. A reportagem também perguntou sobre as estratégias para lidar com o déficit de caminhões, mas não houve retorno.Já a Seinfra não quis responder sobre como tem lidado com a crise na coleta, por ser quem contratou a Comurg, nem se tomou alguma providência, se já notificou a companhia e se já houve alguma punição pela dificuldade em cumprir o serviço conforme contratado.Mais tarde, o prefeito publicou em suas redes sociais fotos de uma reunião com o presidente da Comurg e secretários e escreveu que cobrou dele “a imediata regularização da coleta de lixo orgânico de Goiânia”. Ele também defendeu o argumento de que o problema se deu por causa da manutenção dos caminhões e que a crise da companhia é “histórica”. “Tenho acompanhado este assunto de perto para garantir que a cidade e os cidadãos não sejam prejudicados por problemas históricos da companhia.”Duas licitações lançadas no primeiro semestre pela Prefeitura e pela Comurg relativos à coleta de lixo não prosperaram. A do Executivo trata da terceirização do serviço para uma empresa particular e encontrou entraves no Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás (TCM-GO) por sobrepreço em um serviço e falhas em pontos do edital. Internamente, a dificuldade está em dar um destino para os servidores da Comurg que prestam o serviço e ficariam sem função.Já a licitação da companhia era para locação de caminhões compactadores novos, o que permitiria atender a demanda conforme contratado com o Paço. Entretanto, o edital foi suspenso após questionamentos e nos bastidores o que se diz é que não será relançado. A Comurg não se pronuncia sobre o tema.Mais recursosApesar de as dívidas com fornecedores serem usadas como argumento para justificar os pedidos da companhia por mais recursos, a reportagem apurou que não há nenhuma suspensão de serviços no momento por parte das empresas por causa de atrasos nos pagamentos. Hoje, em visita a alguns pontos de apoio, a situação já estava normalizada com a maioria dos veículos em circulação.Neste ano, a Comurg conseguiu o reajuste de 41% no valor do contrato com a Seinfra, passando de R$ 481,3 milhões por ano para R$ 557,6 milhões em janeiro e, agora, para R$ 681,1 milhões. Este novo valor está para ser divulgado junto com o contrato que ainda não foi publicado. A companhia pleiteava um pagamento anual de R$ 732 milhões. Também conseguiu mais R$ 70 milhões relativos a um retroativo até julho do ano passado contando o reajuste de janeiro e mais R$ 26 milhões com a compra de dois imóveis pela Prefeitura da Companhia Municipal de Pavimentação (Compav), empresa em liquidação da qual a Comurg é principal acionista.Na semana passada, a Comurg recebeu mais R$ 6,7 milhões como indenização pelos serviços diversos, como pintura e revitalização de canteiros centrais, recolhimento de galhos, entre outros. O argumento, conforme a reportagem apurou, é que o volume de serviço previsto no contrato até dezembro já foi prestado até o início do segundo semestre por excesso de demanda da Prefeitura. A partir de agora, até o novo contrato ser publicado, estes serviços serão pagos como indenização.Existe um acordo também para o repasse de pelo menos mais R$ 33 milhões para a Comurg por meio da integralização do capital social, medida que foi tentada pela Prefeitura no final do ano passado com envio de um projeto de lei para a Câmara Municipal. Na época, os vereadores rechaçaram a medida, questionando o destino dos recursos. O Paço Municipal não informou o que seria feito com o dinheiro pela companhia e isso gerou uma crise, já pacificada. Um novo valor, maior que o original, está sendo discutido para esta nova tentativa.A demanda por novos recursos tem gerado uma crise interna na Prefeitura envolvendo a Secretaria Municipal de Finanças (Sefin) e a Comurg. A primeira reclama que para atender aos pedidos precisaria retirar recursos previstos para os investimentos do programa Goiânia Adiante, carro-chefe da atual gestão para melhorar a imagem do prefeito. Já a companhia afirma que sem os recursos extras não resolve uma crise financeira histórica, que teria origem – na versão oficial – em gestões anteriores e se agravado no contrato em vigor por causa de erros nos cálculos dos serviços que foram oferecidos.Politicamente, esta crise tem sido usada para aumentar as pressões na Sefin, na Comurg e também na Seinfra, que é responsável pela maioria das obras do Goiânia Adiante, ficando com boa parte dos recursos. Publicamente, a Prefeitura tem alegado que a gestão tem enfrentado uma crise financeira com a redução de repasses federais e o aumento nas despesas. Esse argumento é usado, por exemplo, para justificar o não-atendimento das demandas dos administrativos da Educação, em greve há duas semanas.Ação do MPA promotora Leila Maria de Oliveira, da 50ª Promotoria de Justiça do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), entrou com uma ação cautelar pedindo à Justiça que obrigue a Comurg a regularizar os serviços de coleta de lixo, conforme contrato com a Seinfra, em 48 horas. Leila diz que “resta claro” que a companhia não tem cumprido devidamente o contrato, “pois sequer executa os serviços essenciais como o de coleta de lixo, além de prestar, de forma insatisfatória e insuficiente, os demais serviços contratados”. Na ação, a promotora cita entrevista do Alisson ao Jornal O Popular na qual ele afirma que a Comurg não teria condições de fazer a coleta de forma que precisaria.