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Empresa do Pará vence 14 de 31 licitações para CMEIs em Goiânia

Wesley Costa
CMEI do Parque Atheneu II, cuja obra se encontra paralisada e será retomada por empresa paraense que venceu licitação: ordem de serviço ainda não foi assinada pela Prefeitura

Uma empresa de São Geraldo do Araguaia (PA), cidade de 24,2 mil habitantes que fica na divisa com Tocantins, venceu 14 de 31 licitações feitas a partir de março deste ano pela Secretaria Municipal de Administração (Semad) de Goiânia para construção ou conclusão de unidades de ensino infantil e fundamental, além de quadras poliesportivas da rede municipal de educação. Para conseguir os contratos, a Antech Solução e Gestão fez propostas que giraram entre 20% e 26,5% de desconto em relação aos valores estimados pela Semad nos editais.

As licitações foram feitas dentro do formato Regime Diferenciado de Concorrência (RDC), criado pelo governo federal em 2011 para dar celeridade às principais obras de infraestrutura para realização da Copa do Mundo (2014) e das Olímpiadas no Brasil (2016). O RDC tem brechas legais que reduzem o tempo para contratação, mas ao mesmo tempo apresenta fragilidades, segundo especialistas, quando envolvem obras ou empresas de pequeno porte. A modalidade foi usada apenas 11 vezes pela Prefeitura de Goiânia desde 2013 e em apenas duas os serviços foram executados.

A participação da Antech ainda foi facilitada pela decisão da Prefeitura de realizar a RDC eletrônica, que não exige a presença física de representantes das empresas no dia da realização do processo. Mudanças na legislação permitiram a adoção desta modalidade que pode ser feita pela internet. Também em 2023 o Paço adotou outros modelos eletrônicos pela primeira vez, como a concorrência.

Os contratos vencidos pela Antech vão render à empresa R$ 52,3 milhões, o equivalente a 72,3% dos valores a serem pagos nas 31 obras licitadas.  Outras sete empresas vão dividir entre elas os 17 contratos restantes, que somam R$ 23 milhões. Ainda há mais cinco licitações em andamento,  com valor estimado total de R$ 21,6 milhões, e destes a Antech deve ficar com duas que podem render até R$ 9,8 milhões.

Estas obras integram o programa Goiânia Adiante, pacote de investimentos em infraestrutura na ordem de R$ 1,7 bilhão lançado em outubro do ano passado, que envolve as áreas de urbanismo, saúde e educação. O sucesso deste programa é visto como prioridade pela atual gestão para recuperar a imagem do prefeito Rogério Cruz (Republicanos) entre a população até o período eleitoral. Desde o primeiro semestre ele tem feito uma série de vistorias de obras e fragmentado a entrega das obras do Goiânia Adiante para gerar notícias positivas.

Representante da Antech, Valdeci Lutz diz que a empresa está preparada para atuar em Goiânia e que deve montar uma filial na capital goiana para atender a demanda. Ele afirma que a empresa conseguiu oferecer boas propostas por não terceirizar os serviços a serem realizados. Também afirmou que a Antech tem experiência em obras de construção, dando como exemplo contratos com as universidades federais de Jataí (UFJ) e do Piauí (UFPI), além de serviços para prefeituras do interior do Pará.

A sede da Antech fica em São Geraldo do Araguaia, cidade próxima de Araguaína (TO) e a 1.264 km de Goiânia. A empresa diz que seu escritório, entretanto, fica em Belém, que está a 711 km de São Geraldo. Os contratos são assinados por Marlene Regina Sander, cujo endereço consta como de Salinópolis, cidade do litoral paraense a 216 km de Belém. Questionado sobre isso, o representante da Antech se limitou a dizer que Salinópolis é uma das “mais belas” praias do Pará e que até ele gostaria de morar lá.

Além da Antech, que é de São Geraldo do Araguaia, há duas empresas vencedoras dos RDCs que são de Brasília (Roma Edificações e a Silva Engenharia) e uma de Aparecida de Goiânia (Tom Construtora). O restante tem sede na capital goiana (MRL Construtora, Senior Engenharia, Ambiental Tecnol e Funcional Construtora).

A Antech afirma que já está pronta para começar os trabalhos, esperando apenas a assinatura das ordens de serviço para apresentar os projetos à Secretaria Municipal de Educação (SME). Só então é que serão apresentados os projetos e os cronogramas de andamento para as obras. “Com abertura da filial, estamos aguardando finalizar os trâmites legais dos contratos e iniciar a contratação dos profissionais e trabalhar em módulos. Aguardando só o ‘start’”, comentou Valdeci.

A Prefeitura diz que das 14 licitações vencidas pela empresa, duas estão em fase de assinatura do contrato, quatro em emissão da nota de empenho, duas em publicação do gestor de contrato no Diário Oficial do Município (DOM), uma em publicação do extrato do contrato no DOM, três em fase de certificação do contrato pela Controladoria Geral do Município (CGM) e duas em fase de assinatura do pedido de compra.

O Paço também argumenta que realiza as contratações com base nas legislações vigentes, e que, desta forma, “se a empresa atende os requisitos legais dentro do edital”, não há o que ser questionado até a homologação da licitação. Posteriormente, cabe à secretaria demandante, no caso a da Educação, a responsabilidade por fiscalizar a execução das obras de acordo com o previsto no contrato.

Modalidade acelerada de licitação é pouco usada

O Regime Diferenciado de Contratação (RDC) não é uma prática de licitação adotada com frequência pela Prefeitura de Goiânia. Dos 11 procedimentos que aparecem no Portal de Transparência da administração municipal, nove foram entre 2013 e 2015, uma em 2020 e outra no ano passado. Levantamento feito pelo reportagem identificou que apenas três foram efetivamente levadas adiante, sendo que duas concluídas e outra segue em andamento, com atraso.

As duas já concluídas são obras de grande porte custeadas com recursos federais. Em 2014, foi feito um RDC para revitalização da Praça Cívica, cujos trabalhos só foram concluídos em 2020. Já no ano seguinte, o executivo deu início por meio de outro RDC à construção do Hospital e Maternidade Célia Câmara, inaugurado em 2020. 

Em março de 2023, a Prefeitura assinou o contrato para a construção de um Centro Municipal de Ensino Infantil (CMEI) na Vila Santa Helena, cuja empresa responsável foi selecionada por meio de um RDC lançado no ano anterior. A obra teve um aditivo em agosto dando mais 90 dias para sua conclusão.

Os outros RDCs lançados antes de 2023 não tiveram sucesso. Em 2013, uma empresa venceu dois para construção de praças que integram um projeto do governo federal na época, mas as obras nunca foram concluídas. Em 2020, o Paço Municipal lançou um único RDC para construção de 20 CMEIs, mas a licitação foi suspensa a pedido do Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás (TCM-GO).

Grandes obras

O secretário de Fiscalização de Obras e Serviços de Engenharia do TCM-GO, Messias Anain, diz que o RDC é muito pouco usado pelas prefeituras, sendo que quando isso ocorre envolve grandes cidades e grandes obras. Isso ocorreria porque muitos gestores estavam tendo problemas quando a licitação nesta modalidade era vencida por pequenas empresas. “Os municípios não se deram tão bem como o governo federal com os RDCs”, comentou.
Messias explica que, apesar de ser uma modalidade interessante no aspecto de celeridade para a contratação, os relatos das prefeituras que tentaram adotar o RDC envolve de falhas nas premissas que constam nos editais a problemas nos projetos e nos cálculos feitos pelas empresas para vencer as licitações.

O RDC deixa para as empresas vencedoras a responsabilidade pela elaboração dos projetos das obras, enquanto ao poder público cabe apenas deixar claro no edital algo mais básico, que sirva de base para a proposta do licitante a ser apresentado apenas após a assinatura da ordem de serviço.

Com isso, as empresas têm mais dificuldades para efetuar os cálculos dos custos, já que não há no edital uma referência de serviços a serem executados em uma planilha. Os valores apresentados nos editais são com base em estimativas. “Muitas das empresas vencedoras começaram a ter problemas na execução das obras”, relata o secretário do TCM-GO.

Riscos minimizados

A Prefeitura de Goiânia afirmou que quanto aos riscos de empresas não concluírem os serviços contratados por meio de RDC há penalidades e sanções estão previstas no edital e nos respectivos contratos, mas que “uma vez que a empresa comprove atendimento a todas as exigências cabe à administração pública dar prosseguimento à contratação dos serviços”.

O Paço afirma que a escolha pelo modelo de Regime Diferenciado de Contratações (RDC) para as licitações foi definida com base na legislação federal, que permite seu uso em obras e projetos de engenharia para os sistemas públicos de ensino. 

O executivo destacou a forma como se dá esta licitação com o critério de julgamento por menor preço. “Nos casos apresentados, o modo de disputa foi fechado, em que o valor de cada proposta torna-se sigilosa até a data da abertura da licitação, ocasião em que são levados a disputa e ordenados conforme as vantagens diante do critério de julgamento estabelecido.”

O representante da Antech, Valdeci Lutz, afirmou que a empresa é sólida, com escritório da capital paraense e agora com uma filial em Goiânia. Além dos contratos já iniciados nas universidades federais e nas prefeituras do Pará, há, segundo ele, um sendo iniciado com o governo paraense. 

Na Universidade Federal de Jataí (UFJ), a contratação também foi por meio de RDC, para a construção de vestiários para o curso de Medicina Veterinária. Já na Universidade Estadual do Piauí (Uespi), a Antech faz uma biblioteca. No município de Cametá, a empresa é responsável pela construção de uma escola.

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