O carnaval do Rio de Janeiro ainda não começou oficialmente, mas o samba enredo da Imperatriz Leopoldinense, escola de samba de Ramos, zona norte carioca, continua a provocar polêmicas e atrair a indignação de setores do agronegócio nacional, que se sentem atacados pelo tema escolhido pela agremiação para a festa deste ano.Mais uma entidade, a Associação Brasileira da Indústria do Arroz (Abiarroz), divulgou nota criticando publicamente o enredo “Xingu, o Clamor da Floresta”, para o carnaval 2017 do Rio. De acordo com a entidade, “o conteúdo tende a uma clara desconstrução do agronegócio brasileiro, mundialmente reconhecido por seu viés sustentável, sua contribuição para a economia do país e seus avanços tecnológicos, que são referências para outras nações”.Mais adiante, a Abiarroz assegura que o enredo produzido pela Escola de Samba Imperatriz Leopoldinense "é incongruente com o que o Brasil busca, defende e trabalha há décadas. Dado o alcance mundial e a importância cultural do carnaval do Rio de Janeiro, é importante registrar o grande potencial de prejuízos ao país, tanto internamente como no cenário internacional, decorrente do evidente desconhecimento e da imprudência com que a escola de samba em referência designa o agronegócio nacional”.EsclarecimentoPara a Imperatriz Leopoldinense, o assunto foi encerrado na última semana, com a divulgação de uma nota oficial de esclarecimento à imprensa, na qual assegura o comprometimento da escola em dar voz à diversidade, decidindo levar para a Marquês de Sapucaí este ano o enredo Xingu - o Clamor que vem da Floresta, de autoria do carnavalesco Cahe Rodrigues. “Vamos falar da rica contribuição dos povos indígenas do Xingu à cultura brasileira e ao mesmo tempo construir uma mensagem de preservação e respeito à natureza e à biodiversidade”.Assinada pelo presidente da agremiação, Luiz Pacheco Drumond, a nota destaca que o homem do campo tem sido presença constante nos desfiles da Imperatriz, que já ressaltou em vários carnavais o solo brasileiro, “este chão abençoado por Deus onde tudo que se planta, dá”. Drummond lembra, inclusive, que no carnaval do ano passado, foi homenageada a dupla sertaneja Zezé di Camargo e Luciano. O enredo abordou riquezas do estado de Goiás e o setor agrícola, “por entendermos a importância desse segmento para nossa economia”.A "rainha de Ramos", como é chamada na comunidade, sublinha ainda que segundo relato dos próprios indígenas que vivem no Xingu, a região continua sendo objeto de disputas e conflitos. “A produção muitas vezes sem controle, as derrubadas, queimadas e outros feitos desenfreados em nome do progresso e do desenvolvimento afetam de forma drástica o meio ambiente e comprometem o futuro de gerações vindouras. Os resultados, como sabemos, são devastadores e na maioria das vezes irreversíveis”, informa o presidente da escola.Em relação ao trecho do samba que diz “o belo monstro rouba a terra de seus filhos, destrói a mata e seca os rios”, a escola se junta “às populações ribeirinhas, às etnias indígenas ameaçadas, aos ambientalistas e importantes setores da sociedade que se posicionaram contra a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Não é uma referência, portanto, ao agronegócio, como alguns difundiram”.DifamaçãoA agremiação esclarece ainda que além da missão de entreter moradores e turistas, as escolas de samba e o carnaval, “levando em consideração que os olhos do mundo se voltam para nossa festa, têm compromisso com o social e o desenvolvimento sustentável”. Luiz Pacheco Drumond assegurou que a escola de samba carioca foi alvo de intensa campanha difamatória após a divulgação de suas fantasias, algumas das quais denunciavam o uso irresponsável de agrotóxicos.Segundo Luiz Drumond, ”embora não seja nossa intenção generalizar, importantes pesquisas científicas apontam os diversos males que o agrotóxico traz para o solo, para o alimento e, consequentemente, para a saúde de quem o consome. Este é apenas um aspecto do nosso rico e imenso enredo, mas desde então temos recebido críticas e inúmeras notas de repúdio dos mais diversos setores do agronegócio”.A Imperatriz Leopoldinense assegura que em nenhum momento atacou o setor do agronegócio, nem os trabalhadores do campo. “A nossa mensagem é de preservação, respeito, tolerância e paz. Todos os que acreditam nesses valores estão convidados a celebrar conosco”.Para a Abiarroz, os argumentos apresentados não convencem. A entidade considera que há na proposta do enredo “conceitos e interpretações errôneas”. E completa: “Trata-se de uma generalização nitidamente divorciada da realidade do agronegócio do país, o qual, como se sabe, tem seu Produto Interno Bruto (PIB) apoiado na agricultura e pecuária”.SNANa avaliação do presidente da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), Antonio Alvarenga, a polêmica envolvendo a escola de samba e o setor agrícola brasileiro foi um pequeno mal entendido que não vai demorar a ser esquecido. O enredo da Imperatriz, voltado para a defesa dos indígenas do Xingu, em determinado momento resolveu atacar os agrotóxicos, ou defensivos agrícolas, que o agronegócio precisa usar para produzir, indicou.Alvarenga salientou que o monstro a que a escola se referia era a Usina Hidrelétrica de Belo Monte, embora os produtores da área entendessem que o alvo seria o produtor rural como um todo. No final, disse que a agremiação carnavalesca lucrou com a maior exposição que teve na mídia, enquanto o agronegócio ”defendeu seu ponto de vista com galhardia, com força”. A polêmica, reiterou, vai acabar no carnaval. “É uma oportunidade para a escola se projetar e também para o agronegócio mostrar o seu valor”.A escola Imperatriz Leopoldinense faz ensaio técnico na Marquês de Sapucaí no dia 18 de fevereiro, às 22h. A programação prevê, no domingo (19), às 19h30, a realização do teste de luz e som na Passarela do Samba, seguindo-se, às 20h30, tradicional cerimônia de lavagem da pista. Fechando o ciclo, fará ensaio técnico, às 22h, a escola Estação Primeira de Mangueira, campeã do grupo especial do carnaval 2016. Os ensaios técnicos começaram ontem (15).