Geral

Envelhecer bem com HIV é possível

Diomício Gomes
A. R. descobriu o HIV aos 70 anos, está com 77 e leva uma vida plena: “decidi não me preocupar e sim, me cuidar”

Aos 70 anos, o aposentado A. R. percebeu que algo estava errado com seu organismo. Sentindo uma grande fraqueza, procurou um serviço de saúde pública e, após exames, descobriu que tinha HIV, o vírus responsável pela Aids, doença descoberta nos anos de 1980 e que até hoje atemoriza o mundo. Hoje, com 77 anos, o idoso leva uma vida plena, unindo tratamento adequado, exercícios físicos e alimentação saudável. Conviver e envelhecer com o HIV é possível, desde que haja o diagnóstico precoce e os cuidados com a saúde. Este é o principal apelo das autoridades neste 1º de dezembro, Dia Mundial de Luta Contra a Aids

“Aids é uma doença que não tem cura. Quando fiquei sabendo, decidi não me preocupar e sim, me cuidar. De três em três meses vou ao médico, tomo os remédios direitinho, faço academia, caminhada, fisioterapia e jogo bola”, conta A. R., divorciado, pai de quatro filhos e uma “porção de netos” que não vivem com ele. “Moro sozinho, mas estou perfeito.” A. R. faz parte do grupo de infectados (14%) no Brasil que pegou o vírus após os 50 anos.

“O progresso da medicina possibilitou a recuperação sexual plena do idoso e isso precisa ser conversado para criar chances de diagnóstico precoce.” A afirmação é do médico infectologista Luiz Carlos Silva Souza, do Hospital de Doenças Tropicais Dr. Anuar Auad (HDT), unidade da Secretaria Estadual de Saúde (SES), referência em tratamento de HIV/Aids, gerida pelo Instituto Sócrates Guanaes (ISG). Ele defende que na ponta, nos “postinhos de saúde”, ou mesmo nos serviços privados, que profissionais - médicos, enfermeiros, psicólogos, fisioterapeutas, etc. - não percam a oportunidade de conversar sobre essa realidade. “No Brasil, em torno de 43% das pessoas com HIV têm entre 15 e 29 anos, mas em torno de 14% estão com mais de 50 anos e a tendência é que isso se amplie. Na Europa e nos Estados Unidos, mais da metade das pessoas infectadas são idosas.”

O infectologista, que também é professor do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública da Universidade Federal de Goiás (UFG), lembra que a infecção por HIV possui um processo evolutivo e em torno de 85% dos que se contaminam poderão adoecer num período de 8 a 12 anos se não se tratarem. “Isso significa que 15% vão continuar sadios e talvez ultrapassem décadas e 1% consegue fazer o controle do vírus de forma espontânea, mas é a minoria, por isso é fundamental o diagnóstico precoce e fazer o tratamento para barrar a doença.” Luiz Carlos enfatiza que, independente da idade, se a pessoa suspeita de que tenha se exposto ao vírus em algum momento, o mais sensato é fazer o teste.

O infectologista lembra que o tratamento não é curativo. “É um medicamento simples, um ou dois comprimidos tomados diariamente, dependendo do caso. E com a perspectiva de num futuro próximo termos medicamentos inovadores, como injeções em intervalos maiores.” O infectologista reforça que a expectativa de vida de quem tem HIV e faz o tratamento correto é a mesma de quem não tem. “Às vezes pode até viver mais porque se cuida, do ponto de vista alimentar e de atividades físicas. Conheço pacientes infectados há mais de 20 anos, hoje superando os 90, que estão completamente sadios porque se trataram. As doenças que vieram não foram pelo HIV, mas próprias do envelhecimento”, compartilha Luiz Carlos.

O aposentado T.S, 47 anos, acredita que chegará lá. Ele se contaminou em 1996 e desde então faz o tratamento corretamente no HDT e no Centro Estadual de Atenção Prolongada e Casa de Apoio Condomínio Solidariedade (Ceap-Sol), com atenção especial à alimentação. Em quase 30 anos convivendo com o HIV, T.S. nunca foi internado em razão de doenças oportunistas. Ele conta que pegou a fase experimental do tratamento, com muitos comprimidos e enfrentou efeitos colaterais. “Hoje está ótimo. São apenas dois por dia e meu organismo aceita bem. Minha carga viral está indetectável desde 2005.”

A importância do papel das comunidades

Divulgado esta semana, o novo relatório da Unaids, programa das Nações Unidas para combater a Aids, chama a atenção para o papel desempenhado pela sociedade civil e instituições do terceiro setor na resposta ao HIV. Denominado Comunidades Liderando, o documento lembra que a falta de financiamento e a existência de barreiras, até mesmo por parte do poder público, estão impedindo o que a Unaids chama de “trabalho salvador de vidas” dessas comunidades, criando obstáculos para acabar com a Aids até 2030, conforme os planos da Organização Mundial de Saúde (OMS).
 
“As comunidades em todo o mundo mostraram que estão prontas, dispostas e capazes de liderar o caminho para acabar com a Aids como ameaça à saúde pública. Mas é necessário que as barreiras que obstruem seu trabalho sejam derrubadas, que elas sejam devidamente financiadas”, disse Winnie Byanyima, diretora executiva da Unaids. 

Segundo ela, com frequência, as comunidades são tratadas por quem tem poder de decisão como problemas a serem gerenciados, em vez de serem reconhecidas e apoiadas no seu papel de liderança. “As comunidades não são um entrave: elas iluminam o caminho para o fim da Aids.”

Mudanças inovadoras
Conforme o relatório, a atuação das comunidades, desde o trabalho nas ruas até a ação em tribunais e parlamentos, garantiu mudanças inovadoras nas políticas relacionadas à Aids, como o acesso a medicamentos genéricos para o tratamento contra o HIV. 

“Isto resultou em reduções acentuadas e sustentadas no custo do tratamento, de US$ 25.000 por pessoa, por ano, em 1995, para menos de US$ 70, em muitos países mais afetados pelo HIV, hoje”, diz o documento. 

Em todo o mundo, estima-se que 39 milhões de pessoas vivem com o HIV. No Brasil, são mais de 1 milhão, segundo o Ministério da Saúde. No ano passado foram registrados 16,4 mil casos de infecção. 


Ações marcam o Dia Mundial de Luta Contra a Aids em Goiânia

Para lembrar o Dia Mundial de Luta Contra a Aids, o Ceap-Sol, unidade da SES-GO, também sob a gestão do ISG, promove nesta sexta-feira, 1º de dezembro, uma ação social em dois pontos da capital. Serão realizados testes rápidos de HIV/Aids, distribuição de autotestes para o diagnóstico da doença, entrega de folders informativos e de preservativos no Terminal das Bandeiras, no Jardim Europa, e no shopping Plaza D’oro, bairro Eldorado. A ação será das 13h30 às 17 horas. 

Das 15 às 17 horas, no miniauditório da Faculdade de Educação da UFG, no Setor Leste Universitário, haverá uma roda de conversa sobre os 40 anos de luta contra a Aids/HIV: avanços históricos e novos enfrentamentos, com a participação da Associação de Travestis, Transexuais e Transgêneros de Goiás (Astral) e com a Camaleoa. No local, o projeto Sempre Viva do Núcleo de Estudos em Epidemiologia e Cuidados em Infecções Transmissíveis e Agravos à Saúde Humana (NECAIH), da Faculdade de Enfermagem da UFG, irá oferecer teste rápido de HIV e distribuir preservativos.

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