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Gigantes e vandalizadas, gameleiras de Goiânia pedem socorro

Wildes Barbosa
Gameleira na Vila Pedroso já teve parte da copa retirada

Moradores e comerciantes cobram o apoio da Prefeitura na conservação de gameleiras em Goiânia. As árvores da espécie de grande porte que estão na capital têm em torno de 60 anos, e podem ultrapassar os 20 metros de altura e 4 de diâmetro, além de possuírem uma copa vasta de folhagem que divide espaço com longos cipós. As raízes são extensas e grossas, de aparência contorcida e precisam de espaço para crescerem e sobreviver. Por este motivo, precisam ter uma manutenção regular para facilitar a coexistência urbana, algo que, segundo pessoas ouvidas pela reportagem não tem acontecido.

Um caso recente no Setor Marista, no último sábado (28), evidencia as ações de vandalismo que a espécie sofre na capital. O incêndio que consumiu o que restava da árvore, que tinha mais de 50 anos, teve início por volta das 17 horas e fez com que os bombeiros gastassem cerca de 26 mil litros de água. No entanto, a árvore já tinha sido alvo de dois pequenos incêndios em 2020, fazendo parte das quatro gameleiras incendiadas entre 2016 e 2020 em Goiânia.

A árvore acumulava lixo descarregado por pedestres que circulavam pela área. Outro ponto notável era o avanço das raízes no asfalto da Rua 143 em aproximadamente um metro. Além disso, comerciantes indicam que a gameleira passou a ser local de encontro de usuários de drogas e pessoas em situação de rua, que dormiam na parte oca atrás da gameleira. Essas pessoas, segundo os relatos, costumavam acender fogueiras para se aquecerem ou prepararem alimentos.

Em nota, Agência Municipal do Meio Ambiente (Amma) explica que as gameleiras mais afetadas pelo vandalismo são as localizadas nas áreas mais centrais. “Não é possível afirmar, mas relatos anônimos atribuem a pessoas em situação de rua, que fazem fogueiras buscando abrigos nelas, ou pessoas que não as querem na calçada”, diz a Amma.

Em janeiro, os comerciantes das imediações da Rua 143 acionaram a Amma. A Companhia de Urbanização do Município de Goiânia (Comurg), por sua vez, teria feito a poda da árvore. “Mas (a retirada) foi largada pela metade, com resto de toco e serragem”, afirma o empresário João Paulo Emanuel Freitas de Souza Santos, de 28 anos.

Ele argumenta, também, que a Prefeitura deixava a gameleira “a Deus dará”, sem uma vistoria regular para conservar a saúde da árvore. “Planejamento não tem nenhum, nem de retirada, nem de cuidado, manutenção, nunca teve”, comenta. Agora, após o incêndio, a Prefeitura iniciou a extirpação.

O empresário compreende que a responsabilidade por manter a vegetação e urbanização da cidade também recai aos moradores, mas acredita que não há coerência no manejo da árvore pelos órgãos públicos. “A Prefeitura pede pra gente colocar o piso tátil, por exemplo, mas a árvore ocupa toda a calçada, como a pessoa com deficiência vai passar?”, diz.

O superintendente de Gestão Ambiental e Licenciamento da Amma, Ormando Pires, afirma que as gameleiras são importantes para a cidade. “Não apenas historicamente, mas as frondosas gameleiras geram sombra inigualável, além de fornecer abrigo e alimentação à nossa fauna desde os primórdios da capital. Contudo, como todo ser vivo, chega ao fim de ciclo e deve ser retirado, quando necessário, para evitar maiores inconvenientes e até acidentes”, afirma.

Patrimônio

Em uma calçada na Rua 5 do Setor Oeste, quatro gameleiras estão alinhadas, somando aproximadamente 250 anos de vida, uma atrás da outra, em frente à Praça Mestre Maria Helena Peclat. Uma delas também sofreu com as chamas em 2019, mas sobreviveu e não precisou ser retirada. A vizinhança considera que a vegetação constitui a paisagem da região e a considerada um patrimônio. Por outro lado, as dores de cabeça da falta de cuidado público são constantes.

Para manter a segurança dos moradores e saúde das árvores, o dono da padaria que divide espaço com as gameleiras, Carmon Luiz Siqueira, de 69 anos, cercou a base de duas com cimento para evitar que as raízes subam pela calçada e causem algum transtorno aos clientes que ele recebe. Com o mesmo intuito, instalou revestimento no teto do estabelecimento para protegê-lo dos galhos que caem constantemente, além de instalar cercas de aço no tronco para que as pessoas não joguem lixo.

Tudo isso, de acordo com ele, deveria ter sido feito com mais apoio do governo municipal. “Se eles podassem, pelo menos a parte que fica em cima do teto, porque além de tudo está entortando a árvore e machuca ela”. Siqueira destaca que as gameleiras vez ou outra se tornam abrigo para ratos, marimbondos e abelhas, e os moradores espalham veneno em torno das árvores para espantá-los, o que também prejudica a vida das gameleiras. Ressalta, ainda, que a sombra é desproporcional e impede que cresça grama na metade da praça. “Deveria ter frequentemente biólogo vindo aqui e orientar”, argumenta.

 

Falta educação, diz professora

Disputando espaço com postes, lixeiras, comércio, meio-fio, sinalização e outras instalações urbanas, a presença das árvores em ambiente urbano é boa para os moradores, que deveriam ter mais acesso à educação ambiental. A opinião é da professora e especialista em urbanização Maria Ester de Souza, presidente da Associação para Recuperação e Conservação do Meio Ambiente. “A gente ainda convive com gerações que acham que o vegetal atrapalha. Então o que está errado é a percepção da sociedade da vegetação no ambiente urbano”, diz. Ainda assim, Maria Ester reforça que o vegetal deveria ser cuidado, pelo menos, uma vez ao mês. “Pelo fato da gameleira ser uma espécie para um parque, uma área de praça, um espaço verde com diâmetros acima de 15 metros”, explica. 

Para ela, já que houve a escolha para manter a espécie no local em que estava quando a urbanização avançou, o planejamento das vias urbanas deveria ter considerado a presença das gameleiras.

Em nota, a Amma afirma que “os cidadãos são responsáveis também pelas árvores, especialmente na porta de suas residências”, pois “este cuidado é coletivo”. Em relação a quantidade de gameleiras presentes na capital e o mapeamento delas, não há dados. (Manoella Bittencourt é estagiária do GJC em convênio com a PUC Goiás)

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