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Goiás tem 1,5 mil pessoas na fila para transplante de órgãos

Divulgação
Wictor (à dir.) e a família: Cleuber (pai), Jane (mãe) e Izadora (irmã)

A decisão da família pela doação dos órgãos de Wictor Fonseca Rodrigues, jovem estudante de 20 anos que faleceu terça-feira (10) vítima de um acidente na Avenida T-9, em Goiânia, chama atenção para a importância do gesto. Em Goiás, a fila de espera por transplantes vem crescendo nos últimos anos. O maior obstáculo, conforme avalia a Central Estadual de Transplantes, é o baixo índice de autorização familiar da pessoa falecida quando considerada apta a passar por transplantação.

No momento em que a família recebe a notícia sobre o falecimento e é informada quanto à possibilidade de transplante, é necessário que haja o consentimento formal familiar. Esse ato, conforme relata a gerente de transplantes da SES, Katiúscia Freitas, tem sido cada vez menos frequentes. Enquanto a taxa de recusa do ano passado ficou em 62%, no primeiro trimestre deste ano foi de 69%. Atualmente a fila de espera por transplantes no estado está com 1.552 pessoas, número que nacionalmente é de cerca de 50 mil.

A pandemia de Covid-19 impactou na redução dos procedimentos. Em alguns casos, como o transplante de córneas, as cirurgias ficaram suspensas por seis meses, por não serem consideradas de urgência. Com isso, houve uma queda abrupta dos números, que ainda não se recuperaram. Enquanto em 2019 foram transplantados 842 órgãos ou tecidos, em 2020 o total ficou em 571, uma queda de 32%. No ano passado houve uma recuperação tímida, totalizando 642. Até o mês de abril deste ano foram 148, uma média de 37 por mês, contra 70 mensais registrados em 2019.

Informação

A queda de procedimentos está longe de significar que menos pessoas aptas a doar faleceram. “Em 2021 nós tivemos o maior registro de mortes encefálicas de toda a história de Goiás. Foram 514 casos. Desses, 282 eram doadores elegíveis, mas depois da entrevista com as famílias, apenas 109 autorizaram”, detalha Katiúscia sobre a recusa, que ficou em 62%. Para a gerente, o problema é a falta de informações claras.

Um índice maior poderia significar o atendimento de boa parte da demanda atual, isso porque apenas um doador pode atender várias pessoas. Foi o caso do estudante Wictor. Após a morte cerebral confirmada e a autorização da família, as equipes fizeram a captação dos rins, fígado e córneas. Os órgãos serão destinados a cinco pessoas, todas de Goiás.

O principal motivo argumentado pelas famílias que negam a doação é o desconhecimento sobre a vontade do familiar falecido. “Por isso é importante haver uma sensibilização da população, para que as pessoas conversem sobre isso”, acrescenta a gerente da Central de Transplantes da SES. Pela legislação atual, independentemente da vontade pessoal do indivíduo em vida, após a sua morte a decisão pela doação ou não é de responsabilidade da família.

Os requisitos para a doação são diferentes a depender do procedimento. Para doar córneas é necessário o diagnóstico de morte por coração parado, que é diferente da morte encefálica, popularmente chamada de morte cerebral. Nos casos de mortes cerebrais, o corpo pode ser apto a fazer a doação de diversos órgãos. Em ambos os casos, conforme explica Katiúscia, há a morte constatada, sem possibilidade de reversão.

Entre palestras e campanhas de comunicação, a gerente diz que a Central tem buscado reverter o quadro. “Nós temos buscado fazer capacitações das equipes para o acolhimento. Buscando fazer com que a família entenda o diagnóstico, que é difícil de ser compreendido, mas é preciso entender que a morte encefálica é morte”, detalha.

A gerente da SES lembra que Goiás viveu períodos recentes em que as filas por alguns dos transplantes, como o de córneas, chegaram a ficar quase zeradas. “Então precisamos retomar esse cenário”, afirma Katiúscia. “Antes da pandemia falava-se mais sobre os transplantes. Temos condições de zerar a maior parte da fila. Claro que vamos ter casos com mais dificuldades de compatibilidade, mas podemos reduzir bastante.”

Pai de Wictor diz que decisão observa bondades do filho em vida

O pai de Wictor, o administrador Cleuber Lima, conta que a decisão pela doação dos órgãos teve influência direta de quem foi o filho em vida. “Sempre muito disposto a ajudar a todos, humildade, não fazia distinção de pessoas”, cita o pai, dentre várias outras características. 

“Quando me falaram da opção de doar os órgãos a única coisa que passou pela cabeça foi de que fazendo isso meu filho vai continuar ajudando as pessoas”, diz o pai sob forte emoção. “E também por pensar nos outros pais que poderão ter seus filhos vivos”, acrescenta. 
Na relação com a família, Wictor trazia exemplos de educação, amor e obediência. O pai conta que pessoalmente sempre foi ouvido pelo filho, que será lembrado como muito carinhoso. “Me ouvia bastante. Era o meu companheiro, meu tudo. Era o meu mundo e tenho certeza que eu era o dele também”, descreve.

O jovem chegou a ficar internado após o acidente registrado na madrugada de sábado (7) na Avenida T-9, no Jardim América, mas não resistiu aos ferimentos. O corpo de Wictor começou a ser velado na noite desta quarta-feira (11) na Pax Universal, na Avenida Castelo Branco, Setor Coimbra, em Goiânia. 

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