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Linha de metrô que dá acesso a hospitais de SP está mais demorada

Wilson Júnior/Estadão Conteúdo

Passageiros da linha 2-verde do metrô, ramal que dá acesso a pelo menos dez grandes hospitais, entre eles o Hospital das Clínicas e o Instituto Emílio Ribas, tiveram de aguardar até 4 minutos e 34 segundos na plataforma à espera de um trem em 2020. Ou seja, 1 minuto e 20 acima do tempo que aguardavam em 2019 (41% a mais).

Nos horários de maior movimento, conhecidos como horário de pico, a espera aumentou 35,9%, passando de 2 minutos e oito segundos em 2019 para 2 minutos e 55 segundos em 2020, 47 segundos a mais.

Entre os passageiros da linha estão muitos profissionais de saúde que atuam na linha de frente no atendimento de pacientes com Covid-19, em importantes serviços de saúde públicos e privados, tais como Hcor (Instituto do Coração) da Faculdade de Medicina da USP, Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo Octavio Frias de Oliveira), Igesp ou os hospitais Santa Catarina, 9 de Julho e Santa Joana, além de diversas clínicas médicas e grandes laboratórios.

Ainda em 2020, a linha teve um corte na quantidade de viagens disponíveis, bem como elevação no tempo de espera nas plataformas. Em 2019, a linha 2-verde oferecia 833 partidas, número que caiu para 627 no ano passado, numa redução de 24,7%.

Os dados constam dos relatórios integrados do Metrô, da gestão João Doria (PSDB), relativos aos anos de 2020 e 2019. A análise dos dois documentos comprovam que a empresa decidiu retirar os carros de circulação, reduzir o número de viagens e ampliar o tempo de espera devido a queda na demanda.

"Não tem cabimento diminuir o número de trens no momento em que se precisa de mais distanciamento. É uma enorme bobagem. É um tipo de transporte que já funciona em local fechado e neste momento precisa sim rodar mais vazio", afirma o médico sanitarista Gonzalo Vecina Neto, professor de saúde pública da USP.

Ainda na linha 2-verde havia a operação com 27 trens nos horários de pico em 2019, número que passou para 19 no ano passado, numa redução de 29,6%. No horário de menor movimento, chamado de vale, a quantidade de trens em circulação passou de 17 para 12, numa redução de 29,4%.

Os dados indicam uma queda generalizada na quantidade de viagens, número de trens circulando e também elevação no tempo de espera. Nas quatro linhas que realiza administração própria: 1-azul, 2-verde, 3-vermelha e 15-prata, o Metrô diminuiu em 21,5% a quantidade diária de viagens realizadas pelas composições (passou de 3.317 em 2019 para 2.604 em 2020). Como consequência, os trens rodaram 18,3% menos (de 18,2 milhões de km rodados em 2019 para 14,9 milhões de km rodados em 2020).

Em nota, o Metrô disse que a demanda de passageiros em 2020 nos dias úteis caiu 50%. Segundo o relatório da empresa, em média, foram transportados 1,84 milhão de passageiros por dia útil em 2020.

Apesar de também sofrer uma redução geral de 43% na quantidade de passageiros transportados, a Prefeitura de São Paulo, gestão Bruno Covas (PSDB), decidiu manter a maior parte da frota circulando em 2020. Dados da SPTrans (empresa que gerencia o transporte público da capital), indicam que antes da pandemia, os 12,8 mil ônibus municipais transportavam diariamente uma média de 3,27 milhões de pessoas. No final de dezembro do ano passado, permaneciam rodando 11,3 mil veículos para transportar 1,65 milhão de pessoas.

Para o consultor Horácio Augusto Figueira, mestre em engenharia de transportes pela USP, a manutenção de 100% da frota ajudaria até a diluir a concentração de passageiros, evitando assim aglomerações. "Quando se tem uma concentração, tal qual se vê hoje nos picos, é inevitável a concentração. A manutenção de 100% o dia todo oferecia uma possibilidade real de escalonar as entradas", afirma.

Figueira é ex-funcionário do Metrô. Ele atuou no departamento de planejamento de tráfego e afirma que a decisão de manutenção da frota é mais política do que técnica. "O raciocínio precisa ir além da receita. De fato é necessário ponderar, levar esse questionamento à sociedade para saber como esses custos seriam administrados", afirma.

Segundo o relatório, o Metrô teve uma queda recorde no resultado financeiro. A forte redução no número de passageiros fez com que a empresa deixasse de arrecadar R$ 1,7 bilhão. Entre as medidas para sanar esse rombo estão a redução de despesas com arrecadação e fechamento de ao menos 25 bilheterias em estações.

Para Luiz Carlos Néspoli, superintendente da ANTP (Associação Nacional dos Transportes Públicos), é indiscutível que a manutenção da maior oferta de trens circulando seria benéfica para a saúde. Entretanto, ele faz uma ponderação a respeito do impacto orçamentário que isso geraria. "É uma questão de rever prioridades. Esse recurso só pode sair do orçamento, e é o mesmo orçamento que por exemplo financia leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva). É uma decisão claramente de natureza política e precisa ser equacionada"

Diferente de Figueira, Néspoli diz não acreditar que uma manutenção de toda a frota resultaria numa redução de aglomerações no sistema. "Lembrando que o metrô é um tipo de transporte que por natureza é de massa", afirma.

Para usuários do metrô, o aumento do tempo de intervalo entre os trens é motivo de reclamação. "Dá pra perceber que aumentou", diz a recepcionista Edna Macedo, 54. Na manhã desta quinta-feira (15), ela aguardava o trem sentido Vila Prudente na estação Trianon-Masp.

Enquanto a reportagem esteve na estação, por volta das 7h30, o intervalo dos trens da linha 2-verde variou entre dois minutos e 13 segundos e dois minutos e 46 segundos.

"Acho que até cinco minutos é um intervalo bom, mas agora está demorando mais que no começo da pandemia, principalmente no fim de semana e em feriados", afirma a auxiliar de Enfermagem Maria do Carmo Santos, 56.

Já o vigilante Ademael Martinez, 58, fala que não percebeu diferença nos tempos em que espera o metrô. "Só de vez em quando, quando tem problema na linha, que demora muito. Mas normalmente está tranquilo."

Para Edna dos Santos, 45, o tempo de espera está normal, mas a reclamação é pela lotação dos vagões. "Está sempre cheio", afirma a cuidadora de idosos. Segundo ela, o pior momento é à noite, na volta do trabalho.

Na estação República, a reclamação sobre a linha 3-vermelha era maior. "Não está normal. Isso atrapalha muito a gente", afirma a garçonete Telma Cândido, 46. Lá, o intervalo cronometrado entre os trens por volta das 8h30 foi de um minuto e 39 segundos –tempo menor que a média registrada pelo relatório do Metrô no ano passado.

"Tem muita diferença [desde o início da pandemia]. Atrapalha muito porque você sempre está contando com o seu horário. O nosso horário e a responsabilidade continuam e somos prejudicados", afirma a cuidadora de idosos Uellineia da Hora, 41.

OUTRO LADO

Em nota, o Metrô disse que a demanda de passageiros na linha 2-verde chegou a apresentar uma queda de 80% nos horários de menor demanda.

Segundo a empresa, a oferta foi mantida mesmo com uma demanda 50% menor e foi feita com a quantidade de trens possível de ser utilizada. Com isso, a empresa diz ter conseguido manter uma média de dois passageiros por metro quadrado.

O Metrô diz que não houve redução de operação por questões financeiras e que só não colocou mais trens em operação pelo fato de diversos operadores de trens e técnicos de manutenção estarem afastados por integrarem o grupo de risco. Isso, segundo a empresa, foi o motivo que impossibilitou colocar mais composições rodando.

Em nota, a STM (Secretaria dos Transportes Metropolitanos) afirma que avalia o sistema do metrô a cada faixa de horário para atender os passageiros. Segundo o texto, no horário de pico a demanda é atendida com "100% da frota possível".

De acordo com a pasta, a "frota possível" não é a total porque há operadores de trens e técnicos de manutenção afastados por serem do grupo de risco, o que impossibilitaria o funcionamento de mais composições.

O texto cita, ainda, a recomendação do governo do estado para o escalonamento de horário de trabalho como forma de diminuir a aglomeração de pessoas nos trens.

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