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Morador investigado por injúria racial contra porteira é intimado pela PC em Goiânia

Wildes Barbosa/O Popular
Vítima afirma ter recebido o apoio de outros moradores do residencial e também do síndico do local

A Polícia Civil (PC) investiga a denúncia de uma série de agressões verbais e ameaças proferidas por um morador a uma porteira de um prédio residencial no Jardim Goiás, em Goiânia. De acordo com o delegado Gil Fonseca Bathaus, responsável pela investigação, a vítima e outras três testemunhas já foram ouvidas. O investigado não foi localizado pela PC, mas está intimado a comparecer no 8º Distrito Policial nesta terça-feira (20), quando deve prestar depoimento.

O caso é apurado como injúria racial, isso é, a ofensa à honra de alguém se valendo de elementos referentes a questões como raça, cor e etnia. Não há, segundo os investigadores, configuração de racismo, ato interpretado quando as agressões atingem uma quantidade indeterminada de pessoas. Segundo Bathaus, caso o suspeito tivesse sido encontrado dentro da situação de flagrante, ele poderia ter sido preso. “Ainda não conseguimos checar o histórico criminal dele, estamos organizando a investigação para entender quem é este homem”, diz o delegado.

Ao POPULAR, a trabalhadora contou os momentos de susto nos quais pensou que seria agredida fisicamente. Parte das agressões foi gravada em vídeo pela mulher, o que não inibiu a atitude do morador, que a chamou, entre os xingamentos, de “macaca” e “chimpanzé”,

A série de xingamentos teria ocorrido após a funcionária do condomínio não abrir o portão da garagem para o homem sem que ele se identificasse. “Ele não estava com o controle. Eu pedi que ele se identificasse, mas ele só falava ‘abre sua chimpanzé’”, conta a vítima, que não quis ser identificada na reportagem. Após a abertura do portão, as agressões continuaram. Nervosa, a porteira pegou o celular para gravar os xingamentos. “Ele falou muito mais, eu estava tão abalada que estava tirando foto em vez de vídeo”, diz.

“Grava, macaca! Chimpanzé! Chipanga! Me encara”, diz o homem no vídeo. Ainda na gravação, questionado pela porteira sobre a razão das ofensas, o agressor continuou: “Porque você não presta. Você é uma merda, abaixo de zero”. Segundo a vítima, foi a primeira vez que ela passou pela situação. A trabalhadora conta que soube por outros moradores que o homem tem histórico de agressividade.

“Era como se eu não fosse ninguém naquele momento. Ele me tratou como um animal, como se olhasse dentro da portaria e visse um bicho”, desabafa. Além das agressões verbais, o homem teria chegado a se identificar como policial e fazer ameaças de morte contra a vítima, diz ela. “Achei que ele fosse entrar na portaria”, relembra. Mesmo após o morador subir para o apartamento, uma série de novas ofensas se seguiu por telefone.

Quando já estava decidida a apresentar denúncia contra o agressor, a porteira diz que recebeu uma nova ligação. “Ele disse para eu esquecer tudo o que tinha acontecido que ele esqueceria o que aconteceu”, conta. “Qualquer pessoa que veja o vídeo imagina que ele deve responder na Justiça. Ele não fez isso não só comigo, fez com outras pessoas e isso não pode ser deixado de lado”, se posiciona.

Mesmo ainda abalada, a porteira diz que não pretende pedir demissão. “A empresa disse que seria uma decisão pessoal minha. Não tem como me sentir segura, mas o síndico e os moradores me passaram confiança. Os moradores são maravilhosos, me disseram que ele não representa o condomínio”, considera sobre a decisão de se manter como trabalhadora do prédio.

A coordenadora do Movimento Negro Unificado (MNU), Iêda Leal, diz que está articulando para apresentar denúncia do caso ao Ministério Público (MP). De acordo com Iêda, o momento é de resguardar a vítima e cobrar punição ao homem. “É preciso entender que isso não pode ser tratado como ‘só um caso de injúria’. Ele está solto na cidade e tem um comportamento racista. Nós estamos em um País em que mais de 50% da população é negra, ele pode encontrar uma dessas pessoas”, afirma.

Para Iêda, a tranquilidade do homem mesmo diante de uma câmera é reflexo do crescimento de casos similares. “É evidente. Pessoas estão mais encorajadas a serem racistas, estão se sentindo mais seguras. Mas é preciso denunciar e chacoalhar as instituições sobre esses crimes e não deixar encerrar apenas como meras denúncias”. 

 

3 perguntas para vítima de agressões em condomínio

Em entrevista ao POPULAR, funcionária de prédio que foi atacada verbalmente por um morador com injúrias raciais conta como se sentiu no momento e como pretende lidar com a situação. “Eu senti medo, me senti mal. Era como se eu não fosse ninguém naquele momento.“

1- O que você sentiu no momento das agressões? 
Eu senti medo, me senti mal. Era como se eu não fosse ninguém naquele momento. Ele me tratou como um animal, como se olhasse dentro da portaria e visse um bicho. Achei que ele fosse entrar na portaria.

2 - O que aconteceu após o vídeo?
Depois daquele episódio, passou cinco minutos e ele liga e me faz ameaças de morte. Disse que desceria com a arma na cintura para resolver. Depois de tudo ele ligou novamente e disse para eu esquecer tudo que ele também esqueceria.

3 - Você vai continuar trabalhando no mesmo local? 
A empresa que eu trabalho se posicionou que seria uma decisão pessoal minha. Os moradores pediram para eu não sair e o síndico conversou comigo. Os moradores são maravilhosos, disseram que ele não representa o condomínio. Não tem como se sentir segura, mas isso me passou confiança. Me disseram que eu sou a vítima.

(Luiz Phillipe Araújo é estagiário do GJC em convênio com a UFG)

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