Geral

Motorista chega a parar em 2 a cada 3 semáforos

Wildes Barbosa
Apesar de ser uma das principais vias de Goiânia, a Avenida Mutirão falha na sincronização semafórica: congestionamentos e viagem mais demorada

Mesmo em uma tarde de sábado (4), o motorista que se locomove pela Avenida T-10, entre o Setor Bueno e o Jardim América, não consegue sair do cruzamento com a Avenida Mutirão até a Rua C-137 sem parar em pelo menos 5 dos 8 semáforos. A situação é pior porque, por duas vezes, é preciso parar o veículo por dois cruzamentos seguidos, o que demonstra falhas na sincronização semafórica em Goiânia. Ou seja, a cada três semáforos percorridos na cidade, o condutor chega a ter que esperar o tempo de vermelho em dois. A situação foi verificada pela reportagem nas principais avenidas da capital para a quarta e penúltima matéria da série especial que busca refletir sobre questões essenciais relacionadas ao trânsito.

Estudos a nível nacional apontam que a sincronização dos semáforos pode dar um ganho de até 30% no tempo de viagem. Na situação da Avenida T-10, mesmo fora dos horários considerados de pico, caso o motorista conduzisse o veículo na pista com todos os semáforos abertos e a 60 km/h, que é a velocidade permitida na via, seria possível fazer o trajeto em até 57 segundos. No entanto, o tempo real do percurso é de cerca de 3 minutos, o que é explicado pelo tempo perdido nos semáforos e também pela variação de velocidade devido a aceleração que deve ser feita para a viagem.

A reportagem levou em consideração, em contrapartida, a realização de algumas paradas ao longo do percurso e, caso houvesse ao menos a sequência de dois semáforos abertos a cada três em funcionamento, o trajeto poderia ser feito em 2 minutos e 20 segundos. Assim, a sincronização semafórica poderia levar a um ganho de 22% neste caso. Um estudo do Fórum de Mobilidade Mova-Se, realizado em meados do ano passado em um trajeto do Setor Universitário até o Setor Oeste, calculou que o tempo perdido nos semáforos era de 17% do total da viagem.

Esse valor verificado pelo teste do Mova-Se é semelhante ao verificado pela reportagem na Avenida T-10 e praticamente o mesmo do que foi visto na Avenida T-63, na manhã de quinta-feira (2). O trecho de 2,45 quilômetros (km) entre a Rua C-182, no Jardim América, e a Avenida Circular, no Setor Pedro Ludovico, é possível ser percorrido a 60 km/h por cerca de 2 minutos e 20 segundos se todos os semáforos estiverem no verde. Porém, se todos os equipamentos estiverem no vermelho, o tempo para fazer o trajeto chega a até 6 minutos e 40 segundos, ou seja, cerca de três vezes mais.

O tempo real na manhã de quinta-feira (2) foi em torno de 5 minutos e 30 segundos, em que se viu casos de paradas seguidas nos semáforos com a Rua C-252 e C-255 (Praça Wilson Sales, no Setor Nova Suíça), com a Avenida T-15 e com a Avenida T-5, e ainda com a Avenida S-5 e com a Alameda Couto Magalhães. No cálculo feito pela reportagem, caso houvesse pelo menos a garantia do sinal aberto por dois cruzamentos seguidos, o tempo de viagem poderia chegar a cerca de 4 minutos e 50 segundos, ou seja, um ganho de 17,45% no trajeto específico.

O que foi verificado tanto na T-63 quanto na T-10, com semáforos fechados em sequência, é uma demonstração da existência do que se chama tecnicamente de “onda vermelha”. O termo é o oposto do desejado pelos condutores, a “onda verde”, ou seja, quando é possível pegar uma sequência de sinais abertos e um ganho de tempo na viagem. Titular da Secretaria Municipal de Mobilidade (SMM), Horácio Mello, afirma que a onda verde existe na capital em alguns casos e horários com o que é possível ser feito. Dentre os locais visitados pela reportagem, a melhor situação foi na Avenida 85.

Na via, no sentido bairro-centro, é possível conseguir uma sequência, nos horários de pico da manhã, de até quatro semáforos abertos entre a Alameda Coronel Joaquim de Bastos e a Avenida T-10. No entanto, entre o Viaduto Latif Sebba e a Praça Cívica, o motorista fica parado em 3 dos 4 semáforos nos cruzamentos. Ao todo, a capital possui atualmente 805 cruzamentos semaforizados e desde 2017 todo o trabalho de tentativa de controlar o tráfego é feito manualmente, o que aumenta a possibilidade de falhas e ainda impossibilita uma visão geral de toda a cidade.

Até 2017, 609 cruzamentos semaforizados em Goiânia eram controlados e sincronizados por um software fornecido por uma empresa terceirizada, quando ocorreram problemas no pagamento e o fim do contrato. Na época, o total de semáforos atendidos pela tecnologia correspondia a 69% de toda a cidade. A consequência foi que, desde então, todos os locais passaram a ser controlados e planejados via técnicos da SMM, ou seja, são engenheiros que ficam em alguns cruzamentos fazendo a contagem de veículos e estimando a necessidade do tempo de verde para cada semáforo.

Mello diz que a prioridade dada pela SMM para maior tempo de verde nos cruzamentos semaforizados na cidade é justamente o tamanho da cauda, isto é, a quantidade de veículos em determinado movimento. Onde há mais carros, há maior tempo de verde naquele sentido e horário em que o estudo foi realizado, normalmente em horários de pico (início da manhã, início da tarde e final da tarde).

Licitação para compra de novo software está suspensa pelo TCM

A sincronização semafórica nos 805 cruzamentos semaforizados em Goiânia é feita sem qualquer tecnologia desde 2017 e a solução, após diversos adiamentos, vai demorar mais um tempo. A Secretaria Municipal de Mobilidade (SMM) adiou sem uma data prevista o processo licitatório para comprar um novo software para o controle dos semáforos. O edital previa a abertura das propostas nesta segunda-feira (6) e o adiamento ocorreu a pedido do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) e foi publicado no dia 1º deste mês.

O processo, além do novo software, previa ainda a implantação de um Centro de Controle Operacional (CCO) em que seria possível verificar algum problema na sincronização e no funcionamento dos semáforos à distância, além de uma manutenção direta do local ou um deslocamento mais assertivo do técnico. Também seria contratada uma empresa que realizaria a manutenção semafórica, ou seja, o serviço hoje realizado pela SMM passaria a ser terceirizado.

O secretário da SMM, Horácio Mello, entende que a finalização deste processo melhoraria a sincronização semafórica e a mobilidade da cidade, mas reconhece a necessidade de esclarecimentos ao TCM. Ele explica ainda que esta é só a primeira etapa na melhoria do parque semafórico de Goiânia, em que é prevista mais duas licitações para completar o projeto para a cidade. O segundo processo visa a troca dos equipamentos relacionados aos semáforos, como os controladores, os porta-focos e a iluminação.

“Todo semáforo tem o seu controlador, que é o equipamento que determina a sua programação, mas este não é o que determina a sua sincronização. Esta é realizada a partir de outro software que consegue comunicar com todos os controladores de um mesmo trajeto. Em seguida, Mello relata que a terceira licitação será para a aquisição de semáforos inteligentes, o que dará autonomia. “Esses equipamentos têm uma câmera que enxerga a cauda de veículos e já vai fazendo a programação. Esse é o nosso sonho. Mas é preciso primeiro fazer essa base, com essas duas licitações, para então investir nisso. O dinheiro das multas está sendo usado para investir nisso”, garante o secretário.

O coordenador do Fórum de Mobilidade Mova-Se, o geógrafo Miguel Ângelo Pricinote, reforça que o sistema mais moderno, com uso de inteligência artificial, vai ajustando o tempo de verde nos semáforos ao longo do dia, diferente do modelo manual utilizado atualmente. Ele lembra ainda que as quedas de energia resetam a programação inicial, o que faz necessário uma nova ida do técnico da SMM. “E tem as variações ao longo dos dias, dos horários, que não tem como fazer manualmente”, diz. Ele considera, por outro lado, que antes da realização das licitações, a SMM deveria focar em estudos e em um planejamento para a mobilidade. “Mais importante que a tecnologia é ter um plano. A tecnologia é o de menos se não souber como usar e onde usar. A secretaria hoje não sabe qual o tempo perdido nos semáforos. É importante ter onda verde, mas precisa saber qual o objetivo, se for mal feita acaba gerando problemas em outros pontos.”

Sincronia depende de priorização

A sincronização semafórica em uma cidade pode ser usada como uma política pública de mobilidade urbana, o que depende de planejamento e o estabelecimento das prioridades. O coordenador do Fórum de Mobilidade Mova-Se, Miguel Ângelo Pricinote, entende que a falta disso e de um objetivo claro é o grande problema no trânsito de Goiânia. “É preciso estabelecer qual é a prioridade. É do transporte coletivo? É no sentido bairro-centro? É no sentido norte-sul? Goiânia não tem isso. Não se sabe o que a cidade quer, se é dar prioridade a determinado sentido ou para quem”, afirma.

Ele entende que o sistema de trânsito da capital está doente, mas antes das intervenções, que são necessárias, é preciso ter um diagnóstico claro. “Todas as ações são úteis, mas sem planejamento não adianta”, diz. Segundo o secretário municipal  de Mobilidade, Horácio Mello, a prioridade no planejamento é dar maior fluidez onde há um maior número de veículos. “Em Goiânia existe esse dogma da onda verde, mas temos cada vez mais carros e é mais difícil mitigar essa programação dos semáforos”, explica.

Em resumo, Mello afirma que o tempo de verde no semáforo deve ser dividido entre todos os pontos do cruzamento. Ou seja, quando o tráfego era mais forte em uma determinada avenida, era mais fácil fazer a programação, mas com o aumento do fluxo em todos os sentidos, esse mesmo tempo passa a ser dividido por mais semáforos e, logo, o tempo de vermelho também fica maior. “Onde tiver mais carros vai ter onda verde. Como temos nas avenidas Araguaia, Tocantins, 85, T-9 e nas demais artérias. Mas quando tira um tempo do semáforo de um vai aumentar de outro, é preciso redistribuir esse tempo.”

O secretário afirma ainda que o transporte coletivo também é levado em conta ao realizar a programação semafórica. Ou seja, as vias que são linhas de ônibus acabam tendo um maior tempo de verde, especialmente aquelas com maior demanda de usuários. Além disso, é preciso pensar ainda nos pedestres e ciclistas, que precisam de tempo específico para realizar as travessias. Engenheiro de trânsito e professor do Instituto Federal de Goiás (IFG), Marcos Rothen, reforça que os tempos perdidos devem ser divididos entre todos os usuários.

“No caso dos pedestres na maioria dos locais é fundamental a existência de botoeiras. Temos algumas em Goiânia, mas muito poucas. É difícil um lugar da cidade que sempre tenha pedestres que precisam do tempo próprio, muitas vezes os motoristas ficam tempo parado e não há nenhum pedestre para atravessar”, diz o professor. Mello informa que os pedestres são também prioridade e há projeto de instalação de faixas elevadas, em que força a redução de velocidade dos veículos.

No geral, Rothen entende que é possível melhorar a sincronia dos semáforos de Goiânia mesmo com a situação atual, em que o trabalho é feito manualmente. “O que mais irrita os motoristas é o de terem que parar muitas vezes. O número excessivo de paradas causa mais desconforto aos motoristas do que ficarem um pouco mais de tempo parado frente a um semáforo. Para uma melhor sincronização que considere mais pontos e as conversões já citadas se usa softwares que já estão disponíveis há muitos anos. Por exemplo, vindo da Avenida 85 e entrando na Avenida T-9, todos os carros param no primeiro semáforo.”

Ainda assim, o professor diz que na T-9 ainda é possível percorrer alguns cruzamentos sem parar. “O caso que vejo como o mais grave é da Avenida Mutirão indo para a Avenida 85. Nesse local existe uma dessincronização. Para a Mutirão o sinal fica verde e quase nenhum carro passa e depois todos param no vermelho e isso já acontece há muitos anos. Ajudaria muito se a Prefeitura de Goiânia desse ouvido as ideias das pessoas”, diz.

Arte de O Popular
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