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Mulher acusada de matar filhas em Edeia é transferida para hospital psiquiátrico

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Prevenção: Izadora Alves de Faria tentou suicídio após ser detida

Em caráter excepcional, a Secretaria Estadual de Saúde (SES) conseguiu nesta sexta-feira (28), uma vaga para internação inicial de Izadora Alves Faria, de 39 anos, presa no dia 27 de setembro acusada de matar as duas filhas, de 4 e 6 anos, na cidade de Edeia, no Sul de Goiás. A decisão foi tomada após a Justiça dar 48 horas para que o governo estadual tomasse uma providência.

A mulher, que está internada desde o dia 28 de setembro no Pronto-Socorro Psiquiátrico Wassily Chuc, em Goiânia, após duas tentativas de suicídio, será levada para a Pax Clínica Instituto de Psiquiatria, em Aparecida de Goiânia, onde terá escolta.

De acordo com a SES, a vaga foi conseguida após uma articulação institucional que envolveu as Secretarias Municipais de Goiânia e de Aparecida de Goiânia, por meio das gerências de Regulação. A pasta explicou que a pactuação para acesso aos leitos psiquiátricos de pacientes do interior é de responsabilidade do município de Goiânia. A Secretaria Municipal de Saúde de Goiânia, conforme a SES, foi comunicada para providenciar o transporte da paciente de forma adequada até a Pax Clínica.

Por duas ocasiões o Judiciário cobrou do poder público uma vaga de internação psiquiátrica para Izadora. No dia 30 de setembro, o juiz Hermes Pereira Vidigal, da Comarca de Edeia, deu um prazo de 72 horas para que ela fosse transferida do pronto-socorro para um hospital onde pudesse permanecer internada sob escolta. A Casa de Eurípedes, uma das duas instituições habilitadas a receber pacientes psiquiátricos pelo Sistema Único de Saúde (SUS) informou à Justiça que não tinha condições técnicas nem estruturais para receber uma paciente presa.

A outra instituição, o Instituto Espírita Batuíra de Saúde Mental, com 133 leitos direcionados para pacientes do SUS, foi procurada pelo Daqui, mas não respondeu aos nossos questionamentos sobre sua política de atuação. A SMS de Goiânia explicou que, “pelo perfil da paciente, que necessitava de internação com supervisão carcerária, e pela falta de um hospital psiquiátrico de custódia no Estado de Goiás, a vaga para ela se tornou de caráter excepcional”.

De acordo com a pasta de Saúde da capital, “com o empenho do Complexo Regulador Municipal que trabalhou o tempo todo em parceria Complexo Regulador Estadual, visto que a paciente é munícipe do interior, e graças à pactuação entre as esferas, consagrada pela Comissão Intergestores Bipartite (CIB), foi possível regular a vaga, dentro dos critérios técnicos do SUS e que o caso requer, para a Clínica Psiquiátrica Pax”.

A SES informou que a área jurídica da pasta será comunicada da resolução do caso. “Registramos nosso agradecimento aos gestores de Aparecida de Goiânia, sempre colaborando com a SES em situações que, inclusive, estavam fora da competência logística da SES e de Aparecida”, disse em nota a secretaria.

Alternativa para caso é estudada

O defensor público Marco Túlio ressalta que, no caso de Izadora ser considerada inimputável pela Junta Médica do Poder Judiciário, uma das opções será pedir o acompanhamento dela pelo Programa de Atenção Integral ao Louco Infrator (Paili), coordenado pela SES. 

Criado há 12 anos, em outubro de 2006, o Paili é uma iniciativa inovadora que ganhou reconhecimento em âmbito mundial e internacional, por meio da Organização Mundial da Saúde. Seu idealizador foi o promotor de Justiça, Haroldo Caetano, que mais tarde defendeu sua tese de doutorado sobre o tema. 
O surgimento do programa ocorreu a partir da implementação da Lei 10.216/2001, conhecida como reforma psiquiátrica ou Lei Antimanicomial. Esta política foi construída em razão de críticas à prática de isolamento, exclusão e maus-tratos de pacientes psiquiátricos internados de forma permanente e involuntária nos manicômios brasileiros. A partir de então ficou definido que a abordagem ambulatorial e terapêutica seria o caminho ideal para evitar internações.

“O Paili é o elo entre a Saúde e o Judiciário”, explica Helisiane Figueiredo, gerente de Saúde Mental da SES-GO. Ele acolhe os pacientes com medida de segurança, no caso loucos infratores, como ainda é mencionado pelo Código Penal, procedendo a avaliação psicossocial. O caso é acompanhado e mediado entre o ato jurídico, a saúde e a sociedade até o fim da relação do paciente com a Justiça, visando a não reincidência do ato infracional e a inserção social.

O programa existe por força de parceria intersetorial que envolve a SES-GO, o Ministério Público Estadual, o Tribunal de Justiça do Estado, a Secretaria de Estado da Administração Penitenciária e as secretarias Municipais de Saúde. “A pessoa que é considerada inimputável, que apresenta nexo de causalidade com a doença no momento do ato, não pode ser presa. Tem de ser tratada na rede de atenção psicossocial. Em algum momento, ela pode precisar de internação, mas será breve e pontual”, explica Helisiane Figueiredo.

Em caso de inimputabilidade, e o juiz da comarca definir uma medida de segurança, o infrator entra automaticamente no Paili. Um técnico de referência acompanha o indivíduo e conversa com sua família sobre a importância do trabalho biopsicossocial. O tratamento é realizado na rede do seu território. 

Helisiane Figueiredo explica que, desde a sua criação, foram atendidos 896 pacientes. “Temos 450 medidas de segurança extintas e a taxa de reincidência é similar à do Reino Unido, em torno de 5%. Ou seja, o programa mostra que tratadas adequadamente, essas pessoas podem conviver em sociedade.” 

Presente

Atualmente o Paili conta com 332 pacientes em acompanhamento. Desses 139 fazem tratamento em Centros de Atenção Psicossocial (Caps), 89 em ambulatórios de saúde mental ou supervisionados por alguma Equipe Multiprofissional de Atenção Especializada em Saúde Mental (eMAESM). “Somente 40 estão internados em clínicas psiquiátricas ou outras instituições hospitalares”, detalha Helisiane. 

Segurança preocupa Defensoria 

Izadora Alves Faria foi denunciada e se tornou ré no dia 13 de outubro pelas mortes das únicas filhas, Maria Alice, de 6 anos, e Lavínia, de 4, na casa em que residiam em Edeia. Foi o pai das crianças e marido da dona de casa quem as encontrou mortas em um colchão. A acusada teria matado as duas por asfixia após ter tentado eletrocutá-las e afogá-las. Ela também deu um golpe de faca nos dois corpos já no colchão. 

Após os crimes, a mulher desapareceu. Ela foi encontrada sete horas depois em um matagal próximo de sua residência e tentava se matar com a mesma faca que usou para tirar a vida das filhas. Levada para a unidade prisional de Israelândia, tentou se enforcar na cela. O advogado Fabrício Póvoa chegou a ser contratado pela família de Izadora para assumir a sua defesa, mas logo deixou o caso, após pedir à Justiça o exame de insanidade mental da cliente. 

Após sua renúncia, a Defensoria Pública do Estado de Goiás (DPE-GO), por meio do Núcleo Especializado de Defesa e Promoção dos Direitos da Mulher (Nudem) e do Núcleo Especializado de Direitos Humanos (NUDH), assumiu a defesa de Izadora. A dona de casa foi internada no Pronto-Socorro Psiquiátrico Wassily Chuc, na capital, a pedido da DPE, que também requereu judicialmente a sua transferência para um hospital psiquiátrico.

“A preocupação da DPE nesse momento é resguardar a sua vida, por causa das tentativas de suicídio. É importante que ela esteja internada em local adequado”, disse ao Daqui o coordenador do NUDH/DPE, o defensor público Marco Túlio Félix Rosa, que acompanha de perto o caso de Izadora. Ele lamenta a dificuldade em encontrar uma vaga hospitalar em Goiás para atender pessoas com o perfil da dona de casa. “É totalmente inviável”.

Izadora Alves Faria será submetida a uma avaliação médica por decisão judicial na terça-feira, 1º de novembro, em Goiânia. Uma Junta Médica do Poder Judiciário vai definir se a dona de casa é ou não inimputável. O relatório leva alguns dias para ser elaborado. “Isso será determinante”, explica Marco Túlio. Segundo ele, os profissionais vão analisar se Izadora tinha consciência do que estava fazendo no dia em que cometeu os crimes ou se era totalmente alheia à gravidade dos fatos. “Se ela for considerada semi-inimputável, irá a júri.”

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