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“Nem todos conseguem separar a internet da vida real”, diz doutor em psicopatologia

Fábio Lima/O Popular
Júlio César Alves, doutor em psicopatologia e que via integrar o encontro virtual

Um mundo virtual que nem sempre condiz com a realidade. Um recorte que não pode ser visto como inteiro. As redes sociais, presentes na palma da mão, podem influenciar em um quadro de depressão?

E em meio a uma pandemia que distanciou fisicamente as pessoas, quais consequências, positivas ou negativas, as redes podem trazer para a vida real? Depressão e a influência das redes sociais.

Este é o tema do webinar, que será realizado pelo jornal O Popular em parceria da FacUnicamps na próxima quinta-feira (15) às 19 horas e será transmitido pelo canal do YouTube do jornal. A inscrição é gratuita e deve ser feita pelo site do Grupo Jaime Câmara.

Um estudo realizado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) revelou um aumento de 90% nos casos de depressão durante a pandemia. Nesta semana, a mesa redonda será formada por especialistas no tema: doutor em psicopatologia clínica e coordenador do curso de Psicologia da FacUnicamps, Júlio César Alves; a médica psiquiatra Daniela Londe e o influencer digital Pablo Marçal vão discutir mais sobre o tema. A seguir, leia uma entrevista com Júlio César Alves, que também é mestre e doutor com ênfase em Psicopatologia Clínica.

 

De que forma a pandemia, o distanciamento social e os influenciadores podem ter intensificado os problemas emocionais?

A pandemia agrava o processo de exceder o uso das redes sociais, devido à sua necessidade, que é fazer com que as pessoas mantenham-se em isolamento social. Com isso, muitos pararam de se relacionar pessoalmente e começaram a usar ainda mais as redes sociais para este processo. A questão da intensificação dos problemas emocionais para estas pessoas se dá no momento em que passam a serem cobradas, de uma exposição constante, de conteúdos bons, e a projeção de uma imagem de que tudo “está sempre bem”. Existe uma realidade por trás desse processo todo que precisa ser melhor entendida.

 

Como identificar a depressão? O que é tristeza e o que é depressão?

A depressão pode ser identificada através de processos recorrentes de tristeza. Os sentimentos de tristeza e de alegria são universais. Você talvez tenha sentido em algum momento um pouco entristecido porque alguém próximo morreu, porque perdeu o emprego ou porque está tendo que fazer coisas desafiadoras. Pare e pense: você ficou triste, chorou, ficou abatido ou sem vontade de sair com os amigos? A tristeza tem um sentido. Ela não vem do “nada”. Por isso, precisamos investigar os motivos pelos quais o indivíduo se entristece, e, para que desenvolva um episódio depressivo, precisaremos observar os comportamentos, sentimentos, emoções, isolamento, perda de prazer, aumento ou diminuição do apetite. E isso tudo precisa ser acompanhado por um profissional qualificado que auxilie neste processo.

 

Em quais casos as pessoas precisam procurar psicólogos e/ou psiquiatras?

A procura deve ocorrer no momento em que a pessoa percebe que não consegue mais lidar com suas próprias sensações, emoções e sentimentos, e na maioria dos casos a família ou a rede de apoio é quem orienta e encaminha este indivíduo ao psicólogo e ao psiquiatra. Os profissionais precisarão ter um olhar para além do diagnóstico, compreendendo em função de que aquela pessoa se comporta daquela maneira, naquele momento, no caso a “depressão”.

Uma vida na rede social é um recorte, claro. Mas nem sempre as pessoas acabam conseguindo separar a internet de uma vida real. De que forma essa enxurrada de compras, consumos, viagens e afins podem influenciar negativamente quem consome do outro lado da tela?

O prejuízo do desequilíbrio, ou seja, da falta ou do excesso de determinados comportamentos de consumo impacta diretamente na saúde emocional do indivíduo, pois aquele que não consegue alcançar todos estes processos acaba sendo julgado, sendo menosprezado em alguns casos, e em outros, a cobrança a si mesmo é tão alta que a pessoa acaba entrando em uma vertente de tristeza recorrente, que se não for monitorada pode tirar o sentido de vida e prazer desta pessoa.

 

Existe um grupo mais vulnerável? Mais jovens? Idosos? Qual é o cenário hoje que estabelece maior relação entre depressão e mídias?

No cenário atual isso tem atingido todas as faixas etárias, porém os estudos mostram uma maior vulnerabilidade em adolescentes e jovens, e dentro desse processo o que mais estabelece relação entre depressão e mídias é justamente o não saber usar estes instrumentos a favor de si mesmo, e desenvolver a regra de que se eu não estou bem nas redes, as pessoas não vão me aprovar, se não estou bem nas redes não terei amigos, e por isso a psicologia será importante para desenvolver estas questões junto ao indivíduo que estiver sendo acompanhado. Na FacUnicamps, por exemplo, temos a Clínica de Psicologia, que tem recebido inúmeros casos de jovens e adolescentes que chegam em sofrimento extremo por estarem sendo rejeitados demonstrando diretamente casos de depressão relacionado ao uso das redes sociais.

 

A internet que apoia pessoas também é conhecida cada vez mais pelo ataque de haters. E vemos a situação se repetir com famosos e anônimos que chegam a abandonar as redes por um tempo tamanha pressão. Qual é o limite próprio que uma pessoa deve estabelecer para não chegar ao adoecimento?

De fato, essa é uma questão recorrente. E para que o “adoecimento” não ocorra, a pessoa precisará fazer um levantamento da relação custo benefício de todos os processos que estiver inserida. E o abandono temporário demonstra que a pessoa chegou ao seu limite e não consegue ficar bem diante daquilo que tem vivenciado, da quantidade de conteúdos que tem que entregar, da projeção que precisa fazer. O limite de avaliação não é a ausência de uma “doença”, mas sim se aquilo que eu faço está me gerando qualidade de vida e bem estar. E acima de tudo, modificarmos a necessidade de aprovação que este processo gera.

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