Adquirido pela Secretaria Municipal de Educação (SME) de Goiânia em outubro de 2021 ao custo atualizado de R$ 12,48 milhões, nunca chegou a funcionar integralmente o Programa Conecta Educação - uma iniciativa que envolveria 22 propostas de informatização da gestão da rede municipal, incluindo o serviço de reconhecimento facial de estudantes e servidores nas unidades de ensino. Quando foi anunciado pela primeira vez, o prazo para funcionamento seria em dezembro de 2021.A promessa era que todas as 374 unidades de ensino da rede municipal - que envolve escolas de ensino fundamental e centros municipais de educação infantil (Cmeis) - estariam com a gestão escolar automatizada, mas diretores, secretários e servidores ouvidos pelo Daqui afirmam que isso ainda não aconteceu ou só parcialmente. Em uma das escolas, o servidor ouvido reclamou do sinal da internet. “Como falar em informatização, se nem internet é 100%?”, protestou.No caso do chamariz do programa, o sistema de reconhecimento facial, que reforçaria a segurança das unidades e facilitaria o monitoramento dos pais sobre a presença dos filhos nas escolas e daria mais agilidade a inúmeros serviços, como, por exemplo, o fornecimento de merenda, evitando desperdícios, esse equipamento praticamente não funcionou nas escolas. Alguns servidores relatam que houve períodos de uso em 2023, mas após diversos problemas o serviço foi retirado.A SME dizia na época do lançamento que os leitores faciais seriam importantes para a segurança das crianças, principalmente daquelas que iam sozinhas para a escola, pois os pais poderiam acompanhar de seus celulares o momento da chegada e saída dos filhos. Além disso, o conselho tutelar seria informado pelo mesmo sistema quando os alunos faltassem com muita frequência.“Quando o aluno chegar, vai ter o reconhecimento facial e o pai vai receber um SMS na hora, informando que o filho entrou na escola. Quando for a hora do lanche, o pai vai receber o SMS com o cardápio do dia. Para os professores, diretores, vai acabar a história de ter que ir na Coordenadoria Regional de Educação (CRE) para resolver demanda de frequência, vai ser tudo online por esse sistema”, disse, no dia 26 de outubro de 2021, o vereador Wellington Bessa (DC), então titular da SME na época do lançamento.A empresa Ponto ID, com sede em Goiânia, foi contratada por meio de adesão a uma ata de registro de preços de um pregão eletrônico feito pela Secretaria de Estado da Educação do Tocantins. Em julho de 2021, o serviço desenvolvido pela empresa no estado vizinho foi apresentado ao prefeito Rogério Cruz (Republicanos) e a Bessa, em visita de comitiva goianiense a Palmas. Três meses depois foi assinado o contrato na capital goiana.No Portal de Transparência da Prefeitura consta que o contrato inicial com a Ponto ID estava previsto em R$ 9,38 milhões, porém com aditivos ao contrato o valor pago chega a R$ 12,48 milhões. A empresa afirmou ao Daqui que todos os equipamentos (leitores faciais e software) já foram entregues e instalados pela empresa, porém que a implantação dos módulos (que envolvem de customização e cadastramento a atualizações) ainda está em andamento e é permanente.Ainda segundo a Ponto ID, a empresa chegou a entregar ao município mais leitores faciais do que o contratado. Na época se falava em 108 mil alunos matriculados. Atualmente, apesar de a SME ainda não ter fechado o dado, estaria entre 117 mil e 125 mil. O cadastro facial de novos alunos, inclusive, segundo a própria empresa, ainda é de sua responsabilidade. A empresa também afirma que a secretaria está com pagamentos atrasados desde maio, “mas continua executando os serviços pactuados no contrato normalmente”.O contrato com a empresa também já teve dois aditivos de prazo, o primeiro prorrogando-o até outubro de 2023 e depois até o final de fevereiro. A empresa disse que não teria como se pronunciar sobre o uso efetivo do sistema instalado. “Estão todos instalados, a parte da empresa, então, está integralmente cumprida, contratualmente falando. De customização, ainda há serviço a executar, pois é normal o ente público requerer adaptações e aperfeiçoamentos durante a execução do contrato. Não sei dizer quanto ao uso efetivo pela Prefeitura”, informou o advogado Marcos César Gonçalves de Oliveira, representante da Ponto ID.O problema não é o mesmo em cada unidade. Em algumas, segundo relatos de profissionais da rede ouvidos pelo Daqui, os aparelhos foram instalados e depois retirados. Em outras, chegou a funcionar “por pouco tempo”. “Ano passado funcionou por um tempo, mas com os inúmeros problemas e falta da devida manutenção, acabaram sendo inviabilizados”, afirmou um servidor. “Onde eu trabalho nunca foi instalado, nem o dos estudantes nem o dos servidores”, comentou outro. Em duas unidades, funcionários disseram que para bater o ponto é um sistema manual.Em maio de 2022, os servidores chegaram a passar por treinamento para mexer com o sistema de reconhecimento facial e o software. Em junho do mesmo ano, o prefeito chegou a ser questionado sobre o primeiro atraso no funcionamento, durante audiência de prestação de contas na Câmara Municipal. Na mesma época, o Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás (TCM-GO) abriu um procedimento investigativo para apurar denúncias de irregularidades no contrato. O processo segue em andamento.Em nota, a SME confirmou que o Conecta Educação não está funcionando, que houve “algumas incongruências” no sistema de reconhecimento facial, mas que isso é “comum em implementação de novas tecnologias” e que a empresa já foi notificada, assim como a Procuradoria Geral do Município (PGM) foi acionada para intermediar a busca por soluções.“Nesse período, com o fim de ajustar as instabilidades apontadas pela SME, houve a suspensão do sistema. A pasta acrescenta ainda que a empresa tem se mostrado empenhada em solucionar as questões para que haja um funcionamento preciso”, afirmou a secretaria.Renovação emergencial de contratosO secretário municipal de Educação, Rodrigo Caldas, confirmou que a Prefeitura de Goiânia prepara projeto de lei para encaminhar à Câmara Municipal pedindo autorização para prorrogar emergencialmente por até 40 dias o contrato dos professores temporários que vence em janeiro. A medida - divulgada com exclusividade pelo Daqui na noite de quarta (24) - visa reduzir o déficit de profissionais da educação na rede municipal enquanto a pasta aguarda as inscrições no processo seletivo simplificado iniciado nesta semana.A SME se recusa a passar o número de professores licenciados. Nesta quinta-feira (25), Rodrigo afirmou que os dados envolvendo licenças de saúde são de responsabilidade da Secretaria Municipal de Administração (Semad) e uma assessora dele afirmou que “a gente acredita que temos um número grande”. O Daqui pediu ao menos uma estimativa, mas o secretário desconversou. Segundo ele, cerca de 600 contratos temporários podem ser prorrogados caso o projeto seja aprovado durante o recesso no legislativo pelos vereadores.As inscrições para o processo seletivo começam na próxima segunda-feira (29) e a previsão é de convocação de 454 profissionais, sendo 186 deles professores e pedagogos a partir de 20 de fevereiro. A SME diz que o número de convocados foi levantado a partir do déficit existente em maio do ano passado. O processo seletivo estava previsto para ser lançado no segundo semestre de 2023, mas atrasou.Além do projeto de lei, outra medida informada pelo secretário para atenuar o déficit é a convocação de coordenadores e equipes que estão em setores administrativos para trabalharem em sala de aula. Não foi dito quantos poderiam se enquadrar nesta situação.SME diz que falta de colchonetes foi pontualO titular da SME afirmou que o problema da falta de colchonetes para crianças na Escola Municipal Frei Confaloni, denunciado junto ao TCM-GO, foi um problema pontual, que a diretora foi afastada e que foi aberto um procedimento administrativo para apurar a responsabilidade da direção do colégio sobre o ocorrido. Ele garantiu que todas as unidades de ensino estão devidamente abastecidas e que é antiga a foto com colchões em um depósito que consta em medida cautelar do tribunal para que a pasta resolvesse o problema em 48 horas. Segundo o secretário, a imagem é de outubro e todo o material já foi distribuído ainda em 2023.