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Sem pagar taxa mensal, alunos do Colégio Militar de Goianira não podem acessar sistema da escola

Davi de Sousa, de 17 anos, é aluno da 3ª série do Ensino Médio do Colégio Militar de Goianira

Alunos do Colégio Estadual da Polícia Militar José Silva Oliveira, em Goianira, na Região Metropolitana da capital, foram impedidos de acessar o sistema da escola que dá acesso a notas, tarefas e horário de aulas porque não pagaram uma “taxa” de R$ 60,00 à Associação de Pais, Mestres e Funcionários (APMF). A Secretaria de Estado de Educação (Seduc) afirma que o pagamento é opcional, mas ainda assim, os estudantes que não efetuaram estão sofrendo sanções.

Davi de Sousa, de 17 anos, é aluno da 3ª série do Ensino Médio na escola com 10 de nota disciplinar. O garoto, que tem cardiopatia, perdeu a mãe em 2020 e atualmente mora sozinho dividindo a rotina entre a escola (7h às 12h) e um emprego (das 13h30 às 22h). No mês passado, ao tentar acessar o GR8, sistema dos Colégios Militares, foi surpreendido com um bloqueio. Também foi comunicado de que não poderia mais se consultar com a psicóloga da escola.

“No site GR8 temos boletim, tarefas e avisos. Tentei acessar, não consegui e fui na coordenação. Me informaram que só poderá usar o aplicativo quem pagar a mensalidade. Me falaram que tem que pagar, se quiser ir na psicóloga ou usar o aplicativo, tem que pagar. Falei que estava usando normal, mas agora não vai dar mais. A enfermaria da escola também só vai nos atender se for caso de urgência”, explicou o aluno.

O estudante conta que tinha sessões com a psicóloga desde 2019 e que antes da pandemia ia de duas a três vezes por semana. A escola ficou então um tempo sem atendimento psicológico e quando retornou os alunos foram comunicados de que só poderiam ter acesso quem pagasse a taxa “facultativa”.

Comando diz que plataforma é ofertada por associação

Procurado, o Comando de Ensino que está vinculado à Seduc afirmou que a plataforma GR8 é fornecida pela Associação de Pais, Mestres e Funcionários, que é de cunho privado e trabalha no sentido de apoiar a escola militar. “É prevista no regimento dos Colégios Militares de Goiás, mas não há prejuízo nenhum para o aluno. Existe acompanhamento presencial e individual ao aluno. Não existe taxa e sim colaboração voluntária para o pai que quiser contribuir. Não é obrigatória. Se tem algum equívoco, foi repassado ao Comando de Ensino, o qual está analisando para correção de rota”, pontuou, em nota.

Grupos de WhatsApp excluídos

A alternativa para tarefas e horários de aulas para quem não acessa o sistema eram os grupos de WhatsApp de alunos e educadores. Na última sexta-feira (5), entretanto, os grupos foram excluídos. “Tive que pedir o horário de aula para uma amiga porque eles apagaram o grupo. Acho que me tiraram do grupo antes, inclusive, de mandar o horário da aula”, pontua.

Um áudio atribuído à secretaria da escola, diz o seguinte: “Recebemos informações agora dos coordenadores para deletar todos os grupos de WhatsApp. Segundo a orientação, não há mais necessidade de tutores para ministrar informação em grupos de WhatsApp. A professora vai deletar o grupo, vocês podem sair. Qualquer informação será presencial ou no GR8.”

Tarefas precisam ser impressas

Por meio da plataforma, os alunos podem copiar algumas atividades sem que seja necessário imprimir o material. Sem o site ou aplicativo disponíveis, as tarefas precisam ser impressas. “Algumas tarefas eles mandam não precisa imprimir, é só copiar. Quem não paga, não tem acesso, então eu teria que pagar todo dia para imprimir. Mais fácil é copiar do que gastar com folha”, completa Davi.

Depois da exclusão dos grupos de WhastApp, o estudante tentou, novamente, conversar na coordenação da escola. “Me disseram que o pagamento não é obrigatório, mas que não seria justo eu usar sem estar pagando, enquanto outros alunos efetuaram o pagamento”.

OAB afirma que cobrança é inconstitucional

Professor de Direito e Políticas Públicas da UFG e Presidente da Comissão de Direito Constitucional da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Goiás (OAB-GO), Saulo Pinto Coelho afirma que as taxas, sejam elas quais forem, em escolas públicas são inconstitucionais. “No caso específico da Educação, a Constituição Federal de 88, nos seus artigos 206 e 208, é muito clara no sentido de que o serviço de educação, quando prestado por estabelecimentos públicos, dever ser gratuito. Assim sendo, o dever constitucional de gratuidade da educação pública, impede a cobrança de taxas nos estabelecimentos 'oficiais'”.

Coelho explica que, mesmo quanto a serviços que poderiam ser considerados acessórios, como o psicólogo escolar, ou o serviço de enfermaria na escola, não se pode cobrar tais taxas. Isso porque se os planos de educação (sejam municipais, estaduais ou nacionais) preveem na estrutura multidisciplinar da escola tais serviços eles passam a integrar o serviço público quando prestado na escola. “Reforça essa minha interpretação o fato de o custeio de tais serviços integram o orçamento da educação, nas respectivas leis orçamentárias. Mesmo que assim não seja, ainda assim, compõe a estrutura do serviço de educação integram o serviço público de educação”.

Como buscar direitos?

A OAB-GO afirma que alunos e pais de alunos que estejam passando por situação de cobrança de taxa em alguma escola, podem procurar diversas instituições para reclamar seus direitos: a própria escola, a secretaria de educação, a Defensoria Pública Estadual e o Ministério Público. Além disso, também podem acionar o Procon, já que a prestação de serviço público também é tutelada pelo Código de Defesa do Consumidor.

“Por fim, podem, individualmente ou coletivamente, via associação de pais, por exemplo, procurar um advogado para ajuizamento de ações. Neste caso, em princípio, até mesmo impetrar mandado de segurança”, completa o presidente da Comissão de Direito Constitucional.

Na Defensoria Pública do Estado, podem procurar o Núcleo Especializado de Direitos Humanos pelo fone: (62) 3157-1040.

 

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