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Uma em cada três viagens de ônibus coletivo tem atraso na Grande Goiânia

Wildes Barbosa
Ponto de ônibus na Avenida T-63, no Setor Bueno, em Goiânia: espera de passageiros supera o previsto em 36,49% das viagens

Os atrasos ocorrem em pelo menos uma em cada três viagens de ônibus no sistema de transporte coletivo metropolitano de Goiânia, de acordo com dados da Companhia Metropolitana de Transportes Coletivos (CMTC) relativos ao ano de 2022. Durante todo o ano passado, foram realizadas 2.007.450 viagens no sistema e um total de 732.449 delas foram feitas além do horário programado, ou seja, 36,49% partiram depois do que deveria e não cumpriram o planejado, deixando os passageiros esperando mais tempo que o previsto.

De acordo com o presidente da CMTC, Tarcísio Abreu, a quantidade de viagens em atraso é alta, mas dentro do que se vê nas grandes cidades brasileiras, sobretudo por entender que a principal causa deste fato é o trânsito. Já para o engenheiro especializado em transporte e professor do Instituto Federal de Goiás (IFG), Marcos Rothen, o número de atrasos relatados é extremamente elevado e injustificado. “Atrasos nas linhas do transporte coletivo não são tão comuns assim”, diz.

Rothen explica que os atrasos são definidos como o tempo excedente ao programado e não considerando o trânsito livre, ou seja, o que não acontece nos horários de pico. “Esse tempo programado é definido a partir dos históricos de viagens. O tempo previsto é diferente para cada hora, por exemplo, às 6h da manhã o tempo previsto é menor do que o previsto para às 7h.” Segundo a CMTC, são três as situações que mais causam os atrasos nas viagens do sistema metropolitano: trânsito, eventos climáticos e acidentes.

Sobre o trânsito, a explicação de Abreu é que com um alto volume de veículos particulares ocupando as ruas, a dificuldade dos ônibus em cumprir os horários aumenta. Isso ocorre especialmente nos horários de pico, como nos começos das manhãs e finais de tardes, quando há mais carros e motos nas ruas e ocupando as faixas de ônibus e pontos de parada. O presidente da CMTC relata também que os eventos climáticos, sobretudo as chuvas mais fortes que ocorrem em partes do ano na capital, dificultam o fluxo dos veículos do sistema coletivo assim como no tráfego em geral.

As chuvas também aumentam o tempo do embarque e desembarque dos veículos por parte dos passageiros, que demoram mais para acessar o ônibus ou a rua, fazendo com que a parada seja mais longa e provoque atrasos. Em relação aos acidentes, a explicação é a mesma com o que ocorre ao tráfego em geral, já que a pista de rodagem fica obstruída e diminui os espaços para o fluxo, o que aumenta o tempo de viagem por ter mais veículos em menos espaço para percorrer. Além dos casos de acidentes com os próprios ônibus do sistema coletivo.

Rothen entende que o trânsito não é causa do atraso nas viagens, pois as condições de trafegabilidade são parecidas em todos os dias. “O que pode mudar as condições do trânsito é algum imprevisto que ocorra ao longo do itinerário, por exemplo, um acidente com vítimas que obstrua parte de uma via, ou um caminhão ou até mesmo um ônibus. Na grande maioria dos dias, o tempo de viagem a cada faixa horária será bem próximo. E também algumas linhas raramente terão atrasos, principalmente as que rodam apenas nos bairros, onde variações no trânsito são incomuns.”

O engenheiro explica que a programação das viagens do sistema coletivo já deveria ser feita com base nas condições do trânsito, o que evitaria os atrasos. “O trânsito faz parte do dia a dia da cidade, assim, não é uma justificativa aceitável. Eventualmente, uma enchente pode atrasar algumas linhas, mas isso não acontece todo dia. Da mesma forma, os acidentes nem sempre são nos mesmos locais.” Assim, o professor reforça que a programação das viagens deve considerar o tempo a cada faixa horária e a demanda de passageiros. Ressalta que quanto maior a quantidade de usuários, maior será o tempo de viagem e, com isso, para as linhas com maior demanda é preciso reservar um tempo adicional de cerca de 5 minutos para variações no trânsito.

O presidente da CMTC justifica que em todas as grandes cidades do Brasil o trânsito tem sido um desafio a ser enfrentado. “Reunimos com os secretários de todo o País e todos falam que esse é o principal problema, não é só aqui”, diz. Ele lembra que a região metropolitana de Goiânia recebe mais veículos particulares a cada dia e ressalta que há variações de sentidos nas ruas, problemas com sinalizações ou semáforos, obras e outras movimentações na cidade que interferem no tráfego dos ônibus. Ele ressalta que o principal problema dos atrasos é o tempo de espera dos passageiros nos pontos de embarque ou terminais.

Isso porque resulta em uma piora na percepção do usuário com relação ao sistema e, consequentemente, ele passa a dar menor confiança ao transporte coletivo. “Não vou dizer que o atraso prejudica, mas ele deixa o usuário insatisfeito, fica esperando e pensando um monte de coisa”, afirma Abreu. Outra consequência é a formação dos chamados comboios, que ocorre quando mais de um ônibus de uma mesma linha chega em um ponto, como se fizessem viagens duplicadas. Além de prejudicar o usuário, confere uma perda ao sistema, já que um veículo estará se locomovendo com uma quantidade de passageiros aquém do esperado.

O professor Rothen, lembra que o atraso faz com que os horários não sejam respeitados e, uma viagem que estaria prevista para ser realizada às 7h e está atrasada, poderá ter que atender um maior número de passageiros. Isso porque ela estaria atendendo tanto os que iriam na viagem programada quanto os passageiros que estão chegando para a próxima, o que aumenta ainda mais o atraso. “Os atrasos também afetam a regularidade das linhas. Aqui no sistema de Goiânia é possível ver que muitas vezes faltam ônibus nas horas de pico e, logo após os passageiros terem pego ônibus lotados, passam ônibus vazios da mesma linha.”

Monitoramento das linhas pode ajudar a reduzir atraso

O engenheiro especialista em transporte, Marcos Rothen, entende que a redução das viagens em atraso na região metropolitana de Goiânia passa pelo planejamento que é feito pela Companhia Metropolitana de Transportes Coletivos (CMTC). “O principal que a CMTC deve fazer é verificar se as programações das linhas estão corretas, principalmente conferindo os tempos de viagem. O trânsito simplesmente não pode ser uma desculpa. E mesmo as outras causas devem ser verificadas, se os ônibus estão entrando na linha no horário correto”, diz ele, que também é professor do Instituto Federal de Goiás (IFG).

Ele explica que os ônibus não devem entrar nem antes e nem depois do previsto, já que ambas as situações prejudicam o usuário. Até mesmo uma viagem adiantada, por exemplo, faz com que um passageiro perca o ônibus que foi programado para passar em determinado horário e ele está em conexão ou a caminho do ponto de embarque. Segundo o presidente da CMTC, Tarcísio Abreu, a companhia faz o monitoramento das principais linhas do sistema e, em alguns casos, consegue alterar o tempo de largada, que é o horário em que os ônibus começam a operar. 

Este monitoramento também permite, a partir do acompanhamento em tempo real das viagens pelo Centro de Controle Operacional (CCO) do consórcio das empresas concessionárias do sistema, a mudança de rota de forma temporária, como nos casos de a pista ter alguma obstrução, ou até mesmo a cisão de um ponto para que determinado ônibus diminua o atraso. Estes casos ocorrem com a finalidade de evitar o comboio de veículos e um deles deixa de parar em determinado ponto para atender passageiros mais adiante já que outro ônibus já está próximo.

A CMTC defende que uma melhoria na infraestrutura urbana, sobretudo com a construção dos corredores exclusivos ou preferenciais do transporte coletivo, podem reduzir os atrasos. “Por isso estamos acreditando que o BRT Norte-Sul já deve ser usado e estamos usando. Só com a saída do Terminal Isidória para o Centro, com o uso do corredor, já houve ganho de 5 minutos na viagem. Por isso que tem de operar inteiro”, diz. A previsão é que todo o corredor do BRT tenha um ganho no tempo de viagem entre 30% e 40%. Quanto aos corredores preferenciais, Abreu relata que ainda falta respeito dos motoristas, que continuam utilizando as faixas de forma indevida.

Já o professor Rothen acredita que a melhor programação de viagens é capaz de reduzir os atrasos. Ele conta que neste ano, como parte de um projeto de pesquisa, fez uma pesquisa no ponto 040, localizado na Avenida T-7 com a Avenida T-1, no período da tarde. Um dos casos analisados foi o da linha 003 (Terminal Maranata / Avenida Itália / Rodoviária). “As conclusões que tirei considerando a soma das duas linhas foram que o maior número de ônibus é ofertado antes e após os picos com 7 passagens, tanto na faixa das 16h às 16h29 e 18h30 às 19h”, afirma. Ele diz que nesses horários ocorre a maior quantidade de lotação nos veículos.

O estudo mostra que, “na faixa das 17h30 às 17h59 ocorre o segundo maior intervalo entre ônibus (17 minutos) e também a maior quantidade de ônibus cheios e lotados e são ofertadas menos viagens que na faixa das 18h30”. Para Rothen, é comum que os operadores aleguem problemas no trânsito para as falhas operacionais, “mas uma oferta maior antes do horário de pico demonstra uma falha da programação ou controle operacional”. Segundo ele, ao verificar os dados do estudo, conclui-se que na linha 003 e a saída intermediária na Praça Cívica, as viagens são programadas ou operadas de forma isolada e, mesmo dentro dos dois serviços, a oferta é irregular.

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