Exame de insanidade mental mostra que o ex-servidor público Felipe Gabriel Jardim Gonçalves, de 26 anos, estava apto a compreender a gravidade de seus atos quando invadiu uma farmácia na Avenida T-4, no Setor Bueno, e matou o então sogro, o policial civil aposentado João do Rosário Leão, de 63, no dia 27 de junho de 2022. A audiência de instrução e julgamento foi desmarcada no começo de dezembro por falta deste documento, que só ficou pronto agora.O laudo pericial feito pela Junta Médica Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJ-GO) afirma que a capacidade de entendimento da situação por parte de Felipe “estava plena” no momento do crime, pelo qual se encontra preso desde o dia 29 do mesmo mês. Também foi identificado na avaliação de saúde mental um transtorno, mas nada que o deixasse sem condições de avaliar seus atos.No relatório, de certa forma, são rebatidos os argumentos da defesa de que Felipe o crime teria ocorrido por causa de um surto psicótico que ele teve após receber supostas ameaças por parte da namorada somadas a um alegado uso indiscriminado de medicamentos. A defesa afirma que estes surtos se tornaram frequentes durante o namoro e que no dia ele chegou a temer pela vida.Para a perícia, nada disso influenciou na capacidade de compreensão do crime, e o ato não foi interpretado como de legítima defesa pelo subconsciente do réu. “Apesar de ser portador de perturbação de saúde mental, não há nexo de causalidade do tal ato criminoso e de sua condição mental à época do crime.”A Junta Médica não vê motivos para internação hospitalar por causa do aparente transtorno, mas sugere um tratamento ambulatorial “regular e com rigorosa supervisão de familiar”. No documento, ao qual a reportagem teve acesso, é frisado que não basta ser portador de uma patologia mental para concluir por uma inimputabilidade.Foi verificado que a dinâmica do crime descartaria “a dificuldade para controlar impulsos”, visto que envolveu planejamento para chegar a um fim e que havia “entendimento e determinação preservados quanto ao crime”.Exame psicológico complementar detectou sintomas sugestivos de transtorno mental com maior propensão a episódios depressivos com sintomas psicóticos. Entretanto, deixou para a avaliação psiquiátrica (que elaborou o laudo de insanidade) a avaliação quanto ao diagnóstico, tratamento e a existência ou não de nexo do momento do crime ao que foi identificado na perícia.Tanto no laudo do exame psicológico como do psiquiátrico foram entrevistados o próprio Felipe e sua mãe. As entrevistas foram feitas entre dezembro e março e o resultado ficou pronto em maio, sendo encaminhado para a Justiça no final do mês passado.Advogado que representa a família da vítima no processo como assistente de acusação, Emanuel Rodrigues diz que o laudo foi recebido com tranquilidade porque “apenas revelou o que todos já sabiam”, que “as alegações da defesa dele eram apenas uma estratégia arcaica e retrógrada de culpabilizar a vítima pelas ações que foram pensadas, arquitetadas e criadas apenas pelo Felipe”.O advogado Júlio Britto, que defende Felipe, afirmou que o laudo foi assinado por um psiquiatra parcial e apresenta contradições. Ele citou uma suposta divergência entre a opinião da psicóloga que entrevistou o réu e a do psiquiatra, ambos pela Junta Médica e também apontou o que diz ser contradições entre o posicionamento do psiquiatra no laudo em relação ao que publica nas redes sociais. “A defesa técnica de Felipe vai solicitar um novo exame com um psiquiatra particular e em plenário do Júri irá contestar esse que foi assinado pela Junta média do TJGO.”Entenda o casoO ex-servidor público é réu por homicídio duplamente qualificado (motivo torpe e mediante recurso que dificultou defesa da vítima) e confessou o crime, que ganhou repercussão após imagens de câmeras de segurança vazarem mostrando como ocorreu.Por volta de 11 horas do dia 27 de junho, uma segunda-feira, Felipe entrou no comércio e matou o sogro a tiros na frente da cunhada. Antes, ele entrou em contato com a então namorada, Kennia Yanka, avisando que o mataria.A decisão de cometer o crime veio após o acusado identificar que João havia registrado um boletim de ocorrências contra o genro por violência doméstica e familiar contra a filha da vítima. Felipe e Kennia Yanka namoravam desde abril de 2021 e segundo depoimentos o acusado sempre demonstrou um comportamento agressivo e hostil. Por duas vezes ele chegou a mostrar para ela uma arma que portava sem autorização, ameaçando-a.Dois dias antes de matar o sogro, o ex-servidor público efetuou um disparo para o alto na casa da vítima, fato que motivou o boletim de ocorrência. Felipe descobriu sobre o registro na delegacia por meio de um colega policial militar.