O secretário municipal de Educação de Goiânia, Rodrigo Caldas, afirmou que a pasta pode rescindir o contrato com a Ponto ID, responsável pela implantação do Conecta Educação, sistema de integralização da gestão escolar que já custou R$ 12,5 milhões ao município, caso a empresa não resolva até o final de fevereiro os problemas que estariam inviabilizando o seu uso pelos professores e servidores da rede municipal.A Ponto ID, entretanto, diz que até o momento não recebeu nenhum relatório informando quais problemas seriam estes.O Daqui mostrou na última quinta-feira (25) que, apesar de a empresa ter sido contratada em outubro de 2021 com promessa da Prefeitura de que o sistema estaria em uso ainda em dezembro daquele ano, até hoje o Conecta Educação não entrou em funcionamento.O projeto envolve a gestão digitalizada e integralizada de toda a rede de ensino, incluindo as 374 escolas de ensino fundamental e centros municipais de educação infantil (Cmeis), tendo como principal chamariz os leitores faciais que seriam usados para registrar a frequência dos atualmente cerca de 120 mil alunos e 20 mil servidores da Secretaria Municipal de Educação (SME).O contrato original com a Ponto ID é de R$ 9,38 milhões, mas a empresa alega que recebeu até o momento cerca de R$ 8,16 milhões, enquanto no Portal de Transparência da Prefeitura consta que foram repassados R$ 12,5 milhões. Até o momento, a SME não contestou este último valor.Na entrevista, o titular da SME afirmou que o contrato foi prorrogado por mais três meses para que a empresa consiga resolver os problemas apresentados em um relatório da pasta e em um parecer da Secretaria Municipal de Inovação, Ciência e Tecnologia (Sictec) e que o prazo vence no final de fevereiro.Rodrigo afirmou ao programa que desde que assumiu a SME, em junho, já começou a ouvir reclamações de diretores sobre o sistema da Ponto ID e se reuniu com a empresa para fazer a troca dos leitores faciais na época.Segundo ele, alguns estavam apresentando inconsistências, mas relativizou dizendo que são equipamentos tecnológicos. Na época, a empresa teria feito as trocas, mas durante todo o segundo semestre foram necessárias outras adequações, culminando com a prorrogação do contrato por mais três meses para uma solução definitiva.Caso a Ponto ID não consiga resolver os problemas, além do distrato, o secretário afirma que será “aplicado o rigor da lei” para que seja feita a restituição do que já foi pago.“Sim (vamos cobrar a restituição). Se a empresa não der conta, e eu acredito que ela vai dar conta porque é uma empresa que a gente considera que seja idônea, se ela der conta nós temos interesse em continuar, se não der conta, nós vamos aplicar o rigor da lei”, disse.Já a SME acrescentou que o ressarcimento poderá ser realizado “de acordo com orientação jurídica e dentro do que dita a lei”. “Tal cobrança, caso seja necessária, se dará diante do que for reconhecido como descumprimento de cláusulas contratuais. Ou seja, não tem como precisar esse aspecto uma vez que ainda temos um termo aditivo em vigência.”DiscordânciaA Ponto ID diz que foi feito um aditivo contratual que prorrogou de forma gratuita o contrato por mais 90 dias e foi combinado que a SME apresentaria um “relatório com descrição concreta dos eventuais problemas”, além de promover reuniões quinzenais para que fossem decididas em conjunto “as soluções desses possíveis problemas”. Porém, segundo a empresa, a secretaria não cumpriu o combinado.“A SME, infelizmente, até o momento, não agendou reunião, nem apresentou relatório com descrição concreta de eventuais problemas. Por esse motivo a empresa não sabe dizer se há problemas e, se houver, quais são e em quais unidades escolares.” A empresa diz que segue à disposição da secretaria para começar as reuniões, receber os relatórios e “pronta para sanar quaisquer problemas”.Nesta quarta-feira (31), a SME reforçou, por meio de nota, que a Ponto ID havia se comprometido, por meio do aditivo ao contrato com o acompanhamento da Procuradoria Geral do Município (PGM), “a sanar as inconsistências do sistema levantadas através dos relatórios fornecidos pelas unidades educacionais que utilizam os módulos contratados”.A pasta afirmou que entre os mecanismos que precisam ser reajustados, estão o módulo pedagógico, o que aborda alimentação dos alunos, a análise técnica na instalação das controladoras faciais, “inclusive na reelaboração dos locais em que foram instaladas”.A secretaria também disse que estes e outros problemas foram levados ao conhecimento da empresa através dos relatórios técnicos fornecidos pelo fiscal e gestor do contrato ao longo da execução do mesmo.O Daqui pediu mais detalhes sobre os problemas apontados no relatório, mas a SME respondeu que a empresa tem se mostrado receptiva em sanar os aspectos do sistema que não apresentaram resultados satisfatórios e que “é importante aguardar o final do prazo previsto para o término do contrato para então poder avaliar o que de fato deve ser apurado como não cumprimento”.Ainda ao Chega pra Cá, o secretário reconheceu que as matrículas neste ano na rede municipal foram feitas todas no sistema antigo, de antes do Conecta Educação, por determinação dele, porque no ano anterior “teve muitos problemas” e ressaltou que desta vez não houve nenhum contratempo.O sistema anterior, chamado de Sistema Integrado de Gestão Escolar (Sisge), foi desenvolvido pelo próprio município. Rodrigo tomou posse da SME em junho do ano passado.A SME também confirmou uma informação repassada por servidores da pasta ao Daqui de que o Conecta Educação funcionaria no momento apenas com o módulo pedagógico, espaço em que professores podem fazer o planejamento de aulas. Os servidores dizem que isso seria uma solução permanente e que os leitores faciais, por exemplo, já estariam descartados, pelo menos em 2024. Já a secretaria diz que vai fazer uso do sistema enquanto o contrato estiver vigente.“Nosso objetivo é fazer uso do sistema naquilo que ele se propõe fornecendo através dos módulos pedagógicos programas que possam contribuir para os servidores da educação que trabalham nas escolas”, afirmou a secretaria na nota.PromessaQuando foi anunciado, em 2021, o Conecta Educação foi colocado com uma promessa de integralização de toda a rede de ensino com impacto não apenas na gestão de informações, mas na segurança e na economia de gastos. Na época, a secretaria afirmava que pais e conselho tutelares seriam informados automaticamente sobre a presença dos alunos nas escolas e que o reconhecimento facial permitiria um controle sobre o volume de crianças e adolescentes dentro das unidades, evitando desperdício de alimentos.Os servidores chegaram a passar por um treinamento no primeiro semestre de 2022, e os leitores faciais chegaram a ser instalados nas unidades de ensino. A SME afirmou em janeiro do ano passado que todos os na época 108 mil alunos matriculados na rede haviam sido cadastrados no sistema para registro de frequência com os equipamentos.“Quando o aluno chegar, vai ter o reconhecimento facial e o pai vai receber um SMS na hora, informando que o filho entrou na escola. Quando for a hora do lanche, o pai vai receber o SMS com o cardápio do dia. Para os professores, diretores, vai acabar a história de ter que ir na Coordenadoria Regional de Educação (CRE) para resolver demanda de frequência, vai ser tudo online por esse sistema”, disse, no dia 26 de outubro de 2021, o vereador Wellington Bessa (DC), então titular da SME na época do lançamento do Conecta Educação.Em maio de 2022, o prefeito Rogério Cruz (Republicanos) foi questionado sobre o atraso no funcionamento do sistema e na necessidade do mesmo durante audiência de prestação de contas na Câmara Municipal. Na mesma época, o então vereador Mauro Rubem (PT), hoje deputado estadual, protocolou denúncia tanto no Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás (TCM-GO), este junto com a vereadora Aava Santiago (PSDB) como no Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO).O processo no TCM-GO segue em tramitação até hoje, sem ainda ter havido uma manifestação do Ministério Público de Contas (MPC). Já o MP-GO arquivou a denúncia em 2023.