Oftalmologista é suspeito de fraudar fila de transplante de córneas e cobrar R$ 16 mil para dar prioridade a pacientes
Ele foi suspenso de atuar por prazo indeterminado e teve R$ 3 milhões sequestrados da conta, diz polícia
Letícia Graziely, Gustavo Cruz
13 de novembro de 2024 às 21:40

Polícia apreendeu documentos durante cumprimento de mandados (Divulgação/Polícia Civil)
Um oftalmologista é suspeito de fraudar a fila de transplante de córneas e cobrar até R$ 16 mil para dar prioridade a pacientes que precisam de transplantes de córneas. Segundo a Delegacia Estadual de Repressão a Crimes Contra o Consumidor (Decon), o médico trabalha em um hospital particular no Setor Marista, em Goiânia, e foi suspenso de atuar por prazo indeterminado. Ele também teve R$ 3 milhões sequestrados da conta.
Houve reclamações de pacientes no sentido de cobranças indevidas. Pacientes que têm plano de saúde e buscaram um transplante de córnea e precisaram fazer pagamentos adicionais para equipe desse médico. Ficou demonstrado até o momento que as cobranças indevidas chegavam em valor, por paciente, de R$ 12 a R$ 16 mil", explicou a delegada Débora Melo.
Por não ter o nome divulgado, o jornal não conseguiu localizar o médico para que se posicionasse até a última atualização desta reportagem.
Em nota, o Conselho Regional de Medicina do Estado de Goias (Cremego) disse que "irá cumprir a decisão judicial que determinou a suspensão do CRM do profissional". Também informou que "todas as denúncias relacionadas à conduta ética de médicos são apuradas e tramitam em total sigilo, conforme determina o Código de Processo Ético-Profissional Médico".
Ao jornal, a Secretaria de Estado da Saúde (SES-GO) informou que, baseado nos casos auditados pela própria Gerência de Transplantes e em posteriores denúncias recebidas, "a pasta determinou a suspensão da equipe cautelarmente por 60 dias para apurar as infrações administrativas" (confira nota completa ao final da matéria).
Investigação
A Polícia Civil informou que a investigação começou há seis meses após a Central Estadual de Transplantes de Goiás realizar uma auditoria no hospital e identificar que uma equipe coordenada pelo médico estaria fraudando a fila de espera de transplantes de córneas.
"Essa equipe faz um número bem elevado de cirurgias em pacientes que são diagnosticados com uma certa urgência, o que faz com eles passem na frente de todos os pacientes que estão esperando o transplante", informou o delegado titular da Decon, Frederico Maciel.
Durante a operação, realizada nesta quarta-feira (13), em Goiânia e Aparecida de Goiânia, a polícia cumpriu três mandados de busca e apreensão, sequestro de bens e cautelares pessoais. Foram apreendidos documentos e aparelhos eletrônicos. A investigação continua para apurar se há mais pessoas envolvidas no crime e até que ponto os pacientes sabem que esse tipo de cobrança é indevida.
Regulação de transplantes
A delegada explicou que no Brasil existe uma lei que regula todos os transplantes de tecidos e órgãos. Por isso, qualquer cirurgia que envolve transplante de ógãos, precisa ser regulamentada pelo Estado. Em Goiás, o processo é feito pela Central Estadual de Transplantes, independentemente se o hospital é público ou privado.
"Precisa de uma lista com critérios que as equipes médicas devem observar. Existem críterios para a pessoa ser submetida ao transplante e existem critérios, ainda mais específicos, para ela ser submetida a uma priorização nesse tranplante", afirma a delegada.
Nota da SES-GO
A Secretaria de Estado da Saúde (SES-GO) informa que, por meio da Gerência de Transplantes, identificou possíveis irregularidades no processo de transplantes de tecidos oculares em uma unidade do serviço privado habilitada para transplantes de córneas.
Diante disso, baseado nos casos auditados pela própria Gerência de Transplantes e em posteriores denúncias recebidas, a pasta determinou a suspensão da equipe cautelarmente por 60 dias para apurar as infrações administrativas, conforme determina o Decreto 9.175 de 18 de outubro de 2017. As instâncias superiores também foram notificadas para as devidas providências.
A medida foi realizada considerando a Portaria de Consolidação nº 4, de 28 de setembro de 2017, que atribui às Centrais Estaduais de Transplantes (CET) a responsabilidade de coordenar, fiscalizar e controlar as ações relacionadas aos transplantes no Estado.
Vale destacar que nenhum receptor inscrito em lista para transplante desta unidade foi prejudicado com essa suspensão, pois à medida que foram selecionados em lista para realização do transplante, houve a transferência para outra unidade transplantadora.
Esclarecemos que o Sistema de Transplantes é regido pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Entretanto, os receptores podem optar por realizar o transplante em unidades públicas, conveniadas ou privadas. No caso do transplante não SUS, os valores pagos são para o custeio do procedimento hospitalar e não envolve o processo de doação ou distribuição do órgão ou tecido.
Em Goiás, no ano de 2024, cerca de 63% dos transplantes de córneas foram realizados pelo SUS. No caso do transplante de órgãos, 99% são realizados na rede pública estadual.
Faz-se necessário informar que pacientes que necessitam de transplante, são inscritos no sistema pelos médicos transplantadores. No caso dos transplantes de córneas, a lista de espera segue a ordem cronológica de inscrição, podendo casos de urgência serem priorizados após relatório médico da equipe responsável, conforme critérios definidos na legislação.
Por fim, as providências diante dos fatos reforçam o compromisso da Secretaria de Estado da Saúde e da Central Estadual de Transplantes de Goiás em zelar pela integridade, transparência e equidade em todas as etapas do processo de doação e transplantes no estado de Goiás, garantindo assim que o sistema seja equânime para todos aqueles que aguardam em lista por um transplante.
Comunicação Setorial SES-GO