Servidores goianos de quatro órgãos receberam R$ 27,2 milhões acima do teto constitucional do funcionalismo entre dezembro e janeiro, segundo mostra levantamento da reportagem nas folhas de pagamento do Tribunal de Justiça (TJ-GO), Ministério Público (MP-GO) e tribunais de contas do Estado (TCE-GO) e dos Municípios (TCM-GO). Ao todo, 621 magistrados, promotores, procuradores e outros servidores receberam valores superiores a R$ 39,2 mil, incluindo 149 salários acima de R$ 100 mil.Em todos os casos, os altos ganhos dos servidores são impulsionados, em grande parte, por benefícios dados a servidores públicos e que, apesar de legais, burlam o teto constitucional a fim de permitir o recebimento, como gratificações e verbas indenizatórias.O TJ-GO é o órgão com a maior quantidade de vencimentos acima do teto: 536, ultrapassando o teto em R$ 25,9 milhões (veja quadro). No primeiro mês de 2023, 147 magistrados receberam salários acima de R$ 100 mil, sendo os maiores R$ 177,9 mil e R$ 173,6 mil pagos a dois juízes. O levantamento considera apenas os vencimentos líquidos, isto é, já após os descontos, o que significa que esses são os valores efetivamente recebidos por eles.Boa parte dos altos ganhos salariais no TJ-GO se deve a “direitos eventuais”, que variaram de R$ 33,3 mil a R$ 145,6 mil em janeiro, caso do juiz com R$ 173,6 mil. A rubrica engloba pagamentos como férias, gratificação natalina (o 13º salário dos magistrados), substituições, gratificações, pagamentos retroativos e outros que não estão sujeitos ao abate do teto, como o recebimento de URVs.No tribunal, os valores pagos em relação às URVs somaram R$ 13,4 milhões apenas em janeiro e dizem respeito à recomposição salarial por causa de um suposto erro de cálculo na conversão do cruzeiro real, moeda corrente em 1994, para a Unidade Real de Valor (URV), moeda provisória que deu origem ao real à época. O Órgão Especial do TJ-GO deu, em decisão administrativa de 2016, direito a isso aos magistrados.Das 536 pessoas com ganhos líquidos acima do teto no tribunal, 335 receberam URVs com valores entre R$ 12,8 mil e R$ 78,8 mil. A reportagem questionou o tribunal quanto já foi pago aos magistrados em decorrência das URVs e quanto ainda falta ser pago, mas não recebeu resposta. Em nota, o TJ-GO diz apenas que “o Poder Judiciário goiano sempre cumpre com a legislação vigente em relação à remuneração de magistrados e servidores, como também na sua função julgadora.”No MP-GO, dois promotores tiveram vencimentos líquidos em janeiro acima de R$ 100 mil e 61 outros promotores e procuradores receberam mais que o teto constitucional. Os dois com maiores ganhos receberam verbas indenizatórias referentes a licença-prêmio — R$ 52,2 mil, cada —, além de outros benefícios. No caso de servidores, apenas um recebeu mais que o teto, impulsionado pelo pagamento de R$ 14,7 mil também de verba indenizatória.Em nota, o órgão argumenta que a “remuneração de todas e todos os integrantes do Ministério Público obedece ao estabelecido no Art. 37, inciso XI (da Constituição Federal).” “As verbas indenizatórias estão de acordo com o Art. 37, § 11. Qualquer valor percebido por integrantes está previsto em lei ou normativa da instituição ou do Conselho Nacional do Ministério Público.”AtrasadoAs folhas de janeiro dos tribunais de contas do Estado (TCE-GO) e dos Municípios (TCM-GO) ainda não estão disponíveis nos portais de transparência dos órgãos. Em dezembro, 12 servidores de cada uma das cortes tiveram ganhos acima do teto do funcionalismo. No primeiro, o valor pago acima do teto foi R$ 21,2 mil; no segundo, R$ 50,4 mil. Nos dois casos, os pagamentos extra teto dizem respeito a indenizações e outras diferenças retroativas.Em nota, o TCE-GO diz que sua folha de pagamento é, rotineiramente, disponibilizada no portal da transparência “ao final da primeira quinzena do mês subsequente.” “Quanto aos pagamentos questionados, referem-se a um reduzido número de servidores e estão rigorosamente dentro da legalidade, referindo-se a parcelas de caráter indenizatório”, afirma o tribunal no texto.Já o TCM-GO informa que a folha do tribunal “tem a prática de alimentar o portal da transparência com os dados do mês até o dia 10 do mês subsequente” e ressalta, em relação aos salários, que “nenhum servidor ou membro recebe remuneração acima do teto constitucional.” “As verbas de natureza indenizatórias não integram a remuneração.”“Os doze servidores, certamente, receberam pagamento de verbas indenizatórias e adicional de férias (que é pago separadamente). Nove servidores receberam valores correspondentes à inclusão da conversão em pecúnia, de licença-prêmio (direito previsto em lei) e três conselheiros receberam o adicional de férias, que é calculado em apartado, conforme a legislação”, completa o texto.-Imagem (1.2610358)