Secretaria de Saúde fez pagamentos fora dos canais oficiais para pessoas sem ligação com contratos da prefeitura, diz MP
Três empresas teriam recebido pagamento antecipado e um empresário do Tocantins uma transferência de R$ 30 mil
Samantha Souza
29 de novembro de 2024 às 12:00

Wilson Pollara em frente à Casa do Albergado, em Goiânia (Reprodução/TV Anhanguera)
O Ministério Público de Goiás investiga uma série de pagamentos fora dos canais oficiais da Secretaria Municipal da Saúde de Goiânia (SMS) e que seriam ilegais para fornecedores da Fundação de Apoio ao Hospital das Clínicas (Fundahc) e pessoas sem vínculo contratual com prefeitura. Em relação aos foncedores, a verba, conforme estabelecido em lei, deveria ter sido repassada para a entidade que gerencia quatro unidades de saúde na capital, mas estaria sendo usada para beneficiar prestadores de serviços e pressionar a direção da fundação.
São apontados como líderes do suposto esquema criminoso o ex-secretário de Saúde de Goiânia, Wilson Modesto Pollara, o ex-secretário executivo, Quesede Ayres Henrique e o ex-diretor financeiro Bruno Vianna Primoda. Eles foram presos durante a Operação Comorbidade realizada pelo Grupo de Atuação Especializada no Patrimônio Público (Gaepp) do MP-GO, nesta quarta-feira (27). De acordo com o Ministério, a prisão temporária deles foi necessária para não atrapalhar as investigações.
Ao jornal, a defesa de Pollara informou que solicitou o pedido de habeas corpus para seu cliente "tendo em vista que em momento algum ele representou qualquer risco à investigação" e que são foram suficientes as "medida adotadas como o afastamento do cargo, a suspensão do exercício de suas funções, a proibição de sua entrada em prédios relacionados à prestação de serviços de saúde" (Veja a nota completa no final da matéria).
A advogada Andreia Messora, que defende o ex-diretor financeiro da SMS, também informou que até o fim da tarde de quarta-feira (28) não tinha tido acesso. Ela não forneceu informações sobre a demora para recebimento do processo, lembrando que a posição deles seria apenas de espera.
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Investigação
Segundo o Gaepp, as investigações começaram a partir de informações repassadas pelo Ministério Público de Contas (MPC) a respeito de repasses financeiros considerados 'estranhos' entre a SMS e credores, incluindo os da Fundahc. Durante a apuração, a diretora-executiva da Fundahc foi ouvida e, à época, teria dito que o esquema estava em pleno funcionamento. Na época, Pollara retomava ao cargo de secretário após ter sido afastado liminarmente por um mês pelo Tribunal de Contas dos Municípios do Estado de Goiás (TCM-GO).
O levantamento inicial do MP aponta que pelo menos três empresas receberam recursos de forma antecipada da fundação por determinação dos investigados. Por outro lado, quatro fornecedores estavam com pagamentos atrasados "dada a incontestável e indevida ingerência da Secretaria Municipal de Saúde".
Além disso, um empresário do Tocantins, sem vinculo com a SMS, teria recebido R$ 30 mil.
Os pagamentos
Em coletiva, os promotores explicaram que as investigações ainda estão em estágio inicial, mas já foi apurado que em menos de dois anos, a dívida da SMS com a Fundahc saltou de R$ 60 milhões para R$ 121,8 milhões. Com o aumento da dívida a fundação ficou sem condições de funcionamento regular e, consequentemente, "sem capacidade de reação às investidas criminosas dos requeridos", conforme o MP-GO. Em paralelo a isso, os dois secretários e o diretor financeiro da pasta atuavam de forma ilegal para viabilizar o pagamento de alguns prestadores de serviços contratados.
Ainda o Gaepp, o diretor financeiro solicitava regularmente à gerência financeira da Fundahc a lista de fornecedores proprietários. Depois a repassava para o secretário-executivo que, de forma irregular e com a aprovação de Pollara, teria feito supostas negociações diretamente com os gestores e realizado pagamentos clandestinos, fora do caixa da SMS. Os investigados também teriam feito repasses à fundação em valores muito inferiores aos devidos, "com determinação expressa de que fossem utilizados para pagamentos específicos", aponta a investigação.
Há indícios de direcionamento nos pagamentos a determinados credores em detrimento a outros. "A apuração continuará. Coletamos hoje um grande rol de provas, que cremos que poderá ajudar a elucidar adequadamente este contexto fático", comentou o promotor Rafael Correa Costa, coordenador do Gaepp.
Troca de mensagens
Entre as provas juntadas nos pedidos de prisão e de busca e apreensão desta quarta-feira consta troca de mensagens de whatsapp entre os investigados e a diretora-executiva da Fundahc, Lucilene Maria da Sousa, com supostas determinações e pressões. Na troca de mensagens também estaria uma suposta ameaça de Quesede, ocorrida no dia 21 de outubro, de que substituiria a Fundahc caso as medidas não fossem atendidas.
Também foi localizado um comprovante de transferência para a conta particular de um prestador de serviços da fundação, pagamento este que teria garantido que pediatras não paralisassem o serviço. A articulação envolvendo este prestador de serviço teria sido intermediada pelo ex-secretário de saúde.
Ainda na troca de mensagens, o Gaep identificou um comprovante de transferência, realizada em 19 de outubro, no valor de R$ 30 mil para a conta de um empresário do Tocantins sem nenhum contrato ou relação formal com a SMS ou com a Fundahc.
O coordenador do Gaepp informa, entretanto, que ainda está em apuração o contexto e a motivação para os pagamentos que eram feitos de forma ilegal, fora do caixa da Prefeitura, com a promessa de pagamento em momento posterior com recursos do fundo municipal de Saúde, aí seguindo a tramitação prevista em lei.
Ainda durante a coletiva, o MP-GO apontou que as transferências identificadas na investigação não atendem, "em qualquer das unidades que são objeto do convênio, às regras ajustadas entre o Poder Público Municipal e a Fundahc". "Isso porque os repasses são irregulares e aquém dos valores ajustados nos planos de trabalhos correspondentes a cada unidade atendida, sendo que, principalmente nos anos mais recentes, houve inegável agravamento da situação".
Veja a nota completa da defesa de Pollara
A defesa do médico Wilson Pollara informa que impetrou habeas corpus para seu cliente, tendo em vista que em momento algum ele representou qualquer risco à investigação - notadamente, porque a própria decisão judicial que decretou a prisão já adotou medidas suficientes para assegurar o curso do processo.
Dentre as medidas adotadas destacam-se o afastamento do cargo, a suspensão do exercício de suas funções, a proibição de sua entrada em prédios relacionados à prestação de serviços de saúde e a restrição de contato com testemunhas ou outros investigados. Portanto, a defesa entende que a prisão temporária de Pollara é desnecessária.
Estamos aguardando a realização da audiência de custódia, bem como a análise do pedido de habeas corpus, para que liberdade de Pollara seja restabelecida. A defesa reitera sua convicção de que, ao longo do processo, será comprovada a inocência de seu cliente em relação às acusações levantadas de forma precipitada pelo Ministério Público de Goiás.
Thiago M. Peres OAB/SP 257.761 OAB/GO 70.310