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TCE questiona ida de adolescentes para a EJA em Goiás

Wesley Costa
Em 2023, alunos do ensino noturno regular foram transferidos para a EJA

GABRIELLA BRAGA

O Tribunal de Contas do Estado de Goiás (TCE-GO) determinou à Secretaria de Estado da Educação (Seduc) que destine a Educação de Jovens e Adultos (EJA) apenas para estudantes com o perfil, ou seja, aqueles que não finalizaram os estudos na idade prevista. O órgão fiscalizador criticou ainda a medida tomada pela pasta, no início de 2023, de transferir alunos menores de idade do ensino médio regular noturno à modalidade.

A determinação resultou de uma auditoria operacional realizada pelo TCE-GO no ano passado para avaliar a oferta da EJA na rede estadual de educação. O DAQUI mostrou o caso em maio de 2023, quando pais de alunos e professores reclamaram da decisão de migrar as turmas em meio ao ano letivo. Com o tempo reduzido de estudos na modalidade, aqueles que estavam no terceiro ano do ensino médio se formaram após o primeiro semestre.

O ensino de jovens e adultos é voltado ao público que, por algum motivo, não tenha concluído a educação básica na idade adequada. Para concluir o ensino fundamental, a idade mínima para a matrícula na EJA é de 15 anos. Já para o nível médio, de 18 anos. No último caso, é possível finalizar os estudos, cujo período regular é de três anos, em um ano e meio. A idade mínima para a modalidade consta na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).

No relatório da auditoria, datado de dezembro de 2023, foi concluído que há “descaracterização da modalidade de ensino Educação de Jovens e Adultos” diante da oferta de vagas para alunos que não preenchem os requisitos legais, como a idade e a descontinuidade nos estudos. “Com o remanejamento dos alunos do ensino médio para a EJA, criamos turmas bastante heterogêneas e com alunos muito jovens, o que pode dificultar o ensino para os alunos alvo.”

A partir das análises, o TCE-GO determinou, em acórdão proferido na última quinta-feira (6), “apresente, no prazo de 120 dias, plano de ação contendo cronograma de implementação das medidas necessárias a garantir a oferta de vagas na EJA apenas aos alunos que atendam ao perfil definido no art. 37 da Lei nº 9.394/1996 (a LDB)”. O artigo determina que a EJA é destinada para “aqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos nos ensinos fundamental e médio na idade própria.”

Durante a auditoria, a Seduc informou que do segundo semestre de 2022 para o primeiro semestre de 2023, quando foi feito o remanejamento, houve uma redução de 25.653 matrículas no ensino médio regular noturno, equivalente a 61,9%. O total passou de 41.395 para 15.742 no período. Por outro lado, houve aumento de 24.326, ou 124,3%, no número de estudantes matriculados na EJA. De 19.560, pulou para 43.886.

Consequentemente, a queda também foi vista no total de escolas ofertantes e turmas do ensino médio regular noturno e EJA (veja quadro). Consta no relatório que, após a medida da Seduc de fechar turmas do regular noturno e remanejamento dos alunos à EJA, “houve uma mudança significativa no perfil dos alunos que frequentam a EJA, além do descumprimento ao art. 35 da LDB, que dispõe que o ensino médio deve ter duração mínima de três anos, enquanto a etapa equivalente da EJA tem duração de um ano e meio.”

A pasta justifica que a medida foi tomada pela baixa frequência dos alunos no período noturno e pela alta taxa de evasão. “Também acrescentou que a alteração visou assegurar aos estudantes do ensino regular a oportunidade de concluir o ensino médio no período de 18 meses, com vistas ao ingresso na educação superior. É importante ressaltar, nesse contexto, que a EJA não tem como foco principal o aluno que busca ingressar na universidade”, pondera a auditoria do Tribunal de Contas.

Ainda conforme o relatório, docentes da EJA apontaram que o “remanejamento dos alunos gerou uma heterogeneidade significativa entre os estudantes e que, tanto o preparo das aulas como a sua execução se tornaram extremamente desafiadores, já que a nova configuração das turmas indica perfis, objetivos e níveis de conhecimento muito distintos dentro da mesma sala de aula”. A situação estaria deixando “desconfortáveis” os estudantes público-alvo da EJA, diante da “presença de alunos muito jovens”. “Por isso, ficam inseguros para participar das aulas, além de terem um ritmo de aprendizado distinto.”

Em um questionário feito com alunos da EJA presencial em sete escolas selecionadas, sendo duas em Goiânia e cinco em municípios de diferentes regiões de Goiás, que somam 860 alunos, o TCE-GO constatou que 42,4% são menores de idade, e nunca descontinuaram os estudos, “diferentemente do público alvo”. “Portanto, a decisão da Seduc de transferir alunos do ensino regular para a EJA se mostra prejudicial e inadequada para o sucesso da modalidade”, descreve o Tribunal.

O Ministério Público de Contas do Estado de Goiás (MPC-GO) também se manifestou, em parecer sobre a auditoria do TCE-GO, favorável à determinação. “A questão envolvendo a descaracterização da mencionada modalidade de educação deve ser objeto de expressa e imediata determinação no sentido de, a partir do próximo período letivo, não mais permitir a inserção de alunos que não atendam ao perfil definido em norma”, conclui o órgão ministerial.

O jornal questionou à Seduc se a determinação do TCE-GO será cumprida no prazo, de 120 dias, além do quantitativo de alunos que estão na EJA de forma indevida, e se deve haver retorno deles ao ensino regular noturno. Em nota, a pasta respondeu apenas que ainda não foi intimada oficialmente. Vale destacar que cabe recurso.

Mais uma

A determinação do TCE-GO se soma à ação civil pública movida em conjunto pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) e pela Defensoria Públcia do Estado de Goiás (DPE-GO). O DAQUI mostrou em julho passado que a ação foi protocolada no dia 18 daquele mês para cobrar o retorno dos estudantes ao ensino regular. À época, a Seduc informou que mais de 15 mil menores de idade estava m matriculados na EJA do ensino médio noturno.

Uma decisão da juíza Maria Socorro de Sousa Afonso da Silva, do 1º Juizado da Infância e da Juventude de Goiânia, de outubro passado, determinou à Seduc que os alunos que optarem pelo ensino regular deveriam ser retornados à modalidade. Além disso, de que a pasta garantiria a oferta do ensino regular noturno. Entretanto, em novembro, uma liminar do desembargador Ronnie Paes Sandre derrubou a decisão inicial. O MP-GO e a DPE-GO entraram com recurso contra a liminar e aguardam julgamento.

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