Em prestação de contas, prefeito reafirma valorizar o Legislativo, mas ouve contestações sobre valor apontado como débito do Paço
Na prestação de contas do terceiro quadrimestre (setembro a dezembro) de 2024, na Câmara Municipal de Goiânia, nesta segunda-feira (24), o prefeito Sandro Mabel (UB) voltou a acenar à harmonia com os vereadores . Em discurso de tom conciliador com a Casa, reforçou "gostar de vereador" e disse "não ter problema em ir à Câmara".
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"Eu fui parlamentar por 20 anos. Vi muitos governantes não atenderem a gente", disse Mabel aos vereadores. "Temos que valorizar o vereador, a vereadora. Se a gente não valorizar, não tem como fazer crescer. No que depender de mim como prefeito, vocês vão ter um prefeito companheiro, que vai colocar a placa de cada um nos lugares."
Em sessão de aproximadamente quatro horas de duração, vereadores questionaram Mabel sobre a real situação financeira do município , contestaram o decreto de calamidade pública na área econômica e cobraram, em tom comedido, atendimento às demandas por parte do prefeito e do secretariado. Em meio ao tensionamento da relação com o Legislativo, Mabel mencionou repetidamente o valor de R$ 3,6 bilhões como sendo o rombo deixado pela gestão do ex-prefeito Rogério Cruz (SD).
Rebatendo o prefeito ao fazer a defesa do papel fiscalizador dos vereadores, o presidente da Comissão Mista, Cabo Senna (PRD), afirmou que Mabel enviou "recados pela imprensa" recentemente dizendo que a Câmara não realizou o trabalho de fiscalização e que, por consequência, o rombo na Prefeitura foi maior do que o esperado. "Os poderes são independentes, mas harmônicos. Quero que os poderes continuem nessa harmonia", afirmou Senna.
Em resposta, Mabel disse que é "freguês" do Ministério Público de Goiás (MP-GO) e do Tribunal de Contas dos Municípios de Goiás (TCM-GO) e "não tem nada a esconder".
Ainda no início da sessão, o prefeito fez um breve balanço sobre suas ações ao longo dos três primeiros meses de gestão, citando a maior oferta de vagas em creches, as obras de drenagem, a desativação de radares e a promessa de sincronização dos semáforos.
Boa parte dos apontamentos dos vereadores, no entanto, foi direcionada a questionar a real situação financeira da Prefeitura. Os parlamentares contestaram os números apresentados pelos auxiliares de Mabel em documento com a prestação de contas entregue aos vereadores ainda na noite de domingo (23) para análise prévia.
O líder do prefeito, Igor Franco (MDB), afirmou que não há "contradição" nos números apresentados. "Teve um corte muito alto de gastos, especialmente de folha. Vejo que a situação está no rumo certo, e que as coisas vão funcionar da melhor forma possível", justificou.
Mabel afirmou durante a sessão que deixaria a equipe técnica, especialmente o secretário da Fazenda, Valdivino Oliveira, apresentar os detalhes da prestação de contas -- o que não aconteceu. A reunião foi encerrada por volta das 12h sem que Oliveira explicasse os números, mesmo com os vereadores aguardando.
Ao POPULAR , o secretário alegou que, como os parlamentares já haviam recebido o detalhamento com antecedência, essa etapa estaria suprida. No entanto, Cabo Senna (PRD) afirmou que marcará uma nova data para que Valdivino faça a apresentação formal.
Aava Santiago (PSDB) chamou a atenção para a diferença do rombo indicado pela Prefeitura, de R$ 3,6 bilhões, para o valor da dívida flutuante apontado pelo TCM-GO, de R$ 700 milhões. Mabel rebateu, afirmando que o valor corresponde a dívidas não pagas, e não a desvio.
Nos bastidores, parlamentares classificaram a sessão de prestação de contas como "pouco satisfatória" em termos de avanços e citaram que, diante da expectativa por reações mais incisivas mediante o contexto de insatisfações, surpreendeu o tom mais "sereno" da audiência.
Edward Madureira (PT) questionou a taxa do lixo, alvo de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) protocolada pelo PSDB (Leia mais nesta página). Já Fabrício Rosa (PT) sugeriu que o decreto de calamidade pública nas finanças poderia reduzir a fiscalização, dando ao Paço poder de outros modelos de contratação, em vez de licitações.
Willian Veloso (PL) afirmou que relatórios da Prefeitura, na verdade, indicam déficit de R$ 400 milhões, enquanto Coronel Urzêda (PL) defendeu uma Comissão Especial de Investigação (CEI) para apurar as discrepâncias do rombo e se posicionou contra a taxa de lixo. Vitor Hugo (PL) ressaltou os servidores que já estão tendo seus contracheques com descontos.
Tanto aos vereadores quanto em entrevista coletiva antes do início da sessão, Mabel defendeu maior austeridade fiscal como forma de equilibrar as contas do município, além de foco maior no Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) para adequar a capital às novas medidas da reforma tributária.
Questionado pelos jornalistas sobre as medidas a serem tomadas para contornar o rombo , o prefeito disse que tem "renegociado dívidas e entrado na Justiça contra débitos tributários".
Atendimento
Apesar de Mabel ter recebido elogios de parte dos vereadores da base governista, outros parlamentares que se declaram aliados reforçaram cobranças ao prefeito. Léo José (SD) expressou insatisfação com a dificuldade de acesso aos secretários e pediu maior atenção do prefeito em casos como esse.
Chamou a atenção também a ausência de integrantes da cúpula da Câmara na sessão, como o presidente Romário Policarpo (PRD), o vice-presidente Anselmo Pereira (MDB) e o primeiro secretário Henrique Alves (MDB), mesmo com o plenário cheio durante a prestação de contas. A assessoria de Policarpo informou ao POPULAR que o chefe do Legislativo teve "agendas externas" e por isso não pôde participar da sessão.
Diante das insatisfações dos parlamentares sobre nomeações demoradas e aporte milionário à Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg) sem aval da Câmara, Mabel chegou a cogitar não comparecer à prestação de contas, justificando que "não teria o que falar" sobre as contas de Cruz. Após repercussão negativa, o prefeito recuou e acabou indo à Casa.