Milhares de fiéis se reuniram ao longo dos painéis da Via Sacra na Rodovia dos Romeiros (GO-060) para acompanhar a encenação da Vida, Paixão e Morte de Jesus Cristo
A 33ª Grande Caminhada da Fé ocorrida em Trindade, na região metropolitana de Goiânia, nesta Sexta-Feira Santa (18), foi marcada por sangue, suor e lágrimas. Milhares de fiéis se reuniram ao longo dos painéis da Via Sacra na Rodovia dos Romeiros (GO-060) para acompanhar a encenação da Vida, Paixão e Morte de Jesus Cristo.
A caminhada é considerada pelos católicos uma das maiores encenações da Paixão de Cristo ao ar livre realizadas na América Latina. A via crucis (série de painéis que representam os principais momentos de Cristo antes da sua morte) é percorrida pelo Grupo Desencanto de Teatro, que envolve atores, bailarinos, músicos e técnicos na realização do espetáculo.
Com duração de cerca de 6 horas, a caminhada teve início por volta de 7 horas, no primeiro painel, que fica no perímetro de Goiânia. Sob forte calor, os espectadores procuraram sombras. Conforme a história avança, de painel em painel, aumenta o número de fiéis reunidos para assistir a encenação.
Alguns até subiram em árvores na tentativa de ter uma visão privilegiada do espetáculo. Uma imagem que lembra a passagem bíblica que fala de Zaqueu, chefe dos cobradores de impostos que, durante a caminhada de Jesus para Jerusalém, teve a ideia de subir em uma árvore para conseguir ver o Messias, como é relatado no Evangelho de Lucas.
O reitor do Santuário Basílica do Divino Pai Eterno, padre Marco Aurélio Martins, assistiu o espetáculo e fez uma oração quando a caminhada estava no quarto painel. "Muito mais do que uma apresentação de teatro, celebramos aqui um mistério da fé", disse. O prefeito de Trindade, Marden Júnior (MDB), também acompanhou a caminhada.
Os rostos encantados com a novidade se misturaram aqueles que já conhecem os ritos da caminhada. O autônomo Agnaldo José do Nascimento, de 65 anos, não perde nenhum espetáculo desde 2009. "Já tinha decidido que não viria neste ano. Porém, acordei, liguei a televisão na TV Anhanguera e estava passando (o início da caminhada). Desliguei e corri para o terminal (de ônibus) para vir. Não podia perder", relata ele, que é morador de Inhumas. Segundo Agnaldo, o que motiva a ida dele para a capital da fé de Goiás é a tradição familiar, começada pela avó e continuada pela mãe. "Venho para cá desde que tenho 10 anos."
A chegada de Jesus nos painéis seis e sete, usando uma coroa de espinhos, com sangue escorrendo pelo rosto e carregando uma cruz nas costas levaram os fiéis às lágrimas. "É muita emoção. Dá uma tristeza. Tantos sentimentos misturados", conta a aposentada Valrinete Correia, de 65 anos.
O sacrifício de enfrentar o sol quente, a multidão e horas a fio em pé não é só de quem assiste. Os participantes do espetáculo - composto por atores amadores e outros membros da comunidade - também precisam se desdobrar para fazer a encenação acontecer. Ao todo, são cerca de 500 pessoas envolvidas no processo, sendo que os ensaios da apresentação foram iniciados em janeiro deste ano.
Preparação tem início ainda pela madrugada
No dia da apresentação, os preparativos do grupo teatral começam ainda na madrugada, horas antes da encenação ter início. Nos painéis, os atores têm de lidar com um calor intenso sob os figurinos, muitos deles feitos de tecidos pesados. O deslocamento dos artistas entre uma cena e outra é feito de ônibus. Muitos fiéis conseguem acompanhar a via crucis completa de carro, parando de painel em painel. Entretanto, nos dois últimos murais, quando o ator que representa Jesus passa a carregar a cruz, o trajeto é feito a pé por todos.
O que para muitos é visto como um grande desafio, é sinônimo de prazer para o aposentado Arnor Cardoso, de 86 anos. Há 25 anos ele representa o discípulo Simão na encenação. "Participei a primeira vez e nunca mais parei. Enquanto estiver bem, vou continuar. É uma coisa boa. Um descarrego muito grande das preocupações de saber que Jesus está cuidando da gente", narra o devoto do Divino Pai Eterno.
Neste ano, cenas inéditas foram incorporadas ao roteiro do espetáculo: o apedrejamento da mulher adúltera, baseado no Evangelho de João, e o Sermão da Montanha, uma das mais conhecidas pregações sobre os valores cristãos. Trata-se de um discurso de Jesus Cristo que ensina os princípios da vida cristã, falando sobre amor e perdão, assim como a parte conhecida como as bem-aventuranças.
Fundador do Grupo Desencanto de Teatro - que existe há 38 anos - e diretor do espetáculo, Amarildo Jacinto destaca que a encenação de 2025 tem um significado especial, já que neste ano a Caminhada da Fé completa 33 anos, a mesma idade que Jesus tinha quando foi crucificado.