O Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) se prepara para pedir um acordo de não-persecução penal (ANPP) para o médico Rubens Mendonça Júnior, de 30 anos, acusado de provocar um acidente no viaduto da Avenida T-63, no Setor Bueno, em abril deste ano, causando a morte de duas pessoas e ferindo outras duas. Na ocasião, o médico chegou a atingir 148 km/h com o veículo e a planar ao alcançar a parte mais alta da estrutura viária. O processo foi suspenso por 45 dias pela Justiça para que o MP-GO elabore as condições do acordo.O ANPP é um dispositivo criado em 2019 por meio de lei federal no qual o Ministério Público propõe uma alternativa à punição convencional e oferece uma série de compromissos ao investigado, que vão da prestação de serviços comunitários, reparação do dano ou restituição à vítima ou a parentes desta. A outra parte assume a culpa pelo crime e se livra de uma eventual prisão, caso condenado, e de ter a ficha de antecedentes criminais manchada. No final de outubro, o DAQUI mostrou que esse tipo de acordo cresceu 435% em quatro anos em Goiás, sendo que em 2022 foram 5,6 mil.O processo envolvendo o médico tramitava inicialmente na 2ª Vara de Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribunal de Júri, porém, em outubro, o juiz Lourival Machado da Costa, acatou pedido do promotor de Justiça Sérgio Luís Delfim, da 92ª Promotoria de Justiça de Goiânia, e substituiu as condutas imputadas na denúncia original de homicídio doloso qualificado e lesão corporal dolosa qualificada, conforme constam no Código Penal, para homicídio culposo (quando não há intenção) e lesão corporal também culposa, crimes estes conforme previsto no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), nos artigos 302 e 303.Com isso, no dia 17 de novembro, o processo foi transferido para a 1ª Vara dos Crimes de Trânsito, Ordem Tributária e Hipervulneráveis da comarca de Goiânia. Três dias depois, o novo promotor do caso, Everaldo Sebastião de Sousa, da 28ª Promotoria da comarca de Goiânia, pediu para ser incluída a ficha de antecedentes criminais do médico e, como o levantamento deu que não havia nada contra ele, no dia 21 o promotor informou que estavam presentes os elementos necessários para um ANPP e pediu um prazo para formalizar o acordo.Em nota por meio da assessoria, Everaldo diz que o MP-GO não ofereceu nenhuma proposta de ANPP e que a manifestação feita dentro do processo “foi apenas no sentido de que o caso se enquadra nas hipóteses legais para oferecimento do acordo e que tratativas seriam conduzidas nos autos”. “Isso não significa que o ANPP será celebrado. Além disso, o MP está estudando outras medidas jurídicas cabíveis para o caso”, afirmou o promotor. No acidente, morreram o motoboy Leandro Ferreira Pires, aos 23 anos, e o garçom David Antunes Galvão, aos 21, que estava na garupa. Duas pessoas também ficaram feridas, sendo que uma precisou ficar oito dias internada.Apesar de o MP-GO ter denunciado o médico por duplo homicídio doloso qualificado, cujas penas poderiam chegar a 30 anos, no final da fase de instrução, quando são ouvidas as testemunhas em juízo, o promotor inicial do caso mudou seu entendimento.Imprudência e imperíciaAo apresentar as alegações finais, argumentou que não ficou demonstrado no processo que o motorista “tenha assumido o risco de produzir o resultado morte das vítimas”, mas, sim, que ele “conduzia seu veículo de forma imprudente e sem perícia necessária, o que contribuiu sobremaneira para a prática do acidente, e demonstrou não conhecer as peculiaridades de funcionamento” do veículo.A manicure Fabiana Fernandes dos Santos, mãe de Leandro, tenta desde outubro incluir no processo um advogado como assistente de acusação para reverter a decisão que tirou o caso da Vara de Crimes Dolosos contra a Vida. Na primeira tentativa, quando os autos ainda estavam lá, o juiz negou o pedido, dizendo que deveria ser analisado pelo futuro magistrado. No dia 22 de novembro, o advogado Rodrigo Lustosa Victor voltou a acionar a Justiça, desta vez na 1ª Vara dos Crimes de Trânsito, para ser incluído como assistente.A família discorda da decisão que mudou o entendimento sobre o crime cometido pelo médico e quer ver o caso sendo analisado por um júri popular. Para o advogado, a hipótese é de dolo eventual e não apenas de culpa, como avaliou o MP-GO.