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Apenas 17% dos municípios de Goiás possuem aterro sanitário para despejo de lixo

Diomício Gomes
Urubus e outros animais compõem paisagem do aterro controlado de Santo Antônio de Goiás: estrutura precisa ser desativada até agosto deste ano em cumprimento à lei nacional

Dos 246 municípios de Goiás, apenas 41 destinam o lixo para aterros sanitários. O número corresponde a 16,6% do total. A maior parcela, equivalente a 203, é de localidades que enviam os resíduos para aterros controlados e lixões. Os dados são da Confederação Nacional dos Municípios .

A prática deve ser extinta para municípios com população superior a 50 mil habitantes em agosto de 2023, conforme a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), de 2010. Em 2 de agosto de 2024 encerra o período para que todos os lixões e aterros controlados sejam desmobilizados no Brasil.

Além de cumprir a lei, a medida é necessária para evitar que os lixões, uma fonte de problema sobre vários aspectos, continue a existir. Estas estruturas inadequadas são um problema ambiental e social. O despejo inadequado do lixo contamina mananciais, favorece a proliferação de vetores de doenças e ainda representa uma questão social, com a busca de catadores por materiais com algum valor financeiro nestes locais.

O aterro sanitário é uma estrutura que permite a impermeabilização e tratamento dos líquidos decorrentes da decomposição. Quando se trata de aterro controlado, embora possa haver a cobertura do material disposto, não há a aplicação de critérios de engenharia e controle ambiental que para tratar o chorume e os gases emitidos.

A decomposição resulta na emissão do metano. Em um aterro sanitário, o mesmo é captado e queimado, havendo a emissão de gás carbônico. Embora este elemento químico tenha contribuição para o efeito estufa, o metano chega a ser 23 vezes mais danoso, o que vai contra os compromissos nacionais perante o Acordo de Paris, de 2015.

O avanço na questão esbarra em falta de vontade política, ausência de cobrança popular para solução e indisponibilidade de recursos financeiros que estão aquém da maioria dos pequenos municípios goianos e de outras partes do Brasil.

Santo Antônio de Goiás é um dos 21 municípios da Região Metropolitana de Goiânia. A cerca de 20 km da capital, possui, conforme estimativa do IBGE de 2021, 6,5 mil habitantes. A cidade é servida por um aterro controlado, localizado em uma das saídas, na zona rural.

O prefeito, Kleber Cosme de Freitas (PP), afirma que a localidade dispõe de serviço de coleta seletiva, com o intuito de aliviar o aterro controlado.

O gestor municipal reclama dos gastos que tem com o serviço e afirma não ter condições de implantar um aterro sanitário sem que haja verbas federais ou estaduais. “A gente gasta muito com maquinário, acho que, de fato, o aporte financeiro que a gente faz para descartar com dignidade é elevado. A gente investe na reciclagem para ter o menor descarte no aterro possível”, afirma o gestor.

O projeto local para resolver a questão atualmente é um projeto que envolve ao menos dez municípios. Eles se uniram e elaboraram um projeto para a construção de um aterro sanitário.

O desejo é que a viabilização do aterro sanitário seja possível com uma Parceria Público Privada e investimentos da Caixa Econômica Federal (CEF) e Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social.

Ainda que o projeto se materialize, os custos para os municípios darem a destinação correta aos resíduos será elevada. No consórcio há municípios mais de cem km distantes. É o caso de Santo Antônio de Goiás e São Miguel do Passa Quatro.

A solução para Santo Antônio de Goiás e municípios vizinhos já poderia ter se materializado. Em maio de 2021, havia projeto para instalar um aterro sanitário às margens da GO-462, próximo ao trevo de Brazabrantes, também na Região Metropolitana de Goiânia.

A estrutura iria receber o lixo de Nova Veneza, Brazabrantes, Santo Antônio de Goiás, Inhumas e Damolândia.

O que impediu o avanço do projeto foi a manifestação de moradores rurais e urbanos de Nova Veneza e Brazabrantes, Santo Antônio de Goiás. Residentes de ao menos nove condomínios afirmaram à época que haveria enorme impacto ambiental, social e econômico.

O projeto foi abandonado. Ele surgira em 2013 e foi desenhado por uma empresa privada contratada pelo Consórcio Intermunicipal Brasil Central, formado por 22 municípios.

Taxa

Uma das medidas para atenuar a questão financeira é a criação de taxa de coleta de resíduos, permitida por lei. No caso de Santo Antônio de Goiás, por exemplo, o prefeito afirmou ao POPULAR que enviou um projeto de lei à Câmara local, mas houve rejeição por parte dos vereadores e ele próprio desistiu de onerar os contribuintes. Em Aparecida de Goiânia há a cobrança pelo serviço municipal.

O município cobra, por ano, R$ 136,73 para os imóveis edificados e R$ 68,35 para os imóveis sem ocupação. A cobrança existe desde 2016, mas a possibilidade da taxa é de 2011.

Aparecida de Goiânia possui um aterro sanitário desde 2014, conforme a prefeitura. A estrutura está instalada no Setor Vale do Sol do município de 601,8 mil habitantes, conforme estimou o IBGE em 2021.

O custeio do serviço de coleta e tratamento adequado de resíduos sólidos pelos habitantes é uma das saídas para que o Brasil avance nesta questão, na visão do engenheiro civil especialista em Tratamento e Disposição Final de Resíduos Sólidos e Líquidos do Instituto de Pós-Graduação e Graduação (Ipog), Fabrício Ribeiro. “É um serviço público e deve ser financiado pelo próprio usuário. Isto seria por meio de tarifas, inclusive há estudos sobre implementação de legislação para esta cobrança, e isto subsidia a operação e manutenção dos aterros sanitários”, detalha.

Estrutura prejudica meio ambiente e sociedade

Dentre os problemas decorrentes da existência de lixões, o professor da Escola de Escola de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade Federal de Goiás (Eeca/UFG), Eraldo Henriques de Carvalho destaca a contaminação pela decomposição dos resíduos orgânicos como uma preocupação maior.

“O líquido oriundo da decomposição, conhecido como chorume e tecnicamente chamado de lixiviado, é altamente poluidor. Ele pode terminar contaminando solo e alcançando lençol freático e águas subterrâneas ou até, se o lixão for perto de um rio, a água pode carregar o material para mananciais”, explica. 

Os nitratos presentes no chorume podem afetar a saúde de bebês. “A água com elevadas concentrações de nitrato causa problemas, especialmente em bebês com menos de seis meses, por meio da cianose, problema de saúde que reduz a oxigenação do sangue. Isto pode correr quando, por exemplo, a mãe prepara mamadeira com água contaminada”, alerta. A doença pode levar a óbito, inclusive.

A contaminação chega ao lençol freático porque o lixão não possui impermeabilização. No caso dos aterros sanitários, estes possuem uma proteção que recolhe o chorume e este deve ser tratado antes de descartado.

Além dos resíduos orgânicos, Carvalho lembra que a presença de lâmpadas, pilhas, baterias em lixões fazem com que haja a contaminação por metais pesados como mercúrio, cádmio e chumbo. “O problema ganha dimensão se for um lixão mais volumoso, tiver lençol freático raso e houver moradores nas proximidades”, pontua ele.

O avanço da solução para os lixões na visão do professor da UFG passa por educação e informação para que as pessoas se sensibilizem para reduzir a geração de resíduos, fazer o descarte correto e cobrar o cumprimento de políticas públicas. “As pessoas precisam entender o que está por trás do descarte inadequado de resíduos”, aponta.

A instalação de aterros sanitários é cara. Como municípios pequenos dispõem, na maioria dos casos, de poucos recursos, esta é uma questão que continua a ser adiada. 

Engenheiro Civil e especialista em Tratamento e Disposição Final de Resíduos Sólidos e Líquidos, Fabrício Ribeiro afirma que os locais já explica ser importante avaliar as condições dos terrenos onde funcionaram lixões. “Eu vou analisar o solo para ver quais componentes tóxicos e patógenos estão presentes, até que ponto atingiram (o solo), se atingiram o lençol freático, verificar como estaria a pluma de contaminação naquele local”, finaliza ele.

Apesar da gestão de resíduos ser uma competência municipal conforme a lei, o Governo de Goiás afirma estar editando um decreto para que haja a “regularização da disposição temporária dos resíduos até o estabelecimento do modelo definitivo e adequado de disposição dos resíduos”. A informação é da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), repassada em nota a reportagem.

“Cabe à Semad aprofundar-se principalmente na implantação de aterros sanitários regionais, um modelo que é comprovadamente mais eficaz do que aquele em que cada município cuida sozinho dos resíduos que produz”, afirma a resposta.

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