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Lei que tira professores de apoio das salas de aula em Goiás é questionada por pais e educadores

Arquivo pessoal / Nubia Melo
Tiago teme que o filho, de 20 anos, fique à deriva em sala de aula. "O futuro deles dessa forma será a incapacidade"

Pais, educadores e advogados questionam o Projeto de Lei do governo de Goiás que tira professores de apoio das salas de aula da rede pública. A Lei nº 10882/22, que também prevê alteração da carga horária dos professores, chegou nesta segunda-feira (12) à Casa Civil. O projeto passará agora para sanção do governador Ronaldo Caiado (UB). 

Para a advogada e professora de Direitos da Pessoa com Deficiência, Tatiana Takeda, a lei proposta pelo governo tem o papel de economizar em cima dos hipervulneráveis. “O aluno com deficiência precisa ter acompanhamento em caráter pedagógico para garantir o aprendizado do aluno. A partir do momento que você coloca uma pessoa sem capacitação pedagógica dentro da sala de aula para acompanhar o aluno de inclusão está-se a negar o aprendizado”, pontua. 

Tatiana, que também tem um filho de 11 anos com autismo, conta que ele não consegue ficar na sala sem o profissional de apoio escolar em razão da sua necessidade. “Teve apoio no período em que esteve no CMEI e depois na escola privada. Não imagino como teria sido sem esse suporte. Um cuidador tem por competência higiene e alimentação e esse não é o objetivo da Educação. O Direito à Educação está no aprender”, reforça. 

A presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Educação de Goiás (Sintego) Bia de Lima, também questiona a troca de professores inclusivos por cuidadores. “É  sobre-humano para os professores trabalharem com todos os alunos, incluindo aqueles que necessitam de educação especializada. Os professores inclusivos estudaram para dar esse suporte. Tanto aos alunos, quanto os regentes sem esse suporte sairão prejudicados”, comenta. 

Quem também questiona essa troca é a professora da rede estadual Pollyana Volpato, que tem alunos autistas, com TDAH, síndrome de Down, paralisia cerebral, déficits intelectuais e TOD. Para ela, sem os professores inclusivos aconteceria uma verdadeira exclusão desses alunos. “Eles não conseguem (em sua maioria) entender os comandos dados à turma em geral, e infelizmente, o professor regente não consegue dar a atenção especial que esses alunos precisam”, diz. 

Pollyana reforça que sem o professor de apoio na sala, os professores regentes terão grandes dificuldades. “Por vários motivos, mas o primeiro e mais importante é o de entender de perto o que um aluno especial precisa. Os professores de apoio são nosso braço direito e esquerdo em uma sala de aula. Eles estão ali lidando diretamente com a dificuldade de cada aluno, elaborando atividades dentro do nosso conteúdo, mas específico para aquele aluno”, pontua. 

Com um filho autista de 20 anos estudando em um colégio da rede estadual, o empresário Tiago Machado Melo revela que o jovem foi diagnosticado aos três anos e sempre teve acompanhamento escolar. “Essa lei é uma vergonha, inconstitucional e desumana. O prejuízo é total. Imagina como essas crianças e jovens que têm deficiências intelectuais poderão almejar algo em suas vidas, se os mesmos não têm oportunidade do aprendizado e do estudo. Estão ficando à deriva, o futuro deles dessa forma será a incapacidade. Muito triste tudo isso”, lamenta. 

Trabalhando como professora da rede pública há 25 anos e com a educação inclusiva desde o início do ano, a pedagoga, pós graduada em Psicopedagogia e Educação Inclusiva, Glenda Maris Hamu de Aquino, reforça que os alunos que necessitam de acompanhamento ficarão “abandonados em um canto da sala”. Para ela, um professor de segunda fase, com 50 minutos de aula (em média) dificilmente poderá sanar dificuldades ou explanar conteúdos aos alunos com demandas específicas em uma sala com cerca de 30 alunos. 

“O professor de apoio está na sala não só como apoio, mas como verdadeiro professor. Ministra aulas e aplica atividades que ele mesmo adapta. Eu, conhecendo o “aluno especial”, na sua especificidade, pude fazer e elaborar todas as atividades e provas adaptadas de acordo com a realidade desse aluno. Não acredito em uma educação de qualidade para os alunos com necessidades especiais, como estão querendo. Será um verdadeiro retrocesso à tão esperada inclusão! Os alunos estarão inclusos na sala, mas não no ensino de qualidade”, reforça. 

O que diz a Seduc 
De acordo com o gerente de Educação Especial do Estado, Weberson de Oliveira Morais, a nova lei vem para regularizar o profissional de apoio escolar. “Estamos apenas regularizando o cargo, já que muitos professores foram “desviados” da sua função para ocupar o cargo de professor inclusivo. Continuaremos ofertando o mesmo serviço de apoio”, explica. 

Weberson pontua ainda que o profissional de apoio precisa ter nível superior e, preferencialmente, no curso de pedagogia. “Mas caso o município não tenha profissionais o suficiente, serão abertas vagas para licenciatura e posteriormente outras áreas de linguagem e humanas”, diz. 

Segundo o gerente, atualmente o Estado atende 19.440 estudantes que precisam de acompanhamento e conta com mais de 5 mil profissionais de apoio. “Destes, temos a estimativa que 500 voltem para a sala de aula como professores regentes”, frisa Weberson, acrescentando que o Governo deve realizar um processo seletivo para a contratação dos novos profissionais de apoio, mas ainda sem previsão. 

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