Comerciantes temem perder clientes com mudanças no trânsito
Projeto da prefeitura que começa a ser implantado nesta segunda-feira (10) proíbe estacionamento em 10 avenidas de maior circulação para dar maior fluidez aos veículos
Gabriella Braga
10 de fevereiro de 2025 às 07:22
Modificado em 10/02/2025, 07:22

Mudanças na Avenida Anhanguera ainda não têm prazo para começar (Gabriela Braga)
Comerciantes que atuam nas avenidas Castelo Branco e Anhanguera, duas das dez que serão impactadas com intervenções no trânsito dentro da primeira fase do Programa de Desobstrução de Vias Arteriais, da prefeitura de Goiânia, reclamam da proposta de proibir estacionamento de veículos para criação de uma terceira faixa de circulação. A Castelo Branco começa a passar por mudanças já nesta segunda-feira (10). Para os entrevistados, o medo é que haja redução ainda maior no fluxo de clientes nas lojas de rua.
O programa que pretende alcançar 100 km de vias arteriais nos 100 primeiros dias da gestão de Sandro Mabel (UB) foi lançado logo no início do mandato e faz parte do Novo Plano de Mobilidade da capital, que teve as ações divulgadas nesta sexta-feira (7). Na data, foram apresentados os 10 primeiros corredores que irão receber as primeiras ações para liberação do tráfego com a abertura de terceira pista para implementação de faixa preferencial para ônibus e motocicletas.
Leia Também
Dentre as medidas anunciadas, está a retirada de caçambas, tachões e pontos de táxis, dentre outros obstáculos, e a sincronização da sinalização semafórica. Conforme a reportagem mostrou no fim de semana, a partir desta segunda-feira a Secretaria Municipal de Engenharia de Trânsito (SET) inicia as primeiras ações em dois corredores: Castelo Branco/Mutirão e Jamel Cecílio/136. Em ambos, será feita a instalação de placas de proibido estacionar, além de campanha educativa e outras medidas pontuais.
Para o vendedor de uma empresa de telas metálicas situada na Castelo Branco, David Beniz, de 42 anos, a proposta irá refletir na perda de clientes na via que forma o corredor com a Avenida Mutirão. "O cliente que vem aqui na loja fazer compra, orçamento, e que não pode estacionar aqui na frente vai para onde? O comércio já não está bom. Estacionamento dia de semana lota isso aqui. E é geral, porque aqui (nas ruas adjacentes) é tudo galpão. Na frente é a entrada do comércio e atrás o pessoal abastece, então está cheio de caminhão lá atrás. Aí o pessoal procura outros lugares para fazer a compra."
Ele lamenta contudo que em muitas ocasiões o próprio pessoal de alguns comércios deixam o veículo estacionado em frente às lojas. "Não está nem aí, entra oito horas da manhã e sai às seis da tarde. E eu trabalho aqui sozinho e às vezes tem cliente que para o veículo a 200 metros de distância, como vou sair daqui para ajudar a levar para o carro dele? Um rolo desse (de tela) tem 70 quilos, é pesado. Agora o cliente não vai poder nem chegar no comércio, como vai vender?", questiona.
Sócio de uma loja de materiais de jardinagem na via, Paulo Soares, de 45 anos, também crê que a proibição do estacionamento irá prejudicar o comércio na Avenida Castelo Branco. "Se proibir acabou, pode fechar tudo. Cliente já reclama que não está tendo estacionamento, e se fizer isso quebra todo mundo. O movimento já está muito ruim, e todo ano cai mais. E se não tiver local para estacionar, o cliente não vem mais. (Lá na Avenida 85), por exemplo, acabou tudo o comércio. Aqui também está fechando muitos. Carro tem demais, gente tem de menos."
A opinião é compartilhada ainda pelos comerciantes que estão no trecho da Avenida Anhanguera situado no Setor Central. Proprietária de uma loja de artigos de beleza, Márcia Rocha, de 50 anos, voltou há dois anos ao ponto na via que administrou por mais de uma década por acreditar na revitalização do Centro da capital. Contudo, agora, teme às mudanças que devem ocorrer dentro do programa. "Querendo ou não todo mundo que vem de carro quer estacionar próximo. Aí chega na Avenida Anhanguera para comprar na minha loja e não tem, vai embora para um lugar de melhor acesso. Ou às vezes só quer parar em uma lojinha para comprar algo rápido", pontua.
O gerente de uma loja de cosméticos, William dos Santos, 49 anos, também crê que a proibição possa prejudicar o movimento no comércio. "Quanto maior a distância a pessoa estaciona, pior fica para o comércio. Se parar para ver aqui no Centro já está caindo muito o comércio, alguns anos atrás não achava ponto fechado, hoje tem várias lojas fechadas, placas de aluguel. Então se fizer isso, na minha opinião, vai cair mais ainda. Morei numa cidade no Paraná e fizeram isso, lá caiu muito o movimento", cita.
Por outro lado, o optometrista de uma ótica na avenida, Leandro Fleury, de 56 anos, vê a medida com bons olhos. Ele considera que a maior parte das vagas em frente às lojas -- que fazem parte da Área Azul -- são ocupadas por vendedores ambulantes, além dos próprios lojistas. "O cliente que está vindo ao Centro muitas das vezes não acha vaga por causa disso. Muitas vezes o carro é dos vendedores que não levam em consideração que isso é prejudicial para eles, mas a maioria são de camelôs vendendo com araras ou caixas nas calçadas. Então é positivo porque vai tirar aquele carro que está parado o dia todo", conta, ao relatar que a Área Azul não tem funcionado no local.
Estudo
Engenheiro de transporte e professor de Engenharia de Trânsito do Instituto Federal de Goiás (IFG), Marcos Rothen pondera que é preciso realizar mais estudos para colocar em prática as intervenções. "O que está fazendo não é simples, é um transtorno para todo mundo, e até o comércio se adaptar a isso. São muitas avenidas, tem que ver o impacto disso para os outros usuários. A ideia pode ser boa em alguns lugares, mas ela tem que ser bem estudada, não é só fazer se não daqui a pouco gente vai sair andando pela cidade e passeando sem poder parar o veículo em lugar nenhum."
Conforme o especialista, também faltou diálogo com quem reside ou trabalha nestes endereços. "Tem coisas que tem que conversar com as pessoas, às vezes mostrar pro comerciante que ele próprio está atrapalhando ao estacionar o carro na porta da loja. Então tem que estudar com uma equipe de engenheiros especializados que conheçam do assunto para poder ter uma medida permanente, senão depois faz e tem que voltar atrás. Eu por exemplo só vou em lugar que eu possa estacionar próximo. E a cidade é para as pessoas também, não é só pra carro andar", complementa.

Na Avenida Castelo Branco, prefeitura começa nesta segunda-feira a efetivar mudanças no trânsito (Gabriela Braga)