Goiânia estuda reduzir total de maternidades públicas
Prefeitura quer otimizar rede de atendimento, mas encontra dificuldade em definir qual das três unidades em funcionamento seria fechada ou teria o perfil transformado
Mariana Carneiro
10 de fevereiro de 2025 às 07:03

HMMCC é a unidade de maior custo e conta com mais da metade do espaço físico em ociosidade (Wesley Costa / O Popular)
A Prefeitura de Goiânia avalia a possibilidade de reduzir o número de maternidades na capital. O intuito é otimizar a rede de atendimento. Na última semana, ficou acordado que o contrato entre a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) e a Fundação de Apoio ao Hospital das Clínicas (Fundahc) irá diminuir de R$ 20,5 milhões para R$ 12,3 milhões por mês, uma redução de 40%. Mesmo assim, nos bastidores, o fechamento ou a mudança de perfil de uma das três unidades existentes ainda é ventilado, sem definição clara de qual maternidade seria afetada.
A reportagem conversou com profissionais que acompanham o cenário do atendimento materno-infantil na capital e a avaliação da maioria, inclusive técnicos da SMS, é de que a capital consegue operar com apenas duas das três maternidades em funcionamento. O Hospital Municipal da Mulher e Maternidade Célia Câmara (HMMCC) é a maior das três unidades e também a que mais custa para os cofres públicos. Atualmente, o repasse é de R$ 10 milhões para o funcionamento do local, mas o valor cairá para R$ 4,1 milhões por mês com o novo contrato.
Parte do custeio da Célia Câmara vem do governo federal. Uma portaria do final de abril de 2024 estabeleceu o repasse de R$ 77,8 milhões por ano - R$6,4 milhões/mês - para a Célia Câmara por parte do Ministério da Saúde. O montante chega via financiamento da Média e Alta Complexidade (MAC).
O recurso foi conquistado sob a gestão do ex-secretário municipal de Saúde, Wilson Pollara, que se envolveu em uma série de escândalos no segundo semestre de 2024 e chegou a ficar preso por um período. Em julho passado, a ministra da Saúde, Nísia Trindade, esteve na Célia Câmara para inaugurá-la após uma obra que contou com cerca de R$ 40 milhões em investimentos do governo federal. Ela estava acompanhada do ex-prefeito de Goiânia, Rogério Cruz (SD).
A reportagem apurou que no contexto da crise financeira vivida pela SMS, a pasta não pretende fechar a Célia Câmara justamente por ela ser uma unidade de saúde que recebe um volume considerável de recursos do governo federal. Entretanto, a possibilidade de mudança do perfil do local é ventilada. Em entrevista concedida a reportagem e a CBN Goiânia na última quinta-feira (8), membros da Fundahc comentaram sobre o assunto. "Tem estrutura física para ser não só um hospital da mulher e maternidade, mas um hospital geral. Cirurgia geral, neurologia, ortopedia (...) Lá tem uma estrutura física grande, mas habilitada e equipada, falta" disse Rogério de Paula, assessor corporativo da Fundahc. Conforme apurado pela reportagem, atualmente, mais da metade da estrutura física da maternidade não é utilizada.
Assim como a Célia Câmara, o Hospital e Maternidade Dona Iris (HDMI) é responsável por cuidar de partos de alto risco e acompanhar casos mais complexos. Ela é a segunda com o maior custo para a administração municipal e a que receberá o menor corte no valor repassado. O montante diminuirá de R$ 7,6 milhões para R$ 6,2 milhões por mês. Pelo fato de a unidade receber alto fluxo de pacientes e estar em uma localização estratégica - a Dona Iris fica na Vila Redenção, região mais central do que a Célia Câmara, que fica no Conjunto Vera Cruz -, a avaliação é que ela corre menos risco de mudanças.
Já a Maternidade Nascer Cidadão (MNC) é a que custa mais barato para a SMS. Atualmente, são R$ 2,9 milhões por mês, valor que cairá para R$ 1,9 milhão. O fechamento do local não envolveria imbróglios como, por exemplo, a diminuição do número de unidades de terapia intensiva (UTIs) neonatais da rede municipal, já que a unidade fica responsável por realizar partos de complexidade mais baixa. Entretanto, mudanças na Nascer Cidadão têm o potencial de gerar desgaste para a administração municipal, já que a unidade possui um valor simbólico para os moradores da região Noroeste. Com 24 anos de existência, a construção da unidade e a operação da unidade envolveram diretamente as demandas e a força de trabalho dos moradores do Jardim Curitiba, onde está localizada.
Com todos os prós e contras de promover mudanças nas maternidades ainda em avaliação, a SMS já conseguiu bater o martelo sobre a necessidade de reduzir o custo do serviço. Para conseguir reduzir o valor do contrato em 40%, o corte ocorreu, principalmente, nas atividades das maternidades Dona Iris e Célia Câmara. Nos dois locais, a urgência seguirá em funcionamento, mas os atendimentos eletivos, inclusive as cirurgias, serão suspensos. O cenário não é muito diferente do que já é encontrado atualmente nas duas unidades, já que desde o final de agosto de 2024 as maternidades passaram a oferecer apenas atendimentos de urgência e emergência por conta do débito acumulado por parte da SMS. Hoje, a dívida gira em torno de R$ 200 milhões.
O desejo da SMS de chegar a esse valor já havia sido adiantado pelo POPULAR em reportagem publicada na edição de 7 de janeiro. O novo plano de trabalho foi enviado pela Fundahc para a SMS e depende ainda da aprovação pelo Conselho Municipal de Saúde (CMS) para a assinatura do novo contrato. A expectativa da fundação é de que todo o trâmite seja finalizado até o final deste mês.
Reportagem publicada na edição deste sábado (8) mostrou que dez leitos intensivos para adultos do Célia Câmara serão desbloqueados para a regulação municipal com a assinatura do novo contrato entre a SMS e a Fundahc. Ao todo, são 20 leitos do tipo na unidade. Mas desde que a Prefeitura de Goiânia passou a acumular dívidas com a fundação, eles ficaram restritos às mulheres pacientes da própria unidade. Agora, metade será liberada.
Pediatras pararam neste domingo
Os pediatras que atendem no Hospital Municipal da Mulher e Maternidade Célia Câmara (HMMCC) paralisaram as atividades durante a tarde deste domingo (9). Os atendimento foram retomados às 19 horas do mesmo dia. O motivo da paralisação foram pagamentos atrasados por parte da Fundação de Apoio ao Hospital das Clínicas (Fundahc) para com a empresa Instituto dos Médicos Intensivistas do Estado de Goiás (Intensipeg), responsável por fornecer médicos especializados em pediatria.
A reportagem esteve no local no início da tarde deste domingo e não havia movimentação de gestantes e puérperas procurando por atendimento. Um aviso colocado na porta da entrada de urgência dizia que a unidade estava fechada para novas internações e que os casos de urgência e emergência, além das pacientes em trabalho de parto, deveriam procurar outras unidades de saúde.
A Fundahc está em atraso com a Intensipeg há pelo menos desde o final de 2024. O cenário é fruto da dívida que a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) acumula com a fundação e impede que os pagamentos aos prestadores de serviço das maternidades sejam realizados integralmente.
Em nota, a Fundahc informou que houve tentativa prévia de negociação, sem sucesso, e após reunião entre a fundação e a prestadora de serviço realizada neste domingo, ficou acordado o pagamento imediato dos valores devidos referentes ao mês de novembro de 2024 e, nos próximos dias, de dezembro passado.
A fundação também comunicou que além de médicos, a unidade de terapia intensiva (UTI) neonatal tem atuação de enfermeiros, técnicos de enfermagem e equipe multiprofissional composta por fisioterapeutas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, psicólogos e outros, "garantindo o cuidado integral aos pacientes internados e o apoio aos seus familiares."
A Fundahc destacou que "ambas entidades estão atuando para garantir a manutenção do cuidado de excelência" aos bebês nascidos na maternidade e aos pacientes internados nas UTIs e unidades de cuidados intermediários (Ucins).