GABRIELLA BRAGAGoiás registrou média diária de nove casos de estupros de mulheres crianças, adolescentes e adultas no primeiro semestre de 2023. Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) mostram que houve aumento de 11,7% no comparativo dos seis primeiros meses deste ano com o mesmo período de 2022, passando de 1,4 mil ocorrências, para 1,6 mil. Para especialistas, conscientização das vítimas explica aumento, mas ainda há subnotificação de casos.A legislação tipifica como estupro qualquer ato, praticado contra maiores de 14 anos, que use violência ou grave ameaça para ter conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso. O estupro de vulnerável, por sua vez, é cometido contra menores de 14 anos, independente de consentimento, ou com pessoas com enfermidade ou deficiência mental, que não podem oferecer resistência.Conforme o relatório Violência contra meninas e mulheres no 1º semestre de 2023, do FBSP, crimes contra crianças, adolescentes ou incapazes representam 74,5% dos casos registrados no País. A maior parte das vítimas são crianças.A subnotificação, no entanto, ainda impede a identificação mais precisa do cenário dos crimes sexuais contra mulheres, crianças e adolescentes, além de outros grupos vulneráveis. Conforme a mestre em Sociologia pela Universidade Federal de Goiás (UFG), Jully Anne Ribeiro, com o maior acesso à informação por parte das vítimas, mais denúncias passam a ser feitas.“Ao passo que mais políticas públicas garantidoras do acesso aos direitos e para empoderar meninas e mulheres, bem como mecanismos de acolhimento, a tendência é que as vítimas consigam criar a coragem necessária e realizar as denúncias. Todavia, ainda haverá casos não notificados e subnotificados. Isso porque além das políticas públicas de segurança desenvolvidas serem reativas, elas não conseguem alcançar todos os lugares”, pontua ela, que pesquisa sobre relações de gênero.Um exemplo é a falta de Delegacias Especializadas em Atendimento à Mulher (Deam) em municípios pequenos. Nestes casos, a vítima acaba por procurar um distrito policial, que atende todos os casos. E a falta de especialização dos agentes para fazer o atendimento pode desencorajar a denunciante.“Mulheres ainda sofrem constrangimentos ao denunciar, temem serem descredibilizadas caso a denúncia não ocorra no mesmo dia em que sofreram a violência. (...) Pode haver dificuldades até mesmo de acessar os meios para fazer o telefonema”, aponta Jully Anne.A conselheira federal da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Goiás (OAB-GO), Ariana Garcia, reforça que o aumento de crimes sexuais registrados está relacionado a maior conscientização das vítimas sobre seus direitos e sobre o que fazer em caso de abusos.“Às vezes a mulher demorava muito para processar as coisas e passava a fazer essas denúncias muito tempo depois. Com as campanhas, amadurecimento das mulheres a respeito dos seus direitos, a conscientização acaba vindo. Então é natural que de um período para o outro, a gente consiga ver mais mulheres denunciando”, explica ela.Ela acrescenta que a demora de denunciar o crime à polícia não é indicado. “A primeira coisa que uma vítima precisa fazer é registrar o boletim de ocorrência. Temos muita dificuldade, pois a vítima está tão constrangida e chocada que às vezes não faz na hora, e aí as evidências ficam mais frágeis.”Além da vulnerabilidade da vítima após o crime, e o receio de buscar ajuda, Ariana acrescenta que há situações de intimidação do próprio agressor. “Principalmente se ela sabe que ele pode voltar ou se é uma pessoa próxima do seu convívio familiar. O medo de represália, de acontecer de novo, tudo isso gera a subnotificação.”Maioria em altaEm todo o Brasil, apenas sete estados registraram queda nos registros de estupro e estupro de vulnerável no primeiro semestre de 2023 ante igual período do ano anterior. Em âmbito nacional, o crescimento foi de 14,9%. No ano passado, 29,5 mil casos foram registrados. Neste ano, as ocorrências subiram para 34 mil.Neste sentido, Goiás manteve uma taxa de acréscimo inferior ao visto no País. Os maiores aumentos foram registrados em Santa Catarina (103,9%), Rio Grande do Norte (57%) e Rondônia (54,4%). As maiores reduções, por outro lado, ocorreram no Mato Grosso (25%), Acre (20,3%) e Roraima (17,9%).