Sem alarde, deputados aprovam 'jabuti' que cria gratificação de R$ 11,5 mil
Embora aponte restrições para acesso ao bônus, soma dos cargos com direito ao adicional chega a 74 postos, mais que suficiente para atender os 41 parlamentares

Rubens Salomão
23 de dezembro de 2024 às 11:03

Coronel Adailton (SD) e Bruno Peixoto (UB): emenda aprovada sem alarde (Carlos Costa)
Em meio ao amplo pacote de projetos de parlamentares aprovados na última semana de trabalhos em 2024 e sem qualquer discussão, a Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) aprovou, por unanimidade, a criação de uma gratificação para os próprios deputados estaduais. A mudança já está em vigor e aplica aumento de um terço sobre o subsídio base dos parlamentares que ocupam cinco tipos de cargos de liderança e direção na composição interna da Casa.
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A gratificação representa, na prática, R$ 11,5 mil livres de descontos aos deputados, que contam atualmente com vencimento bruto de R$ 34,7 mil, referente a 75% do salário de deputados federais. A medida, tratada oficialmente como "auxílio-representação", foi fruto de emenda jabuti incluída em projeto de resolução da Mesa Diretora, que alterava o regimento interno.
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A matéria original, apresentada em 26 de novembro, só teve tramitação efetiva na terça-feira (17). No mesmo dia e em prazo de pouco menos de duas horas, o projeto recebeu três emendas e foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), além das duas votações plenárias, por meio de sessões extraordinárias.
O texto inicial alterou apenas o funcionamento das Comissões Permanentes e acrescentou a competência de "estudar qualquer assunto compreendido no respectivo campo temático ou área de atividade, podendo promover, em seu âmbito, conferências, exposições, palestras ou seminários". A nova gratificação, no entanto, foi alvo de emenda incluída pelo relator na CCJ, deputado Coronel Adailton (SD).
O texto articulado pelo militar criou novos artigos na Resolução nº 1.218 para aplicar a nova gratificação sobre os vencimentos dos deputados e não tem qualquer relação com o trabalho das comissões. "Fica concedido aos deputados, a título de indenização, auxílio-representação correspondente a um terço do subsídio mensal", define o texto aprovado em definitivo pelos deputados, por 21 votos favoráveis e nenhum contrário na última votação em plenário.
A matéria aponta que apenas deputados que ocupam determinados cargos poderão ter acesso ao aumento. Pela configuração atual, são eles: os 10 membros da Mesa Diretora; os 15 líderes de bancadas partidárias e do governo; 27 coordenadores de frentes parlamentares ativas; 21 presidentes das comissões permanentes e a Procuradora Especial da Mulher.
Apesar da aparente restrição, a soma dos cargos com direito ao adicional mensal chega a 74 postos, número mais que suficiente para atender todos os 41 deputados. Para garantir a provável abrangência geral do bônus, os deputados aprovaram no último dia de votações novo projeto de resolução que altera o regimento interno para flexibilizar a ocupação das funções de coordenação de frentes parlamentares.
Até antes da mudança, o autor do pedido para criação da frente deveria ser, obrigatoriamente, o coordenador do colegiado. A proposta de autoria do presidente da Casa, Bruno Peixoto (UB), retirou a definição e contou também com aprovação unânime em plenário. "A alteração para excluir a previsão de que o autor da proposta de criação da frente parlamentar seja, necessariamente, seu coordenador", apontou o texto. A liberação abre caminho para a mudança negociada de nomes no comando das frentes parlamentares, que representam a maior fatia dos cargos agora gratificados, para potencialmente atender à totalidade dos deputados.
O texto ainda estabelece que o "auxílio representação é calculado sobre o subsídio mensal, excluindo-se quaisquer verbas de outras naturezas". O valor é "inacumulável na hipótese do exercício concomitante de mais de um dos cargos previstos".
Segundo apurado pela reportagem, a ideia do aumento, sugerida por Coronel Adailton em reunião com os colegas na sala da presidência, surgiu de conversas com parlamentares de outros estados, por meio de contatos na União Nacional dos Legisladores e Legislativos Estaduais (UNALE). A emenda jabuti, inclusive, repete termos e artigos de resolução adotada na Assembleia Legislativa do Tocantins. Por lá, no entanto, a gratificação é de 50% sobre os salários.
Coronel Adailton foi procurado, mas não apresentou resposta sobre a nova gratificação.
Impacto
O projeto aprovado apontava, ainda na emenda incluída na CCJ, impacto anual de R$ 6,3 milhões. O presidente, Bruno Peixoto, apontou que a articulação e aprovação do aumento ocorreu por iniciativa e articulação da maioria dos deputados e que o pagamento dependerá da disponibilidade financeira do Legislativo. "Nós temos recurso em caixa, mas há hoje a limitação do teto de gastos, imposto pelo Regime de Recuperação Fiscal (RRF). Nós tratamos sobre isso e está no texto que foi aprovado. Se houver a sanção do Propag, a situação fica mais favorável", afirma o presidente.
Ao prever os impactos financeiros, a emenda de Adailton apresenta tabela com a informação de que a Alego tem saldo disponível no teto de gastos de R$ 79 milhões, por conta de "ressalva no Plano de Recuperação Fiscal de Goiás". Assim, calcula a emenda, o saldo restante ainda ficaria em R$ 72,6 milhões em 2025, mesmo com o pagamento da gratificação a todos os parlamentares no próximo ano.
Bruno Peixoto diz que vai exigir comprovação de execução dos trabalhos pelos deputados para efetivar o pagamento adicional. "Cada deputado nos cargos indicados pelo projeto têm de apresentar relatório de produtividade", disse.

Emenda também cria postos de assessoria e secretaria
Além da criação de gratificação de R$ 11,5 mil mensais para si próprios, os deputados estaduais também incluíram a criação de novos cargos e a alteração de gastos cobertos com a cota parlamentar no projeto de resolução que altera o regimento interno da Assembleia Legislativa de Goiás (Alego). A emenda jabuti, incluída no texto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), cria a Secretaria de Assuntos Internacionais e a Assessoria Adjunta de Apoio ao Cidadão.
O cargo de secretário tem salário mensal de R$ 17.617,80, enquanto a assessoria tem remuneração de R$ 10.322,80. Pela previsão do próprio projeto, que já está em vigor, o impacto anual dos dois novos postos será de R$ 448 mil. Os novos artigos adicionados à resolução interna da Alego apontam que a secretaria criada servirá para "auxiliar na recepção e conferências com a presença de autoridades, delegações e personalidades estrangeiras".
Além de assessorar os deputados em viagens internacionais e analisar as solicitações de viagens e missões feitas pelos parlamentares. A Alego já tem uma Comissão de Relações Internacionais.
Já a nova assessoria deve "atuar no posto de atendimento do Sistema Nacional de Emprego - SINE" e sugerir parcerias com entidades, sindicatos e empresas para "captar vagas de emprego".
Também terá a função de produzir materiais de divulgação sobre vagas e cursos para a programação da TV Assembleia, além de participar de eventos e realizar atendimentos individuais a possíveis candidatos para postos de trabalho.
A emenda apresentada por Coronel Adailton (SD) ainda retira dos gastos cobertos pela cota parlamentar contas de franquia de seguros de carros dos deputados.
A resolução, no entanto, ainda prevê a compensação de gastos com "manutenções de veículos, revisões de garantia, revisões gerais, multas, seguros, pedágios, reparos, trocas de pneus, aquisição de peças, lavagem e estacionamento".
O novo texto aponta que as franquias deverão ser bancadas diretamente pela Alego e, "quando não suportadas", poderão voltar a ser incluídas na cota.
A "Cota para o Exercício da Atividade parlamentar", comumente chamada de verba indenizatória, é recurso disponível a cada gabinete para despesas relacionadas ao mandato, como transporte, alimentação, hospedagem, material de escritório e comunicação, entre outros.
O valor de até R$ 30 mil para deputados estaduais representa 75% da verba disponível para deputados federais goianos, que é de R$ 41,3 mil por mês.