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Música em 2022 teve mortes de Gal, Elza e Erasmo Carlos, política e volta dos festivais

Poderia ser apenas uma lista com alguns dos nomes mais importantes da história da música brasileira, mas é também um registro daqueles que nos deixaram ao longo do ano

Folhapress

Modificado em 20/09/2024, 05:35

Foi um ano de encontros e despedidas

Foi um ano de encontros e despedidas (Reprodução)

Gal Costa, Elza Soares, Erasmo Carlos. Poderia ser apenas uma lista com alguns dos nomes mais importantes da história da música brasileira, mas é também um registro daqueles que nos deixaram ao longo do ano que passou --da cantora do milênio, em janeiro, ao gigante gentil, no mês passado, passando pela voz da tropicália, também em novembro.

Foi um ano de encontros e despedidas, como cantou Milton Nascimento para um Mineirão lotado em Belo Horizonte. Bituca foi outro que deu seu adeus em 2022 -no caso, se despedindo dos palcos, com uma turnê que rodou o Brasil, passou por Europa e Estados Unidos e chegou ao fim onde tudo começou, no estádio mais emblemático de Minas Gerais.

É difícil imaginar não só como seria a música brasileira, não fosse a existência desses nomes, mas o próprio Brasil. Gal inventou um país com seu canto, a expressão mais visceral do tropicalismo; Elza reinou no samba e transcendeu a coroa para se tornar um símbolo das nossas cores; Erasmo versou o romantismo e fez o rock ter sentido por aqui; e Bituca transformou em melodia as montanhas, a letargia e a candura das regiões centrais.

Quem partiu cheia de planos, ainda que para voltar quando quer, foi Anitta. Isso porque o ano que passa marcou a internacionalização da cantora, que primeiro figurou no topo do ranking global do Spotify com a música "Envolver", e depois firmou seu nome com o álbum "Versions of Me".

Anitta cantou no programa de Jimmy Kimmel, fez shows memoráveis no Coachella, nos Estados Unidos, e no Rock in Rio de Lisboa, além de abocanhar prêmios internacionais e beliscar uma indicação ao Grammy como artista revelação. Se seu EP recém-lançado -todo em português e mirando o público brasileiro- não foi exatamente um hit, a estrela pop também nunca foi tão conhecida acima da linha do Equador.

Na seara dos encontros, o ano foi marcado pela volta maciça dos eventos musicais. Se até 2021 a aglomeração era apenas sinônimo de saudade, este foi o ano em que ela voltou a fazer parte da vida dos brasileiros. Após sucessivos adiamentos, os festivais retomaram a agenda e saciaram de vez quem estava exausto de lives pandêmicas.

Em novembro, aconteceu a primeira edição nacional do espanhol Primavera Sound, que trouxe ao país uma escalação alternativa, numa dinâmica que prioriza os palcos e a música em vez de atrações como os stands de marcas e rodas-gigantes --constantes nesse tipo de megafestival.

Uma tônica comum entre o Primavera e os já consolidados Rock in Rio e Lollapalooza foi o clima de tensão política da eleição presidencial. Artistas levaram o tema aos palcos e plateias reagiram com coros a favor e contra candidatos, com preferência quase unânime dessa classe artística e dos fãs desses eventos ao eleito Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores.

O show de Pabllo Vittar no Lollapalooza, por exemplo, chegou a virar alvo do presidente Jair Bolsonaro, do Partido Liberal, legenda que acionou o Tribunal Superior Eleitoral contra o festival. A acusação era de que a cantora teria feito propaganda eleitoral irregular quando ela pegou uma toalha com o rosto de Lula em sua performance, além de fazer o "L" com as mãos.

O tribunal acabou acatando parcialmente esse pedido e determinou o pagamento de uma multa caso outros músicos se manifestassem. O resultado é que a decisão foi lida como censura pelos artistas, que só intensificaram os protestos ao longo do festival.

Mas não foi só nos shows que os artistas se posicionaram em relação à eleição. Enquanto Anitta embarcou numa campanha online pró-Lula, Gusttavo Lima e outros astros do sertanejo foram até o Palácio da Alvorada apoiar Bolsonaro.

A atmosfera eleitoral também foi parar no streaming. Juliano Maderada alcançou a almejada lista de músicas mais ouvidas do Spotify com "Tá na Hora do Jair Já Ir Embora", música que debocha do presidente derrotado no pleito e dominou os gogós dos apoiadores do eleito.

A divisão política também ficou marcada após uma fala do cantor Zé Neto, da dupla com Cristiano, que criticou uma tatuagem íntima de Anitta e disse que não precisava de dinheiro público da Lei Rouanet. Após o discurso do artista, diversos cantores sertanejos viraram alvo de investigações espalhadas pelo Brasil pelo recebimento de cachês de centenas de milhares de reais, pagos com dinheiro público, para shows em cidades com poucos milhares de habitantes.

Gusttavo Lima foi o maior atingido pelas investigações e teve shows pagos por prefeituras cancelados ao longo do ano. O conjunto das investigações, feitas separadamente pelo Ministério Público de vários estados, foi chamado de "CPI do sertanejo" nas redes sociais, ainda que uma Comissão Parlamentar de Inquérito jamais tenha sido aberta.

No lado musical, o sertanejo apresentou uma nova vertente, o agronejo, com uma estética que mistura batidas de funk e música eletrônica com letras sobre a vida rural e a exaltação do agronegócio. O hit "Pipoco", de Ana Castela e DJ Chris no Beat, foi uma constante nas listas de mais tocadas ao longo do ano.

Mas quem se sagrou como a artista mais ouvida do ano no Brasil, no Spotify, foi Marília Mendonça, morta no ano passado, e que teve dois EPs póstumos, com destaque para seu lado brega, recém-lançados. Em nível global, o porto-riquenho Bad Bunny figurou pelo terceiro ano seguido como o mais escutado, após lançar o celebrado álbum "Un Verano Sin Ti".

O sucesso perene do reggaetonero, que faz pontes com o trap e a música pop, ratifica que a tão falada "onda latina" está mais para tsunami do que marola. Quem também surfa no movimento é a espanhola Rosalía, que usa, expande e experimenta a partir da influência latina em "Motomami", disco que a trouxe para um elogiado show em São Paulo e a alçou a um novo patamar de reconhecimento ao redor do mundo.

Este também foi o ano de passar lápis de olho preto e reviver o emo. Avril Lavigne, por exemplo, voltou a lançar um álbum nessa estética e fez shows concorridos no Brasil, que também recebeu, no Rock in Rio, uma apresentação efusiva do Green Day.

Além disso, o Blink-182 anunciou o retorno de sua formação original, com a qual fará seu aguardado primeiro show no Brasil, no Lollapalooza do ano que vem. O Paramore encerrou seu hiato e também anunciou sua vinda o país em 2023, enquanto uma nova geração de artistas se inspira no pop punk.

Outras estéticas dos anos 2000 também invadiram as caixas de som. Um dos maiores deste fim de ano, "Tubarão, Te Amo", é prova disso. A música figurou entre as mais ouvidas até nos Estados Unidos com um sample de "Tesouro do Pirata", do Tchakabum, hit de duas décadas atrás, embalando as dancinhas no TikTok.

Foi assim também com "Desenrola Bate Joga de Ladinho", em que o trapper L7nnon resgata os passinhos dos Hawaianos, outro ícone da primeira década do século. A faixa foi febre no país e, junto a outras dancinhas, chegou até a seleção brasileira, que bailou ao comemorar seus gols na Copa do Mundo.

No Qatar, a música voltou a ditar o ritmo do futebol brasileiro, ainda que o time nacional tenha sido eliminado, amargando uma derrota frustrante para a Croácia. De certa forma, como canta Milton Nascimento, a hora do encontro é também despedida.

Geral

Covid 5 anos: sequelas da pandemia seguem vivas

Em 26 de março de 2020, morria a primeira vítima do coronavírus em Goiás. Viúvo e filhas de Maria Lopes ainda choram a perda devido à doença que devastou centenas de milhares de famílias no Brasil

Irmãs Iara e Sandra celebram a vida de seu pai, Paulo Alves de Souza, 1º paciente do HCamp na pandemia (Wildes Barbosa / O Popular)

Irmãs Iara e Sandra celebram a vida de seu pai, Paulo Alves de Souza, 1º paciente do HCamp na pandemia (Wildes Barbosa / O Popular)

Cinco anos depois, ainda é difícil aos familiares de Maria Lopes de Souza recordar o momento de sua partida após a infecção pelo Sars-CoV-2, que por muito tempo foi chamado de "novo coronavírus", surgido na China. A técnica de enfermagem aposentada, então com 66 anos, moradora de Luziânia, município do Entorno do Distrito Federal, foi a primeira vítima fatal da Covid-19 em Goiás. Naquele 26 de março de 2020, o Brasil já registrava 76 mortes, mas ainda havia um cenário de incertezas. No Estado, as autoridades de saúde buscavam respostas para delinear a melhor forma de atendimento à população. A perplexidade pairava Brasil afora.

A assistente social Sandra de Souza, 46, filha caçula de Maria Lopes, busca na memória os dias que antecederam a morte da mãe. "Estávamos com muito medo, as escolas tinham parado de funcionar e nós orientamos nossos pais a ficarem isolados na fazenda, sem receber ninguém." No dia 13 de março, o Decreto 9.633/2020 definiu a situação de emergência na saúde pública em Goiás e a partir daí vieram sucessivos decretos determinando isolamentos. Sandra conta que no final da primeira quinzena de março a mãe foi a uma igreja. "Acreditamos que foi o local da contaminação, porque ela não saía de casa."

O mal-estar respiratório de Maria e do marido Paulo Alves de Souza, então com 72 anos, alertou os filhos. "Pensamos em pneumonia, mas estranhamos porque ficaram doentes juntos", relata Sandra. Levaram o casal a uma unidade de pronto atendimento (UPA), onde foi medicado. Como a febre de Maria não cedeu, ela se dirigiu a um hospital privado de Luziânia e o médico a encaminhou para a UPA do Jardim Ingá, por entender que a unidade pública estaria mais preparada para casos daquele vírus desconhecido. "Ela ficou na sala vermelha e lá não tinha tomografia. Minha irmã a levou para um hospital particular de Valparaíso e o exame deu sugestivo de Covid", lembra a filha.

Maria Lopes de Souza: vítima da doença e do negacionismo (Divulgação)

Maria Lopes de Souza: vítima da doença e do negacionismo (Divulgação)

"Foi aterrorizante. Cinco anos depois é difícil falar nisso. Enquanto tentávamos entender o que estava acontecendo, agarrados a qualquer fio de esperança, o que recebíamos era desinformação. Diziam que era exagero, que era só uma "gripezinha" e que o medo era infundado." Maria Lopes foi transferida para Goiânia e internada no Hospital de Doenças Tropicais (HDT), então a unidade referência para atender infectados pelo novo coronavírus. Ela morreu na madrugada do dia 26, um dia após a internação. As autoridades de saúde anunciaram o óbito ressaltando que se tratava de uma paciente com comorbidades.

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Ao saber da morte da mulher, Paulo começou a passar mal e foi levado para a UPA do Jardim Ingá e de lá para Goiânia, tornando-se o paciente inaugural do primeiro Hospital de Campanha (HCamp) para enfrentamento da nova doença, montado em 14 dias no antigo Hospital do Servidor Público, que nunca tinha funcionado. "Era tudo novo e foi muito sofrido para a família. As pessoas evitavam contato conosco. Não passavam na calçada de nossas casas. Até parentes tinham receio. Na época, eu não conseguia falar no assunto", lembra a filha. Paulo ficou internado por seis dias. Sua alta foi muito comemorada pelos servidores, mas psicologicamente o motorista aposentado estava devastado.

"Ele se recuperou rapidinho, mas ficou depressivo. Até hoje, quando toca no assunto, chora", afirma a filha. Paulo não ficou com sequelas da Covid-19 e, aos 77 anos, continua morando na propriedade rural da família. Ele e Maria tiveram três filhos (Iara, Luis Carlos e Sandra), nove netos e dois bisnetos. "Há cinco anos, a Covid-19 mudou o mundo. Para nós, é uma mudança que tem nome, tem rosto e tem ausência. Nossa mãe é uma das vítimas dessa doença que muitos insistiram em negar. A nossa perda não foi só um número. Foi um vazio que nunca mais se preencheu. O que dói não é só a perda, mas a maneira como tudo aconteceu. Além da dor de ver quem a gente ama partir, tivemos que enfrentar o peso da negação, do descaso e da mentira."

Para enfrentar o luto, Sandra decidiu homenagear a mãe criando dois perfis em redes sociais -- @oamorquefica -- que, juntos, somam 1 milhão de seguidores. Neles, além de amor, ela fala de ausência e de resiliência. "A dor persiste, a saudade sufoca e a revolta ainda arde. Nossa mãe não foi só uma estatística, foi amor, foi história e foi vida. Ela foi tirada de nós por um vírus e por um sistema que preferiu fechar os olhos para a verdade", enfatiza.

Relações desfeitas pelo vírus

Marcada pela dor, a história de Maria e Paulo Lopes de Souza, até então um anônimo casal de Luziânia, se soma a muitas outras que vieram depois. No dia 12 de março, data em que o Brasil registrou a primeira morte por Covid-19, o músico Roberto Célio Pereira da Silva, o Xexéu, vestiu uma camiseta com a inscrição "Cláudia-se" para uma de suas apresentações. Foi a forma que encontrou para homenagear a afilhada e amiga Cláudia Garcia, cantora que morreu aos 49 anos no dia 26 de fevereiro de 2021. "Hoje chorei muito", contou ao POPULAR. Cláudia foi aliada de Xexéu na criação do projeto Adote a Arte que forneceu alimentos e material de limpeza ao pessoal da cultura que ficou sem trabalho durante a pandemia.

O músico Xexéu mostra no celular a foto com a amiga e cantora Cláudia Vieira, vítima da Covid-19 em fevereiro de 2021 (Diomício Gomes / O Popular)

O músico Xexéu mostra no celular a foto com a amiga e cantora Cláudia Vieira, vítima da Covid-19 em fevereiro de 2021 (Diomício Gomes / O Popular)

Xexéu e a mulher Daniela foram contaminados. Ele chegou a ficar internado com 50% do pulmão comprometido e caiu em tristeza profunda após a morte de Cláudia Garcia. Mas não deixou seu propósito esmorecer. Mobilizou amigos e fez a diferença, assim como outros colegas do meio cultural, entre eles o músico Carlos Brandão e o artista circense Maneco Maracá, que também lideraram iniciativas semelhantes. "Estimo que 15 mil cestas tenham sido distribuídas pelo Adote a Arte no auge da pandemia e depois", afirma. Xexéu lembra ainda que os artistas foram uma espécie de agentes de saúde naquele período tenebroso. "As lives -- apresentações online -- salvaram muita gente da depressão."

Quase dez meses após Goiás ter sido apresentado oficialmente à pandemia e suas consequências sanitárias, econômicas e emocionais, a capital passou por um momento espinhoso. Aos 71 anos, o ex-governador Maguito Vilela morreu no dia 13 de janeiro de 2021 em decorrência das sequelas da Covid. Em agosto do ano anterior, o político havia perdido duas irmãs em Jataí para a doença. Maguito já estava internado quando foi eleito para administrar Goiânia com 52% dos votos no segundo turno das eleições de 2020. Tomou posse de forma virtual e se licenciou do cargo. A gestão da capital pelos quatro anos seguintes ficaria a cargo do vice, Rogério Cruz.

No tribunal

A técnica judiciária Ariony Chaves de Castro, responsável pelo centro de memória do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (TRT-GO), fez da dor uma catarse. Em outubro de 2020, ela viu a Covid levar a cunhada, o irmão, os sogros dele. Em 2021, perdeu a irmã. "O Tribunal ficou fechado, mas trabalhei todos os dias. Foi o período em que mais produzi.Em alguns dias, eu sentava no chão e chorava muito. Tinha muito medo de morrer e deixar meu filho, então com 16 anos. O que me salvou foi a minha fé."

Servidora do TRT, Ariony Chaves, que perdeu 5 pessoas da familia para a Covid, fez documentário sobre a pandemia no tribunal: “O que me salvou foi a minha fé” ( Wesley Costa / O Popular)

Servidora do TRT, Ariony Chaves, que perdeu 5 pessoas da familia para a Covid, fez documentário sobre a pandemia no tribunal: “O que me salvou foi a minha fé” ( Wesley Costa / O Popular)

Ariony produziu o documentário A Repercussão da Pandemia de Covid-19 no TRT-GO, em que mostra as providências para manter o serviço jurisdicional e depoimentos de servidores e magistrados atingidos pela doença. A produção foi exibida no Festival Internacional de Cinema Ambiental (Fica) e concorre este ano ao Prêmio CNJ do Poder Judiciário.

Foi em 2021 que foi registrado o maior número de óbitos pela doença, em razão da chegada da variante ômicron, uma mutação do coronavírus. O produtor Felipe Jorge Kopanakis acompanhou em Goiânia o sofrimento do pai de 81 anos, que ficou cinco dias intubado antes de morrer, em maio daquele ano. Ele vivia em Niterói (RJ) e colaborou na produção do filme Mulheres & Covid, assinado pela irmã Fernanda Kopanakis e Ivan de Angelis, uma parceria com a Fiocruz. Depois disso, se cadastrou na Associação de Vítimas e Familiares de Vítimas da Covid (Avico). "A Covid impactou todo mundo. Fui me aprofundando no tema e vejo que um dos grandes problemas da sociedade brasileira é esquecer o passado. Houve uma onda de desinformação e mentiras, precisamos lutar contra isso."

Membro de uma organização não governamental que atua com cinema e literatura em escolas públicas às margens dos rios Guaporé, Amazonas e Negro, na Amazônia, Jorge Kopanakis conta que após a pandemia só conseguiu voltar à região em 2024. "O impacto da Covid nessas comunidades distantes foi imenso. Já existe um isolamento natural porque não têm estradas. Para chegar a Manaus, é preciso pegar uma voadora (tipo de barco comum na Amazônia) e viajar 12 horas. Ninguém chegava e as pessoas foram morrendo. Teve um professor que morreu por falta de oxigênio." O produtor pretende se dedicar a um documentário sobre vacinação. "A taxa vacinal do País caiu. Estamos negando a ciência."

Geral

Mutilações fazem estética virar caso de saúde pública

Desde 2023, o Estado registrou pelo menos 10 casos de grande repercussão que acabaram na polícia. Em dois episódios, mulheres morreram após aplicações de produtos

Modificado em 22/03/2025, 08:21

Polícia Civil prende Maria Silvânia na Operação Beleza Sem B.O.

Polícia Civil prende Maria Silvânia na Operação Beleza Sem B.O. (Divulgação/Policia Civil)

O aumento de casos de procedimentos estéticos que resultam em lesões, mutilações e deformidades, dentre outras sequelas, tornou o assunto uma questão de saúde pública. Desde 2023, Goiás registrou pelo menos dez casos de grande repercussão que acabaram na polícia. Em dois episódios, ocorridos no segundo semestre de 2024, mulheres morreram após se submeterem a aplicações de diferentes produtos.

De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), de 2018 a 2023 os serviços de estética e embelezamento figuraram como os mais denunciados junto à agência dentre os "serviços de interesse à saúde", categoria que inclui também serviços de hotelaria, estúdios de tatuagem e instituições de longa permanência para idosos, por exemplo. Em 2023, 61,3% das denúncias estavam relacionadas a serviços de estética e embelezamento.

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Nos casos ocorridos em Goiás levantados pela redação, foram verificados alguns padrões. Em pelo menos seis situações, as pessoas que faziam os procedimentos não tinham nenhum tipo de habilitação, mas se passavam por profissionais capacitados. Além disso, algumas das clínicas eram de pessoas famosas nas redes sociais. O uso de PMMA, sigla para polimetilmetacrilato -- substância que já foi usada como preenchedor, mas se mostrou arriscada --, também foi verificado em parte dos casos.

Karine Giselle Gouveia, dona de uma clínica de estética fechada em 2024 por conta da suspeita de realização de uma série de procedimentos estéticos malsucedidos, é um exemplo. Apesar de não possuir formação na área, tinha quase 950 mil seguidores apenas no Instagram, rede social em que fazia publicações sobre procedimentos estéticos e sobre a própria rotina. A defesa de Karine nega que a clínica já tenha utilizado qualquer substância ilícita ou proibida.

Nesta quinta-feira (20), a Delegacia Estadual de Repressão a Crimes Contra o Consumidor (Decon) deflagrou a Operação Beleza Sem B.O. As investigadas são Luana Nadejda Jaime, dona de uma clínica em Goiânia, e Maria Silvânia Ribeiro da Silva, proprietária de um estabelecimento em Aparecida de Goiânia. Maria Silvânia foi presa e Luana está foragida. A reportagem não localizou a defesa de ambas.

No final de 2023, uma paciente foi internada em uma unidade de pronto atendimento (UTI) e entubada após aplicação de substância injetável na clínica de Maria Silvânia. A Vigilância Sanitária de Aparecida interditou o local e ela foi ouvida pela Polícia Civil do Estado de Goiás (PC-GO). Na ocasião, ela disse que havia feito uma pós-graduação com Luana, que também passou a ser investigada. Foi apurado que ela era suspeita de cometer lesão corporal contra quatro pessoas, sendo uma delas de um homem que passou por um "preenchimento íntimo" na região peniana e alega ter perdido a funcionalidade do membro após o procedimento. O produto usado teria sido PMMA.

Em 2024, as clínicas da dupla foram fiscalizadas pela Decon em conjunto com a Vigilância Sanitária. Mesmo assim, as mulheres continuaram ofertando, nas redes sociais, procedimentos estéticos invasivos. Além disso, ambas tinham registros -- obtidos por meio da apresentação de diplomas falsos -- no Conselho Regional de Enfermagem (Coren). Eles foram cancelados no final de 2024. Entretanto, quando foi presa nesta quinta, Maria Silvânia estava atuando com um novo número de registro. Questionado, o Coren informou, em nota, que já está ciente do caso e que, como as mulheres não são enfermeiras, "cabe agora às autoridades o cumprimento da justiça e o andamento do processo conforme a legalidade". (Mariana Milioni é estagiária do GJC em convênio com a PUC Goiás)

Pacientes têm vidas arruinadas

A ação de falsos profissionais ou então de profissionais que executam procedimentos que não estão habilitados a realizarem -- como dentistas que realizaram rinoplastias -- deixa um rastro de destruição na vida das vítimas. Em 2023, a motorista de aplicativo Ana Priscila Santos da Silva, de 36 anos, procurou a enfermeira Marcilane da Silva Espíndola para realizar aplicações com fim de harmonização dos seios e glúteos. O procedimento custou R$ 5,5 mil.

Depois da aplicação, Ana Priscila começou a sentir dores. Inicialmente, ela pediu a ajuda de Marcilane, que aplicou uma injeção nela. As dores não apresentaram melhora e Ana Priscila procurou uma unidade de saúde. Então, foi encaminhada para o Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (HC/UFG), onde descobriu que o material injetado era PMMA. Ela já foi internada várias vezes para realizar a retirada do produto. O último procedimento cirúrgico ocorreu nesta quarta-feira (19). A mulher relata que, mesmo após as intervenções, ainda sente dores físicas. Ela tem dificuldade para dirigir, por exemplo. As deformidades nos seios de Ana Priscila prejudicam sua autoestima e saúde mental. "Estou péssima. Muita ansiedade", conta. A defesa afirma que Marcilane não cometeu qualquer ato censurável.

Relatos como o de Ana Priscila se repetem. Entretanto, existem casos ainda mais trágicos. No segundo semestre de 2024, duas mulheres morreram por conta de procedimentos estéticos malsucedidos. Segundo as investigações, Aline Maria Ferreira da Silva, de 33 anos, morreu após ter tido PMMA aplicados nos glúteos. A ré do caso é Grazielly da Silva Barbosa, que não tem formação na área. A defesa dela alega inocência. Já Danielle Mendes Xavier de Brito, de 44 anos, morreu após a realização de uma aplicação no rosto. A responsável pela aplicação foi a enfermeira Quesia Rodrigues Biangulo Lima. A defesa dela diz que, por enquanto, não vai se manifestar.

Vigilância sanitária promove campanhas

Com o avanço dos casos de procedimentos estéticos malsucedidos envolvendo clínicas irregulares, a utilização de produtos proibidos e a atividade de pessoas sem as credenciais adequadas para a atuação na área, a Vigilância Sanitária tem atuado na tentativa de coibir as más práticas. Segundo a Anvisa, o número elevado de denúncias relacionadas a serviços de estética e embelezamento sinaliza que a grande quantidade de estabelecimentos disponíveis e a diversidade de técnicas e procedimentos estão relacionadas ao número elevado de relatos de irregularidades.

Em fevereiro de 2025, a Anvisa realizou a operação Estética Com Segurança em parceria com as vigilâncias sanitárias estaduais e municipais. Clínicas de quatro Estados foram fiscalizadas. Um dos estabelecimentos interditados ficava em Goiânia e funcionava na cozinha de um apartamento. Foram encontrados produtos com prazo de validade vencido e as equipes descobriram anotações referentes a dois casos de infecção, sendo um deles por micobactéria, após procedimentos realizados na clínica. Os casos não haviam sido notificados ao sistema de saúde público, contrariando a legislação, que estabelece a notificação compulsória.

Em Goiás, a Secretaria de Estado de Saúde de Goiás (SES-GO) possui a ação De Olho na Beleza. Por meio dela, a Superintendência de Vigilância Sanitária, Ambiental e Saúde do Trabalhador (Suvisa) promoveu reuniões estratégicas com os conselhos regionais de Enfermagem, Farmácia, Odontologia, Fisioterapia, Biomedicina e Biologia. O objetivo foi alinhar medidas conjuntas para aumentar a segurança nos procedimentos estéticos. "Tornou-se um problema de saúde pública", aponta Flúvia Amorim, superintendente de Vigilância em Saúde de Goiás.

O auditor fiscal de Saúde Pública da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de Goiânia, Dagoberto Costa, atua há 25 anos na área e relata que mais recentemente houve uma explosão de casos de irregularidades ligadas a procedimentos estéticos. Na capital, o órgão municipal tem procurado trabalhar em parceria com a Polícia Civil do Estado de Goiás (PC-GO). Além da esfera criminal, no âmbito da Vigilância Sanitária os estabelecimentos irregulares podem sofrer desde multas até a apreensão de produtos e interdição.

Nesse sentido, Costa alerta para alguns sinais aos quais a população deve ficar alerta antes de se submeter a procedimentos estéticos como, por exemplo, verificar o alvará sanitário do estabelecimento, saber qual material está sendo utilizado -- inclusive se está dentro da data de validade -- e verificar se o profissional responsável está habilitado no conselho da classe. "Também é importante saber o que você realmente precisa e tomar cuidado com as redes sociais", finaliza.

Conselho de Odontologia quer liberação de cirurgias no rosto

O Conselho Federal de Odontologia (CFO) quer permitir que dentistas possam fazer cirurgias plásticas no rosto. De acordo com o próprio conselho, a instituição tem trabalhado na elaboração de uma resolução sobre as "cirurgias estéticas da face", cujos estudos estão em andamento. A classe médica se posiciona contra o documento e defende que procedimentos como, por exemplo, rinoplastias, só sejam realizados por médicos. Atualmente, a Resolução CFO 198/2019, já permite aos dentistas a prática de harmonização orofacial.

Em nota, o CFO defendeu que o termo cirurgia plástica facial é "equivocado" e que "não estão definidos os procedimentos a serem englobados na futura resolução e as respectivas exigências da regulamentação", sendo que os detalhes completos sobre o tema serão divulgados após a publicação.

O conselho ainda esclareceu que "as cirurgias estéticas da face vão representar um avanço importante para a Odontologia, com reconhecimento das competências legais e técnico-científicas dos cirurgiões-dentistas para atuação na área e, principalmente, serão um passo significativo para a segurança da população, que terá acesso a novos procedimentos regulamentados de forma rígida e adequada".

O presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica -- Regional Goiás (SBCP-GO), Fabiano Arruda, é um crítico da movimentação do CFO. "Não é mudando o nome (de cirurgias plásticas para cirurgias estéticas da face) que vão conseguir mudar o que esses procedimentos causam e as repercussões que eles têm no organismo. Essa resolução representa, para os pacientes, um risco", argumenta.

Em nota, o Conselho Regional de Medicina do Estado de Goiás (Cremego) informou que "considera essa medida um grave risco à saúde da população, especialmente em um momento em que se multiplicam denúncias de complicações em procedimentos realizados por profissionais sem formação médica completa para essas intervenções" e que comunicou que "atuará junto ao Conselho Federal de Medicina (CFM) para adotar todas as medidas necessárias a fim de impedir que essa decisão seja implementada".

O conselho ainda explicou que "cirurgias plásticas faciais são atos complexos que demandam profundo conhecimento da anatomia humana e técnicas cirúrgicas adquiridas apenas após longos anos de formação médica: seis anos de graduação em medicina, seguidos por três anos de residência em cirurgia geral e mais três anos de residência em cirurgia plástica" e destacou que "permitir que profissionais sem essa trajetória realizem tais procedimentos é colocar em risco a segurança, a integridade e a vida dos pacientes".

Geral

Caiado afrouxa critérios para escolha em estatais

Decreto do governador flexibiliza normas para companhias de pequeno porte, estabelecidas há menos de um ano; novo indicado para a presidência da Ceasa é um dos beneficiados

Modificado em 04/03/2025, 08:43

Ex-prefeito Carlão da Fox e governador Ronaldo Caiado: entrada na gestão

Ex-prefeito Carlão da Fox e governador Ronaldo Caiado: entrada na gestão (Wesley Costa / O Popular)

Em meio a escolha de novos auxiliares e renovação de mandatos em conselhos, o governador Ronaldo Caiado (UB) reduziu exigências de qualificação técnica e excluiu restrições a políticos para nomeações em estatais de pequeno porte do Estado. Goiás tem 11 estatais com 165 cargos em diretorias e conselhos. Entre elas, 8 são de menor estatura, com receita operacional bruta inferior a R$ 90 milhões anuais.

Decreto publicado na semana passada pelo governador alterou as regras para preenchimento de direção e conselhos (de administração e fiscal) dessas empresas, flexibilizando normas estabelecidas há menos de um ano pelo próprio governo ao instituir a Política Estadual de Governança das Estatais de Goiás.

A gestão estadual alega que as exigências são definidas conforme "juízo discricionário" do governador, como permitido pela Lei Nacional das Estatais, e que as mudanças evitam critérios "exageradamente engessados". A norma nacional prevê a possibilidade de flexibilização para nomeações em empresas de pequeno porte, mas o governo goiano havia optado no ano passado por aplicar as regras em geral como forma de ressaltar a política de governança e compliance.

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Com as novas regras, não há mais veto, na ocupação de diretorias e conselhos das estatais, a pessoas que tenham exercido cargo de direção partidária ou que tenham participado de campanha eleitoral nos três anos anteriores. Também são reduzidas as exigências sobre experiência profissional e formação: antes era necessária comprovação de passagem por cargos de chefia do Estado ou relacionados à atuação da estatal, além de curso superior compatível com a área da empresa. Os dois requisitos são excluídos no decreto (veja quadro).

Um dos nomes contemplados com a alteração é o ex-prefeito de Goianira Carlos Alberto Andrade Oliveira, o Carlão da Fox, indicado na semana passada para a presidência da Centrais de Abastecimento de Goiás (Ceasa). Ele foi presidente do União Brasil de Goianira até dezembro do ano passado.

Ex-presidente da Associação Goiana dos Municípios (AGM), Carlão foi o primeiro da lista de quatro ex-prefeitos que devem ser acomodados no governo, conforme mostrou a redação em 8 de fevereiro. Caiado já confirmou também que o ex-prefeito de Catalão Adib Elias (MDB) vai para a Secretaria Estadual de Infraestrutura depois do Carnaval.

A informação nos bastidores do governo é de que as alterações contemplam não só nomes novos, mas vários outros aliados por ser momento de renovação de mandatos em conselhos, que têm duração de 2 anos. Questionada pela reportagem, a gestão estadual negou que o decreto atenda a casos específicos.

Em fevereiro de 2019, no primeiro ano de mandato, Caiado também já havia alterado o decreto que regulamentava a Lei das Estatais com objetivo de abrir espaço a aliados que atuaram na campanha eleitoral do ano anterior. Na ocasião, ele permitiu indicações políticas para estatais de pequeno porte e abriu espaço para dirigentes partidários, em casos como a Indústria Química (Iquego) e Companhia de Desenvolvimento Econômico (Codego).

Depois disso, em abril do ano passado, a partir de estudos e recomendações da Controladoria Geral do Estado (CGE), o governador assinou a Política de Governança das Estatais, revogando o decreto de fevereiro de 2019.

Além de contemplar aliados políticos, as estatais também abrigam secretários e apadrinhados da cúpula do governo em conselhos com objetivo de turbinar salários. Alguns integram mais de um colegiado.

Há ainda casos de altos salários nas diretorias. Em janeiro do ano passado,á reportagem, mostrou que os pagamentos chegam a ultrapassar o dobro do subsídio do governador. Das 11 estatais, 8 pagavam acima de R$ 30 mil a seus diretores.

"Os critérios de elegibilidade para cargos em conselhos e direção estão sendo aprimorados para que os processos de seleção não fiquem exageradamente engessados. A medida visa garantir que profissionais qualificados tenham acesso a essas funções por meio de processos seletivos que estejam dentro da realidade de mercado e das necessidades da gestão pública", afirmou o governo goiano em nota, diante dos questionamentos da reportagem.

A gestão diz ainda que a revisão "corrige excessos burocráticos que, no passado, tornavam o processo de escolha muito demorado e oneroso". "Em diversas ocasiões, técnicos altamente capacitados foram impedidos de assumir cargos devido a restrições irrelevantes do ponto de vista funcional", completou, sem apontar casos específicos.

O governo também alega que "a exigência de qualificação técnica permanece, mas agora com um processo mais ágil e eficiente, alinhado ao compromisso do governo de assegurar profissionais competentes na administração".

A compatibilidade entre formação e função ocupada segue como princípio fundamental desta gestão, garantindo que as decisões sejam pautadas pela excelência técnica e pelo interesse público", finaliza a nota.

O procurador-geral do Estado, Rafael Arruda, afirma que, do ponto de vista jurídico, "são perfeitamente possíveis as modificações pretendidas, conforme orientado pela PGE, a partir de um juízo discricionário do decisor político, nos termos da faculdade conferida pela Lei Nacional das Estatais em relação às estatais de pequeno porte".

A lei nacional confere a faculdade e o decisor político toma as decisões que reputa apropriadas", afirmou o titular da PGE. Ele afirmou não ter informações sobre a mudança "no campo político" do decreto em menos de um ano.

Geral

Câmara paga R$ 285 mil em verba indenizatória

Primeiros repasses de verba indenizatória alcançam 26 dos 37 vereadores e lista ainda será atualizada após análise de pedidos; 14 pediram reembolso de R$ 10 mil ou mais

Plenário da Câmara: cada vereador pode pedir até R$ 15,5 mil por mês de verba indenizatória, criada no final do ano passado

Plenário da Câmara: cada vereador pode pedir até R$ 15,5 mil por mês de verba indenizatória, criada no final do ano passado (Fábio Lima / O Popular)

A Câmara de Goiânia começou a reembolsar vereadores por despesas que se enquadram na Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar (Ceap), criada em dezembro do ano passado. Entre 14 e 27 de fevereiro, a Casa pagou R$ 285 mil, distribuídos entre 26 dos 37 parlamentares. O valor é referente a janeiro de 2025 e pode aumentar, pois os gastos de outros vereadores ainda devem ser analisados e pagos (cada um pode pedir até R$ 15,5 mil por mês).

Os números estão disponíveis nos portais de transparência da Prefeitura de Goiânia (também mostra despesas do Legislativo) e da Câmara. No entanto, o detalhamento do destino do recurso ainda não foi divulgado. Os dados mostram que 14 vereadores pediram reembolso de R$ 10 mil ou mais.

No site da Prefeitura, a despesa é identificada pelo nome do vereador e há informação de que os pagamentos são referentes à verba indenizatória. O site da Câmara também registra os mesmos repasses, com a referência ao parlamentar beneficiado, mas não cita o motivo.

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A Câmara afirmou, em nota, que o detalhamento será publicado quando concluídos os primeiros pagamentos. Além disso, a Casa informou que, à medida em que o sistema for aperfeiçoado, as informações serão publicadas em tempo real.

Os vereadores tomaram posse no dia 1º de janeiro, data em que também se reuniram para eleger os membros da Mesa Diretora e a composição das comissões. Em seguida, eles entraram em recesso. Os parlamentares retomaram as atividades em plenário no dia 4 de fevereiro.

Na lista de primeiros repasses feitos a vereadores, Welton Lemos (SD) aparece com o maior valor, R$ 15.520. Os portais de transparência mostram que o valor foi liquidado, mas Lemos afirmou que ainda não recebeu o recurso. De acordo com o vereador, o dinheiro foi usado, em geral, com combustível, assessoria jurídica e divulgação da atividade parlamentar. Lemos afirmou que não pretende ter escritório político.

Segundo o vereador, a previsão é que exista oscilação do uso da cota a cada mês, a depender da demanda, principalmente de combustível. Para Lemos, embora o uso do recurso esteja na fase inicial, a modalidade permitirá ampliar ações do mandato.

No ranking, os vereadores novatos Heyler Leão (PP) e William do Armazém Silva (PRTB) aparecem em segundo e terceiro lugar, com R$ 15.500 e R$ 15.460,27, respectivamente. Silva afirmou que comentará o assunto após a Câmara publicar o detalhamento da prestação de contas. A reportagem entrou em contato com Leão, mas não houve retorno até o fechamento desta edição.

Até o momento, os menores valores pagos são de Denício Trindade (UB), com R$ 1.796,14, e Coronel Urzêda (PL), com R$ 788,61.

Regras

A legislação prevê que a cota parlamentar pode ser usada para manutenção de escritório político, em gastos como locação de imóvel; condomínio; IPTU e seguros; telefone, energia elétrica, água; locação de móveis; internet; licença para uso de software; serviços gráficos; material de copa, cozinha e higiene; e conservação, reforma e reparos do espaço.

A verba também pode ser aplicada para pagar por divulgação de atividade parlamentar, com exceção dos 120 dias anteriores às eleições federal, estadual e municipal (se o vereador não for candidato, não é necessário seguir esta regra). Há ainda previsão de aplicar o recurso em passagens aéreas, hospedagem, alimentação e locomoção, em caso de viagem. Também é permitido contratar consultoria jurídica, contábil e outros trabalhos especializados.

Os vereadores podem usar até 20% da cota para pagar por combustível usado no carro oficial da Câmara ou veículo locado para ações do mandato. O aluguel de carro também pode ser pago com esse recurso, mas o contrato deve ser firmado necessariamente com pessoa jurídica especializada na prestação deste serviço. É possível, ainda, pagar por alimentos usados em eventos relacionados à atividade parlamentar (exceto bebidas alcoólicas), serviços postais e segurança.

A Câmara criou uma coordenadoria para analisar a prestação de contas e reembolsos da cota parlamentar. O teto de R$ 15,5 mil por mês corresponde a 75% do valor do vencimento base dos vereadores, de R$ 20,7 mil.

Benefícios

O POPULAR mostrou que, em janeiro, a Câmara também já pagou aos vereadores o auxílio-representação de R$ 6,9 mil. A gratificação foi criada no ano passado, por meio de emenda jabuti incluída no projeto de lei que tratava originalmente sobre a reforma administrativa da Prefeitura de Goiânia.

No primeiro mês do ano, 36 dos 37 vereadores receberam o benefício, que custou, no total R$ 248 mil. Apenas Fabrício Rosa (PT) pediu para não receber o auxílio. Para ter direito à gratificação, o vereador deve ocupar cargos específicos, como ser membro da Mesa Diretora, presidente de comissão, presidente de frente parlamentar, líder do governo ou de partido. Todos os vereadores foram acomodados em posições que garantem o pagamento do benefício.

Os vereadores também têm verba de gabinete de R$ 103 mil, para ser usada no pagamento da folha de sua equipe direta. Cada parlamentar pode ter de 10 a 25 funcionários em seu gabinete. A mudança foi promovida em outubro de 2021. Antes disso, os vereadores só podiam ter até 12 colaboradores.

A quantidade de comissionados na Câmara mais que dobrou na última legislatura (saiu de 534 em janeiro de 2021 para 1,2 mil nos últimos meses de 2024), como O POPULAR também mostrou. O crescimento é consequência do aumento na quantidade de cargos comissionados na estrutura administrativa e da reforma nas regras de contratação dos gabinetes.

Política

A cota parlamentar e o auxílio-representação foram criados no final de 2024 no contexto de articulações políticas que levaram à eleição, por unanimidade, em janeiro de 2025, de Romário Policarpo (PRD) para o quarto mandato seguido de presidente da Câmara. As outras medidas (ampliação de comissionados e reforma na verba de gabinete) são atribuídas a negociações de reeleições anteriores do presidente.