Pacientes especiais recebem tratamento odontológico pelo SUS em Goiânia
Hospital oferece serviço específico para público que tem dificuldade de ser atendido até mesmo na rede particular
Mariana Carneiro
24 de dezembro de 2024 às 09:53

Suely Maria de Almeida leva i filho Vitor Paulo de Almeida para ser atendido pelo Serviço Odontológico para Pacientes Especiais do HGG (Fábio Lima / O Popular)
Pacientes com condições especiais têm encontrado no Hospital Estadual Alberto Rassi (HGG) um refúgio para a promoção de tratamentos odontológicos. Com dificuldade para serem atendidos até mesmo na rede particular, pacientes com complexidades no sistema biológico, psicológico ou social encontram acolhimento no Serviço Odontológico para Pacientes Especiais (Sope), especialidade que tem por objetivo o diagnóstico, a preservação, o tratamento e o controle dos problemas de saúde bucal dessas pessoas.
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A coordenadora do Serviço de Odontologia do HGG, Camila de Freitas, explica que esses pacientes não conseguem atendimento em consultórios convencionais em virtude de suas condições neurológicas. No HGG, eles são recebidos, avaliados e submetidos aos procedimentos odontológicos necessários sob o efeito de anestesia e dentro de um centro cirúrgico. A dificuldade de encontrar esse tipo de atendimento em outros locais faz com que muitos desses pacientes sofram com dores, problemas de fala e dificuldade de alimentação.
A portaria do Ministério da Saúde nº 1.032, de 5 de maio de 2010, inclui procedimentos odontológicos na tabela de procedimentos, medicamentos, órteses e próteses e materiais especiais do Sistema Único de Saúde (SUS) para atendimento às pessoas com necessidades especiais. Esse atendimento consiste justamente em procedimentos odontológicos realizados em ambiente hospitalar, sob anestesia geral ou sedação.
Na última quinta-feira (19), Vitor Paulo de Almeida, de 33 anos, foi atendido pelo Sope do HGG. Ele tem paquigiria, uma má formação no cérebro, e precisa de cuidados especiais. Desde que era apenas um bebê, a mãe dele, Suely Maria de Almeida, junta dinheiro anualmente para submetê-lo aos procedimentos odontológicos necessários sob sedação pela rede privada. "Neste ano, não consegui. Então, a dentista que o atende desde que ele tem apenas 1 aninho me recomendou procurar o serviço", conta.
Em agosto deste ano, Suely foi até a Unidade Básica de Saúde (UBS) Buriti Sereno com o filho para que ele passasse por uma consulta com um dentista. De lá, ele foi regulado para o HGG. Em menos de uma semana, Vitor Paulo se consultou, fez os exames e foi para a sala de cirurgia. No momento, se recupera bem. "No geral, o atendimento é muito bom", elogia Suely.
Com 15 cirurgiões dentistas em atuação, o HGG é referência estadual nesse tipo de trabalho. A unidade disponibiliza de 40 a 50 vagas de consulta por mês e os pacientes chegam até o hospital por meio de regulação, ou seja, primeiro eles se consultam em uma UBS e depois, com encaminhamento, eles vão para o HGG, onde são submetidos a outra consulta, exames pré-operatórios e, posteriormente, aos procedimentos odontológicos necessários. "Normalmente, são pacientes com paralisia cerebral, sequelas de AVC, esquizofrenia, autismo severo, dentre outros", detalha Camila.
Segundo a coordenadora do serviço, os episódios de dor desses pacientes podem ser tão fortes que chegam a fazer com que eles tenham episódios de comportamento agressivo. "Muitos são não verbais e essa é a forma que eles têm de expressar a dor", relata. Depois que os pacientes passam pelos procedimentos odontológicos e recebem alta, eles continuam sendo acompanhados pelo HGG. "Já saem de alta com um retorno agendado", frisa Camila. Atualmente, a unidade faz de 300 a 400 atendimentos do tipo por mês.
Atendido pelo Sope em novembro, Eduardo Macedo da Silva, de 45 anos, vivia com engasgos por não conseguir mastigar os alimentos adequadamente devido às fortes dores que sentia. A mãe dele, Edneusa Maria Macedo da Silva, conta que o filho, que tem esquizofrenia e autismo severo, dependia do uso de analgésicos diariamente. "Nem abria a boca", lembra. Desde que foi submetido ao tratamento odontológico, parou de usar os medicamentos. "Agora ele está bem", celebra Edneusa.
Humanização
A coordenadora do serviço revela que a maioria dos pacientes atendidos no HGG são homens adultos que são cuidados pelas mães, em grande maioria idosas. Com o intuito de ampliar o cuidado com essas famílias, a unidade está elaborando um e-book que será distribuído gratuitamente para essas mulheres com instruções de como cuidar da saúde bucal dos filhos em casa. "É importante destacar que alguns desses pacientes podem ser condicionados, desde pequenos, a fazer o tratamento odontológico no consultório", lembra Camila.
No HGG, o atendimento é feito de forma humanizada. O hospital possui, por exemplo, uma máquina de sorvete para que os pacientes possam tomar no pós-operatório. A diretora de serviços multidisciplinares do HGG, Rogéria Cassiano, explica que a unidade conta com uma assistência multidisciplinar para os pacientes internados. Por isso, caso necessário, eles podem ser assistidos por psicólogos e assistentes sociais. "Avaliamos todas as demandas", finaliza.
Serviço conta com UTI e cuidados paliativos
Além dos procedimentos cirúrgicos para pacientes especiais, o Hospital Estadual Alberto Rassi (HGG) também oferta um acompanhamento odontológico diário a todos os pacientes internados no Centro de Terapia Intensiva (CTI) e no Núcleo de Atenção ao Paciente Paliativo (NAPP). Os dentistas passam, de leito em leito, avaliando a qualidade da higiene oral dos pacientes a fim de evitar lesões, infecções e até o contágio por doenças.
Nos últimos meses, no âmbito dos atendimentos odontológicos de pacientes internados, o HGG passou a realizar a aplicação da toxina botulínica a fim de controlar os sintomas da sialorreia, condição caracterizada por uma produção abundante de saliva. Os sintomas de sialorreia são prevalentes em pacientes acamados, com doenças neurodegenerativas ou com sequelas neurológicas graves. O uso da toxina minimiza o risco de broncoaspiração e infecções respiratórias.
Neste ano, além do trabalho com a toxina botulínica, o HGG passou a contar com uma plastificadora odontológica a vácuo, equipamento que confecciona protetores bucais para pacientes internados no CTI e NAAP. A partir do objeto produzido pela máquina, os pacientes sedados e aqueles que apresentam déficit neurológico estarão mais seguros contra reflexos de mordeduras, que podem provocar lesões graves na língua, mucosa oral e lábios.
Outros atendimentos
Nas demais áreas assistenciais do hospital, dentistas se revezam para atender os pacientes que, por ventura, necessitem de acompanhamento odontológico. Na Clínica Médica, os profissionais realizam visitas aos leitos de manhã e de tarde. Se necessário, são feitas intervenções. Na Clínica Cirúrgica, todos os pacientes são avaliados. Os que passarão por cirurgias na cabeça, pescoço e tórax, por exemplo, são submetidos a atendimentos odontológicos onde são removidos todos os focos infecciosos.
Os pacientes que fazem transplante de medula óssea também são acompanhados desde o dia da indução até a chamada pega da medula, quando a medula óssea volta a funcionar. Os dentistas realizam laserterapia preventiva, tanto para estímulo das glândulas salivares quanto para a prevenção da mucosite, lesões na boca que podem levar a uma incapacidade de dieta via oral e a grandes infecções que podem ser fatais. Até o momento, o acompanhamento preventivo tem sido bem-sucedido, já que não foram registrados casos de mucosite nos pacientes que fizeram esse tipo de transplante no hospital.