Unidades de ensino da capital já iniciaram o ano letivo com adaptações para cumprir a nova legislação federal. Alguns colégios optaram por recolher os aparelhos
As escolas de Goiânia já voltaram às aulas com adaptações para cumprir a nova legislação federal, que proíbe o uso de celulares dentro das unidades de ensino. Alguns colégios optaram por recolher os aparelhos antes do início das aulas e devolvê-los apenas na saída. O Conselho Estadual de Educação (CEE) trabalha na confecção de resolução que regulamentará a questão.
Publicada no Diário Oficial da União (DOU) de 14 de janeiro deste ano, a Lei 15.100 proíbe o uso de aparelhos eletrônicos portáteis por estudantes com a justificativa de "salvaguardar a saúde mental, física e psíquica das crianças e adolescentes". Há exceções, como situações de perigo ou para atender condições de saúde dos alunos, ou mesmo para atividades pedagógicas em sala de aula.
No Colégio Degraus, na Vila União, o uso do celular durante as aulas já era proibido. Neste ano, a regra foi enrijecida e a unidade de ensino passou a recolher o item no início da aula e devolvê-lo somente no final, impedindo o uso durante o intervalo. "Adquirimos colmeias, uma para cada turma, para colocar os celulares. Eles ficam guardados em um armário, sob responsabilidade da coordenação", explica Wesley Anderson de Souza, coordenador do Ensino Médio.
Mesmo com a decisão, Wesley conta que a instituição continuará usando a tecnologia de maneira pedagógica. "Caso o professor queira usar, eles serão distribuídos, utilizados e depois recolhidos novamente", esclarece. A expectativa da instituição é que a mudança contribua para o processo de aprendizagem. "O comprometimento (do processo de aprendizagem) era visível. Agora, poderão se concentrar mais nas atividades pedagógicas", pontua o coordenador.
A adolescente Isadora Espindola Silva, de 16 anos, estuda no Degraus há dois anos e faz o uso do celular por, em média, 8 horas por dia. Ela gosta de passar a maior parte do tempo nas redes sociais, mas também usa o aparelho para estudar. "Me deu uma certa angústia (quando soube da proibição), pois nas horas vagas eu sempre estava com meu celular (...) Certamente vou ficar mais concentrada nas aulas, mas me dá uma angústia não saber como será daqui para frente", conta.
No Colégio Integrado, que tem unidades nos setores Marista, Jaó e Jardim Goiás, o uso de celulares dentro da sala de aula já era proibido. No recreio, o uso era permitido, mas os alunos eram estimulados a praticar outras atividades, como esportes e leitura. Desde o início deste ano letivo, o uso foi proibido até mesmo durante o intervalo. "Eles chegam e deixam o celular guardado em uma caixa que fica com a orientação pedagógica. O celular é devolvido no final da aula", explica Felipe Cavichiollo, diretor da escola.
A nova dinâmica foi apresentada aos alunos no primeiro dia de aula de 2025. "Pedimos que eles lessem a lei", detalha Cavichiollo. Segundo ele, não houve grande resistência dos alunos em entregar os objetos. "Entenderam a importância", destaca. Ele ainda relata que em uma turma do 6º ano, por exemplo, apenas 3 dos 30 alunos levaram o aparelho para a aula. Conforme Cavichiollo, ao longo de 2024 já havia sido feito um projeto piloto nesse sentido com duas turmas da escola. No segundo semestre do ano, quando os celulares dos alunos dessas turmas foram recolhidos, o ganho pedagógico nas provas foi de 20%.
Assim como no Degraus, em caso de emergência, os alunos do Integrado podem procurar a administração da escola para pedir ajuda e entrar em contato com os responsáveis. Cavichiollo diz que a direção também tem levado em conta casos excepcionais. "Tenho uma estudante diabética que precisa do celular para conferir a insulina. Nesse caso, ela pode ficar com o celular", pontua.
No Externato São José, no Setor Oeste, os celulares não estão sendo recolhidos, mas o uso deles durante o recreio, que antes era permitido, passou a ser proibido. Dentro da sala de aula, a escola já não permitia o uso. "Eles têm de manter o aparelho guardado na mochila", explica Tatiana Santana, diretora da unidade. De acordo com ela, a recepção dos estudantes da unidade à novidade também foi boa. "Vejo os alunos entusiasmados com outras coisas, como em ter várias canetas de diversas cores. Aquele encantamento de antigamente, sabe?", pondera.
Resolução
O presidente do CEE, Flávio de Castro, esclarece que o conselho discute uma resolução que vai justamente orientar sobre a presença dos celulares dentro do ambiente escolar. "O porte (do celular) é de responsabilidade do aluno e da família. O que procuramos é instruir as escolas sobre como fazer uma mediação (sobre o uso do celular). É importante detalhar tudo, inclusive as situações em que o uso será pedagógico, no projeto político pedagógico da instituição. É um documento discutido com a comunidade."
Conforme o ministro da Educação, Camilo Santana, será feito um decreto para estabelecer formas de fiscalização e controle, entre outras questões, no prazo de 30 dias contados a partir da publicação da lei. Em relação à rede estadual, reportagem do POPULAR publicada na edição de 15 de janeiro mostrou que a Secretaria de Estado da Educação de Goiás (Seduc) se manifestou favorável à medida e aguarda a regulamentação para dar início à implementação nas unidades estaduais de ensino.
Restrição deve ser explicada
Para que sejam bem sucedidas, as restrições relativas ao uso de celulares nas escolas devem ser explicadas aos estudantes. "É uma normativa que buscou resguardar a saúde global das crianças e adolescentes. Se não entender de onde a coisa vem e para onde ela vai, eles logo abandonam. Precisa fazer sentido para eles", explica Anita Chediak, pedagoga e coordenadora da Unidade de Psicologia da Unimed Goiânia.
Conforme a especialista, os estudantes precisam perceber que o uso excessivo do celular e a exposição exacerbada às telas tem causado, além de um déficit no processo de aprendizagem, outros malefícios, como baixa tolerância à frustração, desatenção e dificuldade em esperar. "Nesse sentido, as escolas precisam saber respeitar as diferenças. Cada família tem uma realidade. É sobre promover algo para além do conteudismo, englobando uma educação socioemocional", esclarece.
O cuidado com a integralidade dos estudantes é uma das preocupações de Felipe Cavichiollo, diretor do Colégio Integrado. "Fazer eles se reconectarem com os colegas e trabalhar para aumentar o tempo de concentração deles", pontua Cavichiollo sobre as expectativas em relação a proibição do uso de celulares. No Colégio Degraus, o anseio é o mesmo. "Esperamos que eles tenham ganhos no sentido de convivência uns com os outros", frisa Wesley Anderson de Souza, coordenador do Ensino Médio da unidade.
O presidente do Conselho Estadual de Educação (CEE), Flávio de Castro, também é presidente do Sindicato dos Estabelecimentos Particulares de Ensino de Goiânia (Sepe) e afirma que os professores da rede particular têm se preocupado em promover um ambiente equilibrado, já que o celular faz parte da realidade das escolas. "Por isso, nossas ações são em prol de uma mediação", enfatiza. Ele ainda explica que é importante que as escolas também levem em consideração a nomofobia, que é o medo irracional de não ter o celular ou de não poder usá-lo. "Esses casos existem por conta da exposição excessiva às telas", finaliza