Índice adotado pela Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema) mostra que capital goiana perde só para Teresina e Cuiabá. Nota baixa resulta de reciclagem deficiente, ausência de taxa e destinação incorreta
Goiânia ocupa a terceira pior posição no Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana (Islu) de 2024 entre as capitais brasileiras, ficando atrás apenas de Teresina (PI) e Cuiabá (MT). Tal indicador leva em conta fatores como a cobertura da coleta de lixo, existência de cobrança de taxa para manejo dos resíduos, além de porcentuais relacionados à reciclagem de materiais coletados e destinação incorreta. E é justamente a ausência de cobrança específica para o serviço -- taxa já aprovada, mas que ainda não entrou em vigor --, a falta de avanços na coleta seletiva e a ausência de um aterro sanitário ambientalmente adequado, que tem puxado o índice da capital goiana para baixo.
Publicado pela Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema), o levantamento visa mensurar como os municípios brasileiros têm aderido e implementado as metas e diretrizes da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), prevista na Lei federal 12.305 de 2010. Para isto, utiliza como base para a equação geral do Islu os quatro indicadores denominados dimensões E, S, R e I, que se referem, respectivamente, ao engajamento do município, sustentabilidade financeira, recuperação de recursos coletados e impacto ambiental. Esta primeira é a que tem maior peso na nota final, de 31%.
A pontuação varia de 0 a 1. Quanto mais próxima de 1, maior a eficiência na gestão da limpeza. No índice relativo ao engajamento do município, que mede a população atendida pelo serviço de coleta, a capital teve o melhor indicador dentre os quatro analisados, alcançando 0,866 pontos.
Na segunda dimensão, relativa à cobrança de taxa específica, se manteve em zero. A recuperação dos resíduos, com 0,038, e a destinação incorreta, em 0,677. Desta forma, Goiânia fechou o Islu 2024 com 0,431 -- ainda menor que no ano anterior, quando chegava a 0,507.
Capital com o melhor índice, Florianópolis (SC) alcançou 0,754 no levantamento do ano passado, seguida por Rio de Janeiro (RJ), totalizando 0,743, e Recife (PE), com 0,682. No fim do ranking, aparece Teresina (PI) com 0,349, e Cuiabá (MT), com 0,424 -- pouco abaixo do Islu em Goiânia. Vale destacar que o cálculo é feito com base em dados fornecidos pelos próprios municípios no Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS). Dos 5.036 participantes elegíveis ao estudo, 70% tiveram resultados considerados muito baixos, ou seja, pontuação de até 0,499.
Presidente da Abrema, Pedro Maranhão pontua que o baixo índice em Goiânia é resultante de três dos quatro fatores levantados. "Tem um índice reciclagem abaixo da média nacional e, até o início deste ano, não tinha estabelecido cobrança específica para o gerenciamento de resíduos sólidos, conforme determinado em lei para garantir a sustentabilidade financeira dos serviços. Essa realidade não permite o enquadramento da cidade no que é estabelecido pela PNRS", elenca.
Além destes dois fatores, Maranhão cita a falta de disposição ambientalmente adequada como outro fator que tem reduzido o resultado na capital goiana. "O aterro de Goiânia está sem licença para funcionamento desde 2011, portanto, trata-se de um lixão. Não assegura o correto tratamento do chorume, nem a captação do gás metano, ambos derivados tóxicos da decomposição da matéria orgânica", diz. "E é fundamental que a administração municipal assegure isso", complementa.
Por outro lado, mesmo que o Islu de 2024 ainda não tenha contabilizado a cobrança específica para manejo de resíduos sólidos, a taxa de limpeza pública de Goiânia, conhecida como taxa do lixo, foi sancionada pelo então prefeito Rogério Cruz (SD) no fim de dezembro passado. Conforme a lei, o tributo começa a valer a partir de abril deste ano. Até o momento, contudo, segue sendo discutida em grupo de trabalho da Secretaria Municipal da Fazenda (Sefaz). Conforme Maranhão, "em 2025, esse financiamento poderá melhorar o posicionamento da cidade no Islu".
Reflexo da crise
O presidente da Associação para Recuperação e Conservação do Ambiente (Arca) e especialista em Planejamento Urbano e Ambiental, Gerson Neto, pontua que o baixo Islu em 2024 registrado em Goiânia é "um reflexo da crise (na coleta do lixo ) que a gente passou no período anterior, de um processo que vem desde lá de trás". Neto pondera sobre os problemas relacionados ao Aterro Sanitário de Goiânia. "A gente está no limite. Não é possível que vamos continuar botando praticamente todo o nosso resíduo no aterro. Tem que reduzir, tratar com mais inteligência", cita.
Também reflete que Goiânia tem "dado passos atrás" na coleta seletiva. Segundo ele, a falta de educação ambiental e incentivo à população para que faça a separação correta dos materiais recicláveis, além de problemas internos no funcionamento do serviço, tem causado a queda no total reciclados. "A população tem que ver que se separar o resíduo, ele vai ser tratado e reciclado de forma adequada. Se não manter o esforço, a quantidade vai decrescendo com o tempo."

Discussão sobre Aterro Sanitário está parada
A adoção de medidas para regularização do Aterro Sanitário de Goiânia tem motivado cobranças por parte do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO), que em 2020 firmou junto à Prefeitura um termo de ajustamento de conduta (TAC) com uma série de ações a serem tomadas pela administração municipal visando a transformação do espaço em um Centro de Tratamento e Disposição Final de Resíduos Sólidos (CTDRS). Com os prazos já esgotados, um aditivo foi feito em janeiro de 2024 prorrogando o tempo de vencimento. Contudo, sem avanços.
Em dezembro passado, ainda sob a gestão do então prefeito Rogério Cruz (SD), a demora na adoção das medidas para adequação do aterro fez com que o local tivesse a licença ambiental corretiva suspensa pela Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma). A suspensão ocorreu a pedido do órgão ministerial, que também entrou com ação judicial solicitando a interdição do local. Agora, com a administração chefiava por Sandro Mabel (UB), o MP-GO tem voltado a cobrar as ações para regularização.

(Wildes Barbosa / O Popular)
Em uma reunião com o novo mandatário no fim de janeiro, o promotor Juliano de Barros Araújo reforçou que os prazos já estavam vencidos e que não havia mais como prorrogá-los, após a Prefeitura solicitar mais um prazo para apresentar um plano de ação. À época, ele destacou que, caso não fossem tomadas as medidas, a taxa do lixo não poderia ser cobrada na integralidade, haja vista que parte dela visa "a destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos".
Passados quase dois meses desde a reunião em janeiro, o promotor aponta que o processo de discussão junto à administração municipal para adequação do aterro "está parado". "Vamos executar a multa do TAC. Agendei para o dia 11 de abril uma nova tentativa de negociação", explica. O valor da multa ainda está sendo calculado e, portanto, não foi citado. Ainda conforme ele, também não tem ocorrido diálogo com a Prefeitura. "Sumiram. Estão ganhando tempo", conta.
Temporários
O problema do lixo em Goiânia, agravado nos últimos anos, tem resultado em outras medidas anunciadas pela gestão de Mabel, como a instalação de pontos provisórios de descarte de entulho. O primeiro ponto temporário de transferência de resíduos (PTTR) está sendo construído pelo Consórcio Limpa Gyn em uma área pública municipal do Residencial Português, na região leste. A previsão é de que seja concluído em abril.
O local será utilizado para que a população possa deixar materiais recicláveis e inservíveis, a exemplo do que ocorre hoje nos cinco ecopontos geridos pela Companhia de Urbanização de Goiânia (Comurg). Em 12 de janeiro, O POPULAR mostrou que a promessa de Mabel era instalar ao menos 20 pontos provisórios nos primeiros cem dias de mandato. A medida foi anunciada para conter o descarte irregular em vias públicas da capital.
Já no início de fevereiro, a Prefeitura disse que dez endereços estavam "sendo preparados" e seriam anunciados na semana seguinte, o que não ocorreu. Em comunicado à imprensa divulgado na ocasião, foi detalhado que seriam colocadas caçambas em cada área e que o consórcio faria o recolhimento periódico do material. A reportagem buscou a Agência Municipal de Meio Ambiente (Amma) em outras duas ocasiões após a divulgação de que os pontos seriam divulgados em meados de fevereiro. Nesta terça-feira (18), a pasta alegou que os locais ainda estão sendo implantados e que nesta quarta-feira (19) já deveria apresentar o aviso de inauguração.