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Conselho de ética arquiva processo contra Eduardo Bolsonaro por declaração sobre volta do AI-5

Escolha do arquivamento foi tomada por 12 votos a 5, já a oposição, discordou do parecer e apresentou voto separado

Folhapress

Modificado em 21/09/2024, 01:16

Conselho de ética arquiva processo contra Eduardo Bolsonaro por declaração sobre volta do AI-5

(Alex Ferreira/Câmara dos Deputados)

O Conselho de Ética da Câmara dos Deputados decidiu arquivar, nesta quinta-feira (8), a representação contra Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), por declarações sobre a volta do AI-5 no Brasil.

A decisão foi tomada por 12 votos a 5. A maioria acompanhou o relator do parecer preliminar, deputado Igor Timo (Podemos-MG), que não viu justa causa para admitir o processo e, por isso, votou pelo arquivamento.

A oposição, que discordou do parecer, apresentou voto separado e pediu que fosse declarada a suspeição do relator.

Durante o processo, Timo foi criticado pela proximidade com o presidente Bolsonaro. Reportagem do UOL mostrou que o deputado gravou um vídeo com Bolsonaro agradecendo o presidente por ter repassado verbas para seu estado.

No parecer alternativo, Rede, PSOL, PT e PCdoB afirmam que a postura do relator compromete a credibilidade do parecer apresentado pelo deputado. Na época, em nota enviada ao UOL, a assessoria de Igor Timo afirmou que o parlamentar mantinha sua imparcialidade e disse que o episódio não interferia no trabalho que ele realiza no conselho.

Na sessão desta quinta, Timo afirmou que o vídeo foi feito para divulgar recursos que estavam sendo disponibilizados para municípios do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais. Segundo o relator, Bolsonaro não foi sua primeira opção de voto para presidente em 2018, e sim o senador Álvaro Dias (Podemos-PR). No segundo turno, "a opção ficou franqueada" e, por isso, disse, votou em Bolsonaro.

"Meu cuidado foi exclusivamente em levar informação para que a população tivesse ciência de que os recursos estavam disponibilizados", disse Timo, negando qualquer relação anterior com Bolsonaro e afirmando que o conselho não poderia ser transformado numa "caça a parlamentares."

Em seu parecer alternativo, a oposição afirmou que Eduardo Bolsonaro "tem, em seu modus operandi, falas que ofendem e ameaçam os princípios democráticos que, de acordo com a Constituição Federal, constituem os fundamentos, objetivos e princípios da República, remetendo a um dos períodos mais tristes da história brasileira."

"Aceitar esse tipo de conduta de forma reiterada é uma forma de se legitimar essas atitudes."

A maioria dos membros do conselho, no entanto, votou a favor do parecer de Igor Timo. Na reunião desta quinta, o relator repetiu o que já tinha dito na segunda-feira (5) sobre o AI-5 e afirmou que o "Brasil não permite, em tempo algum, referenciar ou citar com saudosismo tempos sombrios" de sua história.

"O que seria mais danoso ao Congresso Nacional, a possibilidade ou a prática de uma ação em seu desfavor? Essa ação seria a censura. Essa mesma aventada pelo representado, mas que agora pode ser praticada pelos seus pares em seu desfavor", criticou.

"Se estamos aqui para discutir e combater a censura, é importante que nós não pratiquemos contra um colega. Quando digo a um colega, me refiro a todos".

Já Eduardo Bolsonaro negou fazer campanha pelo fechamento do STF ou do Congresso e fez críticas à oposição. "Esses mesmos que me acusam de ter conduta ditatorial, como o próprio presidente Jair Bolsonaro, que nunca matou uma pessoa em sua vida", disse.

"Esses mesmos que o acusam de ser genocida fazem apologia à revolução bolchevique [de 1917], celebram mais de 200 anos do nascimento de Karl Marx e tantos outras figuras, como Marighella. Que a gente viu nesta casa, no Congresso Nacional, uma sessão em homenagem a Carlos Marighella, que fez um mini manual do guerrilheiro urbano, pregando o assassinato e como fazer isso, de matar policiais militares e todos aqueles que eram vistos como obstáculos para a sua conquista de poder."

Eduardo era alvo do conselho desde novembro de 2019 por dizer que o resultado de uma hipotética radicalização da esquerda seria a volta do AI-5, o ato que marcou o início do período mais duro da ditadura militar (1964-1985).

As declarações foram dadas em entrevista à jornalista Leda Nagle em 31 de outubro do ano passado. Na conversa, o deputado disse que, se o Brasil tivesse protestos como os que ocorriam na ocasião no Chile, chegaria um momento igual ao do final dos anos 1960, quando houve sequestros de aviões e autoridades durante a ditadura militar.

"Se a esquerda radicalizar a esse ponto, a gente vai precisar ter uma resposta. E a resposta, ela pode ser via um novo AI-5, via uma legislação aprovada através de um plebiscito, como ocorreu na Itália. Alguma resposta vai ter que ser dada", afirmou, fazendo referência ao ato institucional que determinou o fechamento do Congresso e a suspensão da garantia de habeas corpus no país.

Duas representações foram protocoladas no conselho por causa do episódio: uma pela Rede, e outra assinada por PSOL, PT e PC do B -essa última foi incorporada à primeira.

No final de fevereiro, Eduardo já havia tido outro processo arquivado pelo conselho de ética. O deputado era acusado de ter ofendido a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) nas redes sociais, em 2019.

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A infidelidade conjugal pode parar na Justiça

Especialista explica que adultério não é mais crime, mas suas consequências podem gerar processos de indenização

Repercussão da traição, exposição da pessoa traída de forma que ofenda sua honra e imagem podem ser pontos para ação por danos morais. Cada caso deve ser analisado.

Repercussão da traição, exposição da pessoa traída de forma que ofenda sua honra e imagem podem ser pontos para ação por danos morais. Cada caso deve ser analisado. (Freepik)

Estudos da Radiografia de Infidelidade e Infiéis no Brasil, realizados em 2022 pelo aplicativo de encontros Gledes, mostram que 8 em cada 10 pessoas já traíram em relacionamentos monogâmicos, colocando o Brasil como o país mais infiel da América Latina, seguido por Colômbia, México, Argentina e Chile. O levantamento aponta que 62% dos brasileiros consideram a infidelidade algo natural, mas com limites. Na pesquisa, 91% dos participantes do gênero masculino afirmaram terem traído, contra 88% das mulheres.

Contudo, algumas traições podem gerar consequências que vão além do término de um relacionamento e até chegarem à Justiça. A advogada Mariane Stival, que integra o escritório Celso Candido de Souza Advogados, lembra que trair não é mais crime. "O adultério, que no passado era tipificado no Código Penal Brasileiro, deixou de ser considerado uma infração penal desde a reforma de 2005 e passou a ser tratada no âmbito do direito civil e de família. Isso significa que, atualmente, a questão do adultério não gera responsabilidade penal, mas pode ter repercussões significativas nas relações familiares e patrimoniais".

A especialista explica como a infidelidade pode parar na Justiça. "A traição é um descumprimento do dever de fidelidade recíproca. Dependendo da gravidade do fato, dos impactos dessa traição, da repercussão, se houve exposição da pessoa traída que ofenda sua honra e imagem, pode ensejar um direito à indenização por danos morais. Mas deve ser analisado caso a caso. A parte que se sentir lesada pela traição pode ajuizar uma ação de indenização por danos morais contra a pessoa que manteve a relação extraconjugal".

Segundo a advogada, a reparação se dá pelo sofrimento causado à pessoa traída. "Essa possibilidade está fundamentada no artigo 186 do Código Civil, que estabelece a responsabilidade civil por ato ilícito. Nesse contexto, a parte traída pode pleitear reparação por danos morais, buscando compensar o sofrimento emocional e psicológico causado pela infidelidade. Além disso, pode-se discutir questões como a alteração da pensão alimentícia, se houver filhos envolvidos", completa.

Provas
Nem só de flagrante vivem as traições. Mariane Stival destaca outros tipos de provas que podem ser usadas para mostrar que alguém foi infiel. "Não é necessário ter um flagrante para comprovar o adultério. O sistema jurídico permite a utilização de diversas formas de prova para demonstrar a infidelidade. Provas documentais, como mensagens de texto, e-mails ou fotos, bem como depoimentos de testemunhas, podem ser utilizadas para corroborar a alegação. O Código de Processo Civil, em seu artigo 369, estabelece que as partes têm liberdade para produzir provas que sejam pertinentes ao fato que pretendem provar, desde que respeitados os princípios do contraditório e da ampla defesa".

E esse tipo de processo não é tão incomum, como muitos podem pensar. "As ações de indenização por danos morais em decorrência da infidelidade conjugal têm sido cada vez mais reconhecidas pelos tribunais, especialmente em contextos onde a traição causa sofrimento emocional significativo à parte traída. Esses casos costumam surgir em processos de separação ou divórcio, em que a parte lesada busca reparação pelo abalo psicológico e pela violação da confiança".

No entanto, a advogada ressalta que a aceitação e o valor da indenização podem depender das circunstâncias específicas de cada caso e da interpretação do juiz. "Embora a questão do adultério não seja mais criminalizada, ela ainda é um tema recorrente nos processos de separação e divórcio nas Varas de Família. A demanda por ações relacionadas ao adultério tem se tornado comum, especialmente em contextos onde há bens a serem partilhados ou a necessidade de discutir a guarda de filhos. Contudo, a percepção social sobre a infidelidade e suas consequências legais pode variar, influenciando a frequência e a abordagem desses casos na prática".

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Médico que "voou" em viaduto em acidente que matou 2 não vai para tribunal do júri

Justiça decide que motorista que chegou a 148 km/h antes de atingir e matar duas pessoas e ferir outras duas vai responder por crimes previstos na legislação de trânsito

Modificado em 19/09/2024, 01:19

Acidente no viaduto da T-63 vitimou os dois jovens que estavam na moto

Acidente no viaduto da T-63 vitimou os dois jovens que estavam na moto
 (Reprodução/TV Anhanguera)

A Justiça acatou pedido do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) e modificou os crimes pelos quais estava respondendo o médico Rubens Mendonça Júnior, de 30 anos, suavizando, assim, as possíveis penas, caso ele seja condenado pela morte de duas pessoas e por lesões corporais causadas em outras duas durante um acidente na noite de 20 de abril no viaduto da Avenida T-63, no Setor Bueno. O fato se deu após o médico atingir 148 km/h com o carro que dirigia e descolar os pneus do asfalto no ponto mais alto da estrutura viária.

O juiz Lourival Machado da Costa, da 2ª Vara de Crimes Dolosos Contra a Vida e Tribunal de Júri, substituiu as condutas imputadas na denúncia original contra o médico de homicídio doloso qualificado e lesão corporal dolosa qualificada, conforme constam no Código Penal, para homicídio culposo (quando não há intenção) e lesão corporal também culposa, crimes estes conforme previsto no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), nos artigos 302 e 303.

O crime de homicídio doloso qualificado tem pena que pode chegar a 30 anos. Já o culposo quando cometido na direção de um veículo automotor, sem os agravantes, vai até quatro anos. Além disso, com a decisão, o processo deixa a 2ª Vara e é encaminhado para outra, específica para crimes de trânsito e ainda a ser definida.

Ao apresentar as alegações finais, o promotor Sérgio Luís Delfim, da 92ª Promotoria de Justiça de Goiânia, argumentou que a mudança na postura em relação à denúncia se deu após a realização da audiência de instrução e julgamento, com a apresentação de novas provas e interrogatório das testemunhas. Seu pedido foi corroborado pela defesa do médico em petição encaminhada posteriormente.

O magistrado concordou com o posicionamento do promotor, para quem não ficou demonstrado no processo que o motorista "tenha assumido o risco de produzir o resultado morte das vítimas", mas, sim, que ele "conduzia seu veículo de forma imprudente e sem perícia necessária, o que contribuiu sobremaneira para a prática do acidente, e demonstrou não conhecer as peculiaridades de funcionamento de seu veículo Volvo XC40".

Lourival dá como exemplos de casos em que poderia se configurar homicídio doloso qualificado as vezes em que os motoristas participam de rachas ou associam velocidade excessiva com embriaguez ao volante. "Embora demonstrada a excessiva velocidade empregada pelo acusado no momento do acidente, não há indícios suficientes para apontar que o acusado teria assumido o risco de matar e lesionar a vítimas", escreveu na sentença.

Na decisão, o juiz também destaca, mas apenas como comentário, que a esposa do médico, presente no veículo no momento do acidente, não foi ouvida em juízo, apenas na delegacia, apesar de ser uma peça importante do caso. Testemunhas contaram que ouviram ela falando que o marido e ela estavam testando o veículo para saber se iria de 0 a 100 km/h em quatro segundos, como dizia o manual. Sobre isso, Lourival disse apenas que "o suposto teste de velocidade feito pelo acusado não restou demonstrado no curso da instrução".

Entenda o caso

O médico voltava com a esposa de um restaurante em uma quinta-feira quando, por volta de 23h40, ao abrir o sinal da T-63 no cruzamento com a Avenida T-4, ele teria, segundo a denúncia, resolvido testar o carro novo, se alcançaria a velocidade de 100 km/h em quatro segundos, mas perdeu o controle da direção após uma ultrapassagem já no viaduto. A defesa nega esta versão e diz que houve problema de domínio do carro ao tentar passar pelo veículo à frente.

O carro do médico chegou a planar antes de atingir o motoboy Leandro Ferreira Pires, de 23, e o garçom David Antunes Galvão, de 21, que estava na garupa da moto. Os dois morreram no local. Já a promotora de eventos Wanderlyne Gomes dos Reis, de 46 anos, que estava em uma moto, se feriu no acidente ao também ser atingida pelo carro de Rubens e ficou oito dias internada até se recuperar. Uma quarta pessoa, Gilson Campos Antonio, sofreu ferimentos leves, sem precisar de internação. Ele estava em um carro com a esposa e dois filhos.

Na denúncia apresentada ainda em junho, o MP-GO concluiu do dolo eventual, quando o autor assume o risco de matar ou ferir alguém, por ter agido com imprudência pelo excesso de velocidade na pista cujo limite sinalizado era de 50 km/h somado à ultrapassagem em local proibido, já que entrou na contramão e, ao voltar para a pista correta, perdeu o controle. Este posicionamento do órgão não perdurou até as alegações finais.

Um dos fatos que levaram a pedir a desclassificação é um laudo com a extração de dados do controle de airbag repassados pela montadora mostrando que o pedal do acelerador ficou totalmente pressionado até 3,5 segundos antes do impacto, o que representa um trajeto de 144 metros. Para o promotor, "tudo indica" que Rubens teria tirado o pé do acelerador antes de entrar no viaduto, apesar de a distância a partir do impacto apontar que ele já estaria na subida.

Essa conclusão do promotor é importante porque ele usa este argumento ao desclassificar a qualificadora por motivo torpe. "É verdade que o acusado resolveu satisfazer seu desejo pessoal de testar, em local completamente inadequado, a velocidade que seu automóvel podia desenvolver. Mas, como já dito, não se pode dizer que ele agiu em total desprezo para com a vida e integridade corporal de seres humanos, porque o teste ocorreu antes de chegar no viaduto, num espaço onde não havia outros veículos."

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AGU deve acionar Gustavo Gayer por 'crime de racismo' após participação em podcast

A decisão aconteceu após reunião com a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, na tarde de quarta-feira (8). Deputado afirmou que QI da população africana seria menor que o de macacos

Modificado em 19/09/2024, 00:27

Deputado federal Gustavo Gayer (PL)

Deputado federal Gustavo Gayer (PL) (Bruno Spada - Câmara dos Deputados)

O advogado-geral da União, Jorge Messias, determinou à Procuradoria-Geral da União (PGU) o estudo imediato de medidas jurídicas cabíveis contra o deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) por suspeita de crime de racismo. A decisão aconteceu após reunião com a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, na tarde de quarta-feira (8).

Gayer fez as afirmações durante o episódio de um podcast e trechos da gravação viralizaram ao longo da semana. Na conversa, um dos apresentadores do programa afirmou que o QI da população africana seria menor que o de macacos. "Sabia que tem macaco com QI de 90? O QI na África é de 72. Não dá para a gente esperar alguma coisa da nossa população".

Em seguida, o deputado complementou, dizendo que a suposta falta de capacidade cognitiva influencia o surgimento de regimes totalitários. "Democracia não prospera na África, por quê? Para você ter democracia você tem que ter o mínimo de capacidade cognitiva", disse Gayer.

O parlamentar também fez críticas à população brasileira, dando a entender que a vitória do presidente Lula nas eleições de 2022 está atrelada a eleitores burros. ""O Brasil está emburrecido. Aí você pega e dá um título de eleitor para um monte de gente emburrecida [...] Tentaram fazer democracia na África várias vezes. O que acontece? Um ditador toma tudo e o povo aplaude. O Brasil está desse jeito. O Lula chegou à presidência e o povo burro: "êeee, picanha, cerveja!", afirmou o deputado.

Para Messias e Anielle Franco tais declarações são inadmissíveis e vão contra o compromisso democrático da igualdade racial no Brasil. Após análise jurídica, a AGU e o Ministério da Igualdade Racial vão anunciar os próximos passos.

Repercussão negativa

O Grupo dos Chefes de Missão Africanos em Brasília emitiu uma nota oficial condenando as declarações do deputado goiano. O texto é assinado por Martin A. Mbeng, Embaixador do Cameroun e Decano do Grupo.

"Não nos permitimos omitir ou pactuar com mensagens criminosas quando originárias de indivíduos supostamente representantes do povo brasileiro. [...] Para além da tristeza que nos invade ao saber que ainda existe esse tipo de seres, lamentamos ter de informar às autoridades brasileiras, sobretudo o Itamaraty e a Câmara dos Deputados, que o nosso Grupo, interpretando os sentimentos do Continente Africano, está CHOCADO com tamanho desacerto e delírio do parlamentarista supracitado", afirma a nota.

O ministro dos Direitos Humanos Silvio Almeida também se manifestou contra as falas de Gayer, e disse ter acionado a Polícia Federal, a procuradoria-Geral da República (PGR) e a Câmara dos Deputados contra o deputado federal.

A deputada Duda Salabert (PDT-MG) também já havia acionado o Conselho de Ética da Casa para avaliar as declarações do parlamentar.

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Juiz discorda de MP-GO, mas arquiva processo contra policiais penais que mataram rapaz

Justiça acata pedido de promotor que defende como legítima defesa ação de agentes penais que resultou na morte de Hermes Junio de Oliveira, em bairro ao lado do Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia. Família diz que vai recorrer de decisão

Modificado em 19/09/2024, 00:22

Hermes Junio tinha ido buscar o pai quando foi morto dentro do carro

Hermes Junio tinha ido buscar o pai quando foi morto dentro do carro (Redes Sociais)

A Justiça arquivou o processo contra três policiais penais acusados de matar Hermes Junio de Oliveira, de 26 anos, durante uma abordagem ao lado do Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia no dia 22 de novembro e determinou o encaminhamento do processo contra o policial penal de cuja arma saiu o tiro que acertou a vítima para uma vara de crimes não dolosos (quando não há intenção) contra a vida.

Em sua decisão, o juiz Leonardo Fleury Curado Dias, da 1ª Vara Criminal dos Crimes Dolosos Contra a Vida, Tribunal do Júri e Execuções Penais de Aparecida de Goiânia, deixa claro que discordou de parecer do Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) de que os agentes agiram em legítima defesa e adotaram procedimentos de rotina durante a ação, realizada à noite, quando Hermes estava no carro com os pais e um amigo saindo da empresa em que o pai trabalhava.

A família de Hermes entrou com recurso contra o parecer do MP-GO e a Justiça chegou a encaminhar o pedido de arquivamento feito pelo promotor Milton Marcolino dos Santos Júnior, da 5ª Promotoria de Justiça de Aparecida de Goiânia, para reavaliação na Procuradoria Geral de Justiça (PGJ). Entretanto, no dia 14 de abril, três dias após o encaminhamento do juiz para a PGJ, o subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Jurídicos, Fernando Braga Viggiano, manteve o posicionamento do promotor.

Os advogados Emanuel Rodrigues e Thiago Lopes da Cruz, que representam o pai de Hermes no processo, afirmam que a família foi surpreendida com a decisão e que vão recorrer dela. "É fácil notar que ela é contraditória, porque o magistrado diz que não concorda com o pedido de arquivamento do MP-GO ao longo da decisão e mesmo assim o faz a contragosto", comentou Emanuel.

De fato, em sua decisão, o juiz afirma que ficou evidenciado que, ao acolher o pedido da família para que o parecer do MP-GO fosse reavaliado, "discordou quanto à conclusão tomada pelo órgão ministerial em relação à notícia trazida pelo inquérito policial". A Polícia Civil, ao concluir as investigações, havia indiciado os três policiais penais que efetuaram disparos por homicídio e livrado o agente que estava na direção da viatura. O promotor discordou da conclusão do inquérito.

O juiz explica que, apesar da discordância, não poderia entrar naquele momento no mérito da petição, "fazendo o papel de acusação" e expor "sua convicção sobre a responsabilidade dos suspeitos no fato". Caso o fizesse, segundo Leonardo, poderia se colocar em suspeição. "O que se pretendia, além de satisfazer o justo pleito da parte interessada, era colher uma nova manifestação do órgão ministerial, titular da ação penal, confirmando ou não o posicionamento primeiro do ilustre promotor de justiça de origem."

Como o subprocurador se posicionou contra o argumento dos representantes da família para justificar uma reavaliação do inquérito pelo MP, o juiz seguiu o entendimento do promotor de que "não há crime quando o agente pratica o fato em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular do direito".

Com isso, se livram do processo os policiais penais Florisvaldo Ferreira da Silva Costa, Alan de Moraes Amaral e Osmar Pedro de Oliveira Júnior. Osmar é quem estava na direção da viatura. Já o agente Alisson Marcos, de cuja arma saiu o tiro que matou Hermes, seguirá respondendo na Justiça, mas não por homicídio, visto que para o MP-GO ele seguiu os procedimentos, mas com imperícia.

Entenda o caso

Hermes foi morto dentro do carro em que estava no banco de motorista, junto com os pais e um amigo. Ele tinha ido a uma loja de sucatas no bairro ao lado do Complexo Prisional buscar o pai no serviço, por volta das 22 horas.

Em depoimento, a família disse que os policiais se aproximaram na viatura com o giroflex desligado e que ouviram apenas alguém gritando para pararem, sendo imediatamente atingidos pelos disparos. Os tiros acertaram o veículo da família e Hermes foi ferido mortalmente na cabeça. O pai assumiu o volante e a vítima foi levada até um posto de saúde, onde veio a faceler

O delegado Rogério Bicalho, do Grupo de Investigações de Homicídios (GIH) de Aparecida de Goiânia, indiciou os três policiais penais que atiraram por não terem seguido os procedimentos corretos. Para o delegado, não havia motivos para os disparos. Foram três tiros, um de cada agente. "Eles assumiram o risco de produzir (o fato que culminou com a morte do jovem)", afirmou o delegado.

Os policiais alegam que estavam atrás de um veículo no qual se estaria coordenando um drone para entrar com produtos ilegais no presídio e que ao encontrarem o carro de Hermes tentaram abordar os passageiros, mas estes não atenderam ao pedido de parada. Também afirmam que os tiros foram para impedir a movimentação do veículo e que não o seguiram.